Pesquisa internacional revela que histórico familiar e risco de doença cardiovascular deveriam ser investigados com mais atenção
Além de conviver com uma das doenças mais temíveis da modernidade, a aids, no Brasil, 71% dos infectados pelo vírus têm pelo menos uma doença associada ao HIV, segundo dados da pesquisa Atlis (Aids Treatment for Life International Survey ou Pesquisa sobre Tratamento para a Aids em Âmbito Internacional, em tradução literal). Desses, 22% têm diagnóstico de três ou mais doenças associadas.
Os dados foram apresentados esta semana pela Internacional Association of Physicians in Aids Care (IAPAC), na XVIII Conferência Internacional sobre Aids em Viena, Áustria. O estudo foi financiado pela farmacêutica Merck & Co.
Os problemas mais comuns são depressão (28%), distúrbios do sono (26%), problemas gastrointestinais (21%), nível elevado de colesterol (15%), hipertensão (15%) e doenças cardiovasculares. “Uma das falácias do programa de Aids é não perceber que o HIV não impede que essas pessoas tenham outras doenças. Há um erro grande por parte da classe médica e do governo em não entender que a aids é apenas uma parte do problema do doente”, afirma Mauro Schechter, chefe do Laboratório de Pesquisas em Aids do Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, do Rio de Janeiro.
A pesquisa ouviu 2.000 adultos portadores de HIV de cinco regiões: América do Norte (Estados Unidos), América Latina (Argentina, Brasil, México e Caribe), Europa (França, Alemanha, Itália, Rússia, Espanha e Reino Unido), região da Ásia/Pacífico (Japão, Coréia, Malásia, Nova Zelândia e Cingapura) e África (África do Sul). No Brasil, foram entrevistados 201 portadores do HIV, a partir dos 18 anos, sendo 61% homens e 39% mulheres.
Os dados levantam uma preocupação: histórico familiar, tabagismo, diabetes, problemas cardíacos e outras doenças ainda não ganharam a devida atenção dentro do consultório. A pesquisa mostra que 49% dos entrevistados não discutiram com seu médico sobre seu estado de saúde anterior, o que demonstra que as doenças associadas não estão sendo abordadas com consistência na rotina das consultas.
Informações como essas são extremamente importantes para nortear a prescrição do tratamento, que pode ser diferenciado no caso de quem apresenta doença cardíaca, por exemplo. “É extremamente comum pacientes que vivem com HIV/Aids apresentarem doenças associadas que podem ser agravadas pelo vírus ou medicamentos antirretrovirais”, afirmou Jürgen Rockstroh, membro da Força-Tarefa da pesquisa e professor de medicina na Universidade de Bonn, na Alemanha
Segundo dados da pesquisa, apenas 28% dos entrevistados havia discutido seu histórico familiar de doença cardiovascular com o profissional da saúde e 65% dos entrevistados que eram considerados de alto risco não realizavam discussões frequentes relacionadas com doenças cardíacas com seu médico.
“O que a pesquisa deixa claro é que nós não utilizamos esse contato do paciente com HIV com o sistema de saúde para cuidar dele como um todo”, afirma Schechter. Segundo o médico, os óbitos por causas cardíacas e pacientes com Aids aumentaram 10 vezes mais do que na população em geral.
“Como médicos, podemos ajudar a controlar estes eventos por meio de abordagens individualizadas de tratamento que consideram o paciente de forma global para ajudar a atingir desfechos melhores”, afirma Dr. Rockstroh.
Depressão
A depressão atinge 28% dos entrevistados e confirma os dados da pesquisa brasileira realizada pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), “Percepeção da Qualidade de Vida e do Desempenho do Sistema de Saúde Pública entre os Pacientes em Terapia Antirretroviral no Brasil.” Os pacientes sofrem mais com o preconceito e seus efeitos do que com a ação do vírus.
Foram entrevistadas 1.260 pessoas em tratamento de Aids no Brasil. Desse total, 65% avaliou seu estado de saúde como bom ou ótimo. No entanto, quando o assunto é esbarra em problemas psicológicos, 25% afirmaram sofrer intensamente de tristeza ou depressão e 23% relataram problemas com ansiedade.
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