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sexta-feira, 9 de setembro de 2011

“Hospital com mais de 30% de atendimentos SUS não é viável”

A má remuneração do SUS e das operadoras, assim como os elevados custos operacionais levaram dezenas de hospitais filantrópicos e de pequeno porte a acumular dívidas milionárias. Há uma salvação?

Em maio deste ano, o setor de saúde foi surpreendido com a notícia de que a Santa Casa de São Paulo, uma das maiores instituições de saúde do País, fecharia as portas de seu pronto-socorro. O motivo não poderia ser outro, uma dívida acumulada de R$120 milhões que inviabilizaria os 30 mil atendimentos realizados na emergência do hospital todos os meses. Após o anúncio, o governo do Estado de São Paulo liberou R$10 milhões em caráter emergencial para evitar que a instituição encerrasse as operações.

Casos como o da Santa Casa de São Paulo não são raridade no setor de saúde brasileiro. Segundo o relatório divulgado pela Confederação das Santas Casas de Misericórdia, Hospitais e Entidades Filantrópicas (CBM), a dívida acumulada do segmento privado, sem fins lucrativos, que soma cerca de dois mil estabelecimentos é de R$ 5,9 bilhões.

O estudo também mostra que, em 2009, o custo dos serviços prestados ao Sistema Único de Saúde (SUS) foi de R$12,3 bilhões, no entanto, somente 65% desse valor foi reembolsado, deixando um rombo de R$4,4 bilhões nos cofres dos hospitais.

Além do cenário crítico nas instituições filantrópicas, hospitais privados de pequeno porte também sofrem com a baixa remuneração por parte das operadoras e com o baixo poder de negociação junto aos fornecedores. De acordo com o superintendente financeiro da Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina (SPDM), Carlos Garcia Oliva, essas instituições têm muita dificuldade em atender a demanda da população na média e alta complexidade por não ter um ganho em escala.

“Hospitais gerais com menos de 100 ou 200 leitos são economicamente inviáveis, pois o custo fixo rateado pelo número de leitos fica muito alto. Outro fator que inviabiliza o hospital é a compra de pequenos volumes de material, que acaba aumentando o preço médio junto ao fornecedor”.

No segmento filantrópico, Oliva destaca o subfinanciamento da saúde por parte do Sistema Único de Saúde (SUS) como o grande vilão para as finanças das instituições de saúde. Outro problema levantado pelo superintendente da SPDM é a gestão das unidades de saúde que, muitas vezes, exige mais dinheiro e a utilização racional dos recursos, além do estabelecimento de critérios claros de que, se não houver verba disponível em caixa para oferecer tudo para todos, deve rever a política de atendimento e estabelecer prioridades para não fechar as portas.

“Diferente de outros setores da economia, na saúde não há como simplesmente fechar a porta. O hospital é uma empresa que funciona 24 horas durante 365 dias por ano, e a maioria dos hospitais que possui um serviço de atendimento de urgência é de porta aberta”, destaca Oliva.

De acordo com o superintendente, dificilmente um hospital que realiza mais de 30% de seus atendimentos pelo SUS é uma instituição economicamente viável. “Para se ter uma ideia, hoje a remuneração por internação no SUS gira em torno de R$ 1 mil, enquanto na saúde suplementar este valor chega aR$ 3 mil. Ou seja, se com este valor os hospitais privados acham difícil atender os planos de saúde, imagine um hospital filantrópico ou público”, conclui.

Outros agravantes econômicos que interferem diretamente no desenvolvimento financeiro das instituições de saúde são: a inflação no setor de saúde, que cresceu acima do esperado e o aumento na demanda por parte da população, que é consequência da melhora no nível de vida das pessoas, que acabam buscando mais o serviço.

Para Oliva, o grande segredo para uma recuperação financeira saudável, e sem grandes sacrifícios, está na gestão. Segundo ele, é necessário que o hospital faça um diagnóstico amplo e transparente de sua situação e depois adote uma gestão de custos adequada à sua realidade, visando transparência e controle social como prega a Constituição e ser adequadamente financiado e nunca perder o foco em sua área de atuação.

“Seria um contracenso um hospital de alta complexidade atender casos simples como gripes ou uma simples dor de estômago. Por exemplo, uma consulta em uma Unidade Básica de Saúde (UBS) custa muito menos do que em um hospital como o InCor, ou seja, organizar a demanda, melhorar a qualidade da gestão e discutir acesso e remuneração tanto no setor público como privado são algumas das medidas que irão alavancar a recuperação do hospital”, completa Oliva.

A profissionalização da gestão também é muito importante para que os hospitais possam ganhar em eficiência operacional e racionalizar seus custos, pois cerca de 70% dos recursos gastos por um hospital hoje está na folha de pagamento de seus colaboradores.


Dificuldades Superadas
Graças à gestão de seus passivos, a Santa Casa de Belo Horizonte está sanando uma dívida acumulada em R$ 300 milhões, que se arrastou ao longo de anos. Segundo o superintendente de planejamento, finanças e RH da instituição, Gonçalo Vieira, grande parte dessa conta eram passivos trabalhistas, como INSS e FGTS, além do imposto de renda atrasado. “A Santa Casa sempre teve problemas financeiros, à medida que o hospital crescia, as contas aumentavam simultaneamente”, completa o superintendente.

Para sair da crise e recuperar-se financeiramente, a Santa Casa de BH adotou um plano de reestruturação de seu pessoal, que trouxe como resultado mais agilidade nos processos internos da instituição e, principalmente, na tomada de decisões.

A renegociação dos passivos trabalhistas e bancários também foi fundamental para a entidade recuperar sua credibilidade diante das instituições financeiras. Segundo Vieira, os passivos bancários e com fornecedores foram negociados e obteve-se uma taxa de juros inferior a 2% sobre o parcelamento da dívida. Com o governo a instituição conseguiu quitar uma dívida de R$52 milhões junto à Caixa Econômica Federal. “Todo o negócio tem que ser sustentável economicamente, mesmo na saúde”, coloca Vieira.

A instituição retomou o recolhimento do FGTS em maio do ano passado e aderiu à Timemania e ao parcelamento do Refis. Segundo Vieira, o hospital ainda possui um passivo trabalhista e seu objetivo é quitá-lo o mais rápido possível. “Para sanar estes passivos, o Juizado Auxiliar de Execuções autorizou o leilão de 11 imóveis em Belo Horizonte que foram doados à Santa Casa”, afirma Vieira. Estes imóveis deverão gerar uma receita de R$ 16 milhões, que já possui destino certo.

Outra instituição que conseguiu encontrar a luz no fim do túnel e sanar uma dívida bancária de R$ 60 milhões, que se arrastava desde 2006, foi Hospital Moinhos de Vento, situado na capital gaúcha. Para isso a instituição adotou medidas extremas e decidiu fazer um choque de gestão e redefinir suas estratégias focando em resultado.

Segundo o superintendente administrativo do hospital, Fernando Torelly, os primeiros passos para a recuperação financeira foram: a adoção de um modelo de governança corporativa, trazendo mais profissionalização à gestão do hospital; a adoção de uma nova metodologia de gestão baseada no balanced scorecard (BSC) e, principalmente, um processo de excelência operacional. “Muitas vezes um hospital não percebe que a maioria dos problemas está dentro de casa. Decidimos fazer bem feito nossos processos assistenciais como cobranças de convênios, redução de glosa e negociação com as fontes pagadoras, onde nós intensificamos as atividades”.

Outra medida adotada pelo Moinhos de Vento foi a compra de material hospitalar direto do fabricante, deixando de lado distribuidores locais. “Mesmo estando na Região Sul compramos cerca de 80% dos materiais direto dos fabricantes que estão no centro do País, com isso reduzimos esse custo”, diz Torelly.

A entrada da superintendência na operação e participação nas negociações com fontes pagadoras e fornecedores e a adoção de um programa de qualificação profissional de pessoas, principalmente líderes, foi o grande diferencial encontrado pelo hospital para atingir a excelência operacional.

Atualmente o Hospital Moinhos de Vento possui um caixa operacional que fecha mensalmente no azul e uma dívida liquida positiva, ou seja, dinheiro suficiente para quitar o débito existente. “Além da eficiência nas operações, notamos também uma melhoria no clima organizacional da empresa, um aumento na uma taxa de ocupação que agora beira os 90%”, coloca Torelly.

Superada a crise, o hospital, espera terminar 2011 com 390 leitos, 50 a mais que no início do ano e um faturamento superior a R$300 milhões. A instituição também faz planos audaciosos e pretende investir cerca de R$150 milhões até 2014.

Fonte SaudeWeb

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