Consumo prejudica a absorção de nutrientes e vem sendo associado a aumento no risco de fraturas ósseas, infecção bacteriana e até pneumonia
O uso prolongado de medicamentos para combater a doença do refluxo gastroesofágico e a azia grave pode dificultar a absorção de alguns nutrientes.
A classe de medicamentos conhecida como inibidores da bomba de prótons (IBP), da qual fazem parte substâncias como omeprazol, lansoprazol e esomeprazol, já é a terceira mais vendida dos Estados Unidos, superada apenas pelos antipsicóticos e pelas estatinas, com mais de 100 milhões de receitas médicas e 13,9 bilhões de dólares em vendas em 2010.
Nos últimos anos, a Administração de Alimentos e Medicamentos dos Estados Unidos (FDA) emitiu vários avisos sobre os IBPs, dizendo que o uso prolongado e em altas doses do medicamento tem sido associado ao aumento do risco de fraturas ósseas e de infecção por uma bactéria chamada Clostridium difficile, que pode ser especialmente perigosa para pacientes idosos. Em um artigo recente, especialistas recomendam que os adultos mais velhos usem os medicamentos apenas “durante o menor período de tempo possível”.
Estudos têm demonstrado que o uso prolongado de IBPs pode reduzir a absorção de nutrientes, vitaminas e minerais importantes, incluindo cálcio, magnésio e vitamina B12, podendo ainda reduzir a eficácia de outros medicamentos, sendo que a FDA adverte que tomar omeprazol em conjunto com o agente anticoagulante clopidogrel pode enfraquecer o efeito protetor do clopidogrel em pacientes cardíacos.
Outra pesquisa descobriu que as pessoas que tomam IBPs correm um risco maior de desenvolver pneumonia – um estudo até mesmo identificou uma ligação entre o uso dessa classe de medicamentos e o aumento de peso.
Representantes de empresas farmacêuticas repudiam tais relatórios, dizendo que eles não provam que os IBPs são a causa dos problemas, e que muitos usuários dos IBPs são adultos mais velhos, suscetíveis a infecções e mais propensos a fraturas e déficits nutricionais.
Porém, mesmo que usar esses medicamentos por períodos curtos possa não ser problemático, eles tendem a produzir dependência, dizem especialistas, levando o paciente a tomá-los por muito mais tempo do que as recomendadas oito a 12 semanas – alguns continuam a usá-los pelo resto da vida. Muitos hospitais costumam administrar IBPs em pacientes como rotina, para evitar úlceras causadas por estresse e em seguida, passam a eles instruções para continuar a medicação em casa.
“Estudos têm mostrado que quem começa a tomar esses medicamentos tem dificuldades para interrompê-los. É quase como um vício”, diz a médica Shoshana J. Herzig, do Centro Médico Beth Israel Deaconess, em Boston.
Os IBPs funcionam bloqueando a produção de ácido no estômago, mas o corpo reage, conduzindo a uma sobrecompensação e, explica ela, “acelerando a produção” de células que produzem ácido.
“Há crescimento excessivo dessas células no estômago, então quando a produção é desbloqueada, o mecanismo de produção de ácido funciona de modo ainda mais intenso.”
Além disso, os inibidores da bomba de prótons não têm sido os remédios milagrosos que os especialistas esperavam. Um tratamento mais disseminado da DRGE não reduziu a incidência de câncer de esôfago. A incidência do carcinoma de células escamosas, associado ao tabagismo, diminuiu, mas a de adenocarcinomas de esôfago, associados à DRGE, aumentaram 350% desde 1970.
“Quando as pessoas tomam os IBPs, eles não curam o problema de refluxo. Elas apenas controlam os sintomas”, afirma Joseph Stubbs, médico internista de Albany, Geórgia, e ex-presidente do Colegiado Americano de Médicos.
E os IBPs são uma maneira de as pessoas evitarem fazer mudanças difíceis no estilo de vida, como perder peso ou cortar os alimentos que causam azia, diz ele.
“As pessoas achavam que poderiam continuar comendo o que querem comer, tomar o medicamento e ficar bem. Estamos começando a ver que se elas fizerem isso, alguns efeitos colaterais de risco podem ocorrer.”
Pode ser que muitos pacientes tomem esses medicamentos sem um bom motivo médico, causando um custo enorme para o sistema de saúde, aponta Joel J. Heidelbaugh, médico especialista em medicina familiar de Ann Arbor, Michigan. Ao examinar prontuários de quase mil pacientes que tomam IBPs em um ambulatório de Assuntos dos Veteranos de Guerra, em Ann Arbor, ele descobriu que somente um terço tinha recebido diagnósticos que justificassem o uso dos medicamentos. Os outros pareciam ter recebido as medicações “só para o caso de precisarem”.
“Recomendamos que as pessoas tomem os IBPs e ignoramos o fato de que nosso corpo foi projetado para ter ácido no estômago”, argumenta Greg Plotnikoff, médico especializado em terapia integrativa do Instituto de Saúde e Cura Penny George, em Minneapolis.
É necessário haver ácido no estômago para decompor os alimentos e absorver nutrientes, disse ele, bem como para o bom funcionamento da vesícula biliar e do pâncreas. O uso em longo prazo dos IBPs pode interferir nesses processos, observou ele. E a supressão de ácido do estômago, que mata bactérias e outros micróbios, pode tornar as pessoas mais suscetíveis a infecções, como a causada pelo Clostridium difficile.
Tomar IBPs, segundo Plotnikoff, “muda a ecologia do intestino e permite, na verdade, o aumento excessivo de algumas substâncias que normalmente seriam mantidas sob controle”.
O ácido presente no estômago também estimula a tosse, o que ajuda a limpar os pulmões. Alguns especialistas acham que é por isso que muitos pacientes, especialmente aqueles que são frágeis e idosos, enfrentam um risco maior de ter pneumonia quando tomam IBPs.
Mas muitos gastroenterologistas respeitados estão convencidos de que os benefícios apresentados pelos medicamentos superam os riscos. Eles dizem que os medicamentos previnem complicações graves da DRGE, como as úlceras de esôfago e estômago e as estenoses pépticas, que ocorrem quando um processo inflamatório faz com que a extremidade inferior do esôfago se estreite.
Os estudos que detectaram que os pacientes que tomam IBPs correm riscos mais elevados “são análises estatísticas de populações enormes de pacientes. Mas como elas se relacionam com um único indivíduo que toma o medicamento?”, defende Donald O. Castell, diretor de doenças do esôfago da Universidade Médica da Carolina do Sul e um dos autores das diretrizes de prática para a DRGE do Colegiado Americano de Gastroenterologia, que tem relações financeiras com as empresas farmacêuticas que produzem os IBPs.
“Ninguém quer abrir mão dos benefícios que esses medicamentos trazem”, acrescenta ele.
A maioria dos médicos acha que a DRGE é um efeito colateral da epidemia de obesidade e que mudanças de estilo de vida podem amenizar a azia vivenciada por muitas pessoas.
“Se convidássemos 100 pessoas com refluxo a seguir rigidamente as recomendações de mudança de estilo de vida, 90 delas não precisariam tomar medicação alguma”, diz Castell.
“Difícil é conseguir que elas façam isso.”
Fonte iG
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