Organização já promoveu cortes de 20% nos programas de combate a doenças
crônicas e de 10% nos de tuberculose e malária; dezenas de países estão com o
pagamento da contribuição obrigatória atrasado e também houve redução das
doações voluntárias
Maior agência de saúde do mundo, a OMS é vítima da crise internacional e se
vê obrigada a instaurar um amplo pacote de austeridade que inclui o fim de
programas para o combate de certas doenças, a demissão de quase mil
funcionários, a inutilização de 2,5 mil impressoras e até o corte de voos em
classe executiva.
Ao final de 2012, o buraco nas contas da entidade bateu um recorde, com a
falta de US$ 547 milhões (cerca de R$ 1 bilhão) para financiar seu orçamento de
US$ 3,4 bilhões. Desde 2011, houve um corte de 20% nos programas de combate a
doenças crônicas e de 10% na liberação de recursos para programas nacionais de
tuberculose e de malária. Pelo menos outros 25 programas sofreram uma redução de
13%, incluindo combate ao tabaco, doenças vasculares e saúde mental.
Nos últimos 20 anos, a OMS se posicionou como ator central na definição de
políticas de saúde no mundo. Já os governos passaram a desenvolver o que ficou
conhecido como "diplomacia da saúde", ao usar questões sociais e doenças para
defender seus interesses. O resultado foi a ampliação sem precedentes das
funções da OMS, inclusive com a construção de novos edifícios para abrigar
funcionários.
"Em certo momento, estacionar o carro na OMS pelas manhãs se transformou em
uma batalha", diz uma funcionária do programa de combate ao cigarro. De Ebola a
novas gripes, passando por aids, obesidade, álcool, envelhecimento, poluição e
até acidentes de trânsito, a entidade multiplicou seus programas.
Agora, porém, governos deixam claro que não têm como manter o financiamento à
entidade, um debate que ganha força diante da necessidade de a OMS definir nos
próximos meses seu orçamento até 2015.
Para a máquina funcionar, a entidade conta com uma contribuição obrigatória
dos países que é definida com base no tamanho do PIB de cada um. Documentos
obtidos pelo Estado revelam que dezenas de países estão com pagamentos
atrasados. No total, os governos estão devendo mais de US$ 100 milhões.
A Grécia, em seu quinto ano de recessão, deve US$ 3,2 milhões. A Espanha, com
o desemprego em 25%, deve US$ 11 milhões. O maior devedor, porém, é o governo
americano, com US$ 36 milhões. O Brasil está em dia com suas contribuições.
Outro pilar financeiro são as contribuições voluntárias de governos e
entidades. Mas com a crise, dezenas de países anunciaram que não tinham como
justificar as doações ao mesmo tempo em que cortavam verbas de seus próprios
hospitais.
Demissões
A solução para evitar um colapso foi cortar e demitir. Pelos
planos da OMS, que terão de ser aprovados em maio por ministros, a redução de
gastos foi de US$ 200 milhões.
Desde 2011, cerca de mil dos 8 mil funcionários da entidade foram demitidos.
E as demissões, não ocorreram apenas no escritório central de Genebra. Na
África, região que ainda convive com doenças erradicadas na Europa há 50 anos,
304 pessoas foram demitidas. "A organização diminuiu", admite Margaret Chan,
diretora-geral da OMS. O objetivo é não aumentar os gastos da entidade nos
próximos seis anos. Em 2012, a OMS gastou US$ 700 milhões só em salários.
Entre os funcionários que falaram com o Estado, muitos indicam a tensão
diante da indefinição sobre quem continuará empregado. "O clima está péssimo",
disse um brasileiro que pediu para não ser identificado.
Cerca de 6 mil viagens de funcionários foram abolidas em 2012. A regra para
voar em classe executiva também mudou. Até 2012, quem tomasse um voo que durasse
mais de seis horas tinha direito à classe executiva. Agora, a viagem tem de ter
no mínimo nove horas. A medida gerou uma economia de US$ 28 milhões.
Outro objetivo da OMS é ampliar o número de doadores, justamente para não
ficar dependente de apenas alguns países. Thomas Zeltner, responsável pela
reforma financeira da entidade, destaca que 60% do financiamento vem hoje de
apenas dez países. "Precisamos de mais doadores para ter um financiamento mais
previsível", indicou.
Uma das metas é conseguir mais dinheiro dos Brics (Brasil, Rússia, Índia e
China). No biênio 2010-2011, o Brasil fez doações voluntárias de US$ 2,8
milhões, de US$ 1,5 bilhão destinado por governos à OMS. Só Bill Gates doou US$
447 milhões, 160 vezes mais que o Brasil.
Fonte Estadão
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