Getty Images: Rinite e asma estão entre as principais alergias |
Bactérias também são fundamentais para nossa saúde
Do pólen ao látex, passando por poeira ou animais domésticos, quatro em
cada dez pessoas são hoje consideradas alérgicas a algo. Mas se a
alergia não acometia as gerações de nossos avós, qual é a causa da
doença que acomete centenas de milhares de pessoas todos os anos?
Muitas teorias surgiram com o passar do tempo, mas agora cientistas acham que talvez tenham descoberto a origem das alergias.
Cada um de nós é coberto da cabeça aos pés por bactérias. Pesquisadores
acreditam que esses micro-organismos são a chave para entender por que
estamos nos tornando mais alérgicos.
As bactérias que revestem nossa pele, cobrem nossa boca e se
multiplicam em nossas entranhas não só excedem em número as nossas
próprias células (a proporção é de 10 bactérias para cada célula), como
também têm papel fundamental no aprimoramento dos nossos sistemas
imunológicos. Mudanças de estilo de vida estão influenciando esses
organismos e, por consequência, as alergias.
Para comprovar como essa teoria se aplica no mundo real, a reportagem
da BBC usou um microscópio para analisar as vidas de duas famílias de
alérgicos.
Em uma das famílias, Joe, de 8 anos, sofre de asma severa, rinite
alérgica, dermatite, além de alergia a nozes, a animais domésticos e a
ácaros e poeira.
Em outra família, a lista de alergias que acomete Morgan parece
infindável. Junto com um eczema severo e rinite alérgica, ele tem
aversão a laticínios, nozes, soja, kiwi, abacate, banana, látex, gatos,
cachorros e cavalos.
As duas famílias concordaram em fornecer amostras bacterianas de sua
pele, vísceras e até mesmo de suas casas na esperança de que isso possa
oferecer pistas sobre a origem de seus problemas.
Os resultados são surpreendentes. Como muitos de nós no Ocidente, as
famílias tinham poucos tipos de bactéria vivendo dentro e sobre elas
quando comparadas com indivíduos de tribos tradicionais em partes do
mundo em desenvolvimento.
Pesquisadores descobriram, por exemplo, que uma comunidade de caçadores
tinha não só uma alta diversidade de bactérias, mas apenas um em cada
1,5 mil indivíduos dessa tribo sofria de alergia. No Reino Unido, por
outro lado, a proporção é de uma para cada três pessoas.
O estilo de vida no Ocidente parece estar mudando nossas bactérias e nossa suscetibilidade a alergias. Mas de quem é a culpa?
É provável que existam vários culpados, mas o principal fator, segundo
os especialistas, pode ser a maneira como estamos criando nossos filhos.
Atualmente, um quarto dos bebês no Reino Unido nasce de cesarianas.
Segundo um estudo conduzido na Noruega, no entanto, bebês nascidos por
esse método têm 52% mais chance de sofrer asma do que aqueles nascidos
de parto normal.
Ameaça dos antibióticos
Cientistas acreditam que a bactéria a que os bebês estão expostos no
canal vaginal ajuda de certa forma a protegê-los de alergias, e o
crescimento das cesáreas podem estar elevando o número de crianças
alérgicas.
Mas o "combate" às suas próprias bactérias parece continuar à medida
que essas crianças crescem. Estima-se que o leite materno contenha cerca
de 900 espécies de bactérias, o que explica possivelmente por que bebês
alimentados por essa fonte energética são menos alérgicos.
Uma das maiores ameaças às bactérias protetoras de alergias vem,
contudo, dos antibióticos. A priori, esses medicamentos têm como
objetivo nos proteger, mas frequentemente reduzem a quantidade desses
seres em nosso organismo.
Um estudo recente mostrou, por exemplo, que o uso de antibióticos na
primeira fase da vida pode aumentar o risco de desenvolvimento de
dermatites em até 40%.
Não há dúvida de que as crianças hoje estão sendo expostas a menos
bactérias do que no passado, e sofrendo, assim, mais alergias.
Mas não é apenas a forma como as crianças nascem que impacta o número
de bactérias presentes em seu corpo. O estilo de vida que elas adotam à
medida que crescem também tem papel fundamental no desenvolvimento de
alergias, de acordo pesquisadores.
'Velhos amigos'
Ao acompanhar as duas famílias por quase 24 horas, a reportagem da BBC
descobriu que elas passavam, em média, 91% de seu tempo entre quatro
paredes (casa, escola, trabalho) – uma tendência bastante comum no Reino
Unido.
Na medida em que nossas vidas estão se tornando cada vez mais
sedentárias, perdemos uma vasta gama de bactérias que habitam em nossos
jardins e pairam no ar.
Assim, a maneira mais fácil de reduzir as chances de desenvolver alergias é sair de casa.
Desde passear com o cachorro a caminhar a pé até a escola, pesquisas
indicam que um pouco de ar puro traz benefícios incontestáveis para a
saúde.
Outro estudo constatou que quanto maior o contato com plantas e flores,
maior é a quantidade de bactérias na pele, o que também reduz a
propensão às alergias.
Segundo o professor Graham Rook, da Universidade College London, essas
bactérias são nosso "velhos amigos" e exercem papel fundamental para
nossa saúde.
"De certa forma, essa percepção de que os humanos são, de fato,
ecossistemas e que dependemos tanto desses micro-organismos é
provavelmente o mais importante avanço da medicina nos últimos cem
anos", diz.
BBC Brasil / R7
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