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sábado, 30 de março de 2013

A lenta mudança dos tratamentos psiquiátricos

Psicoterapia: estudos mostram que muitos pacientes são
submetidos a terapias sem comprovação científica
Apesar dos avanços obtidos com medicamentos, poucos pacientes recebem tratamentos baseados em evidência quando chegam à psicoterapia
 
Os tratamentos psiquiátricos fizeram grandes avanços desde a época em que o melhor remédio era a trepanação – a abertura de buracos no crânio para libertar os “maus espíritos”.
 
Ao longo dos últimos 30 anos, tratamentos como terapias cognitivo-comportamentais, terapia comportamental dialética e tratamentos familiares se mostraram eficazes contra distúrbios que vão da ansiedade à depressão, passando pela síndrome do estresse pós-traumático e por distúrbios alimentares.
 
O problema é que, surpreendentemente, poucos pacientes recebem tratamentos baseados em evidência quando chegam ao divã – em especial as terapias cognitivo-comportamentais, ou TCCs.
 
Em 2009, uma meta-análise realizada por importantes pesquisadores da saúde mental revelou que pacientes psiquiátricos dos Estados Unidos e da Grã-Bretanha raramente passam por TCCs, a despeito das inúmeras indicações de sua eficácia no tratamento de problemas comuns.
 
Uma pesquisa com quase 2.300 psicólogos nos Estados Unidos descobriu que 69% deles utilizavam TCCs durante parte do tempo ou em conjunto com outras terapias para tratar a depressão e a ansiedade.
 
Terapias cognitivo-comportamentais englobam diversos tipos de psicoterapia estruturada e direcionada, que se concentram nos pensamentos por trás dos sentimentos do paciente, incluindo terapias de exposição e outras atividades. Contudo, muitos pacientes são submetidos a um tipo de abordagem mista – com elementos retirados de diversos contextos de acordo com os preconceitos e a formação do terapeuta, ao invés das evidências científicas mais recentes. Até mesmo profissionais que afirmam utilizar abordagens baseadas em evidências raramente fazem isso. O problema é chamado de “deriva do terapeuta”.
 
“Um grande número de pessoas com problemas de saúde mental que poderiam ser tratadas de forma direta recebem terapias com poucas chances de eficácia”, afirmou Glenn Waller, diretor do departamento de psicologia da Universidade de Sheffield e um dos autores da meta-análise.
 
Uma pesquisa com 200 psicólogos publicada em 2005 revelou que apenas 17% deles utilizaram terapias de exposição (uma forma de TCC) com pacientes com síndrome de estresse pós-traumático, apesar das evidências de sua eficácia.
 
Em um estudo publicado em 2009 pela Universidade de Columbia, revelou-se que as descobertas científicas tinham pouca influência sobre o aprendizado e o uso de novos tratamentos pelos terapeutas. Porém, é muito mais importante determinar se os novos tratamentos podem ser integrados às terapias que já são utilizadas pelos especialistas.
 
O problema não ocorre apenas nos Estados Unidos. Há dois anos, Waller estudou terapeutas cognitivo-comportamentais ingleses que trataram pacientes com distúrbios alimentares, com o objetivo de avaliar as técnicas específicas que estivessem utilizando. Waller descobriu que menos da metade atuava com base em evidências científicas.
 
“Cerca de 30% faziam algo como trabalho motivacional e outros 25% trabalhavam com meditação de mente plena. Você não compraria um carro nessas condições”, ironizou Waller.
 
Então, por que a diferença? De acordo com Dianne Chambless, professora de psicologia da Universidade da Pensilvânia, alguns terapeutas veem seu trabalho como uma forma de arte, um processo delicado e individualizado que funciona (ou não funciona) com base na personalidade do terapeuta e em sua relação com o paciente. Outros veem a terapia mais como um processo estruturado, cientificamente baseado e com eficácia comprovada tanto em pesquisas quanto em estudos clínicos.
 
“A ideia da terapia como uma forma de arte é muito poderosa. Muitos psicólogos creem ter habilidades que lhes permitem adaptar o tratamento ao cliente de forma mais eficaz que qualquer cientista com seus dados”, diz a especialista.
 
Contudo, pesquisas sugerem o contrário. Um estudo realizado pela psicóloga clínica da Universidade de Calgary, Kristin von Ranson, e seus colegas em 2012 concluiu que os pacientes apresentaram resultados muito piores quando os especialistas não utilizaram tratamentos baseados em evidências ou os mesclaram com outra técnicas em prol de uma abordagem mais eclética, em comparação com tratamentos mais padronizados.
 
Terapeutas que pendiam para o lado mais “artístico” afirmaram que os tratamentos padronizados desvalorizam aspectos cruciais da terapia, como a empatia, o acolhimento e a comunicação – a chamada aliança terapêutica.
 
“Se você quer que seu paciente utilize um tratamento que funciona, a melhor forma de conseguir que isso aconteça é manter um bom relacionamento”, afirmou Bonnie Spring, professora de psiquiatria da Escola Feinberg de Medicina da Universidade Northwestern.
 
Mas alguns especialistas creem que essa seja uma escolha falsa.
 
“Ninguém acredita que é uma boa ideia ter um mau relacionamento com o cliente. O verdadeiro argumento é questionar se um bom relacionamento é tudo de que preciso para ajudar um paciente”, afirmou Chambless.
 
Além disso, tratamentos baseados em evidências, como as terapias cognitivo-comportamentais, ainda exigem experiência, julgamento clínico e habilidade dos profissionais, destacou Terry Wilson, professor de psicologia da Universidade Rutgers.
 
“O estereótipo em relação aos tratamentos que seguem manuais é que basta comprar o livro e seguir o passo a passo rígido. Mas isso está longe da verdade quando são feitos de forma competente.”
 
Apesar da disparidade entre a pesquisa e a prática, alguns especialistas são cautelosamente otimistas. Wilson acredita que os profissionais de saúde mental estão caminhando lentamente em direção a tratamentos baseados em evidências, especialmente os mais jovens. Ele aponta para a mudança paradigmática que ocorreu entre os médicos quando a medicina firmou um compromisso com a ciência, em vez de produzir artistas ou gurus médicos.
 
“Enquanto campo, a psicologia clínica precisa passar pelo mesmo processo”, afirmou. “Precisamos firmar um compromisso com a ciência.”
 
Você está à procura de um terapeuta bem versado nos últimos avanços da pesquisa acadêmica? Especialistas recomendam que seja realizada uma entrevista com o possível terapeuta antes do início do tratamento, especialmente se estiver à procura de um tipo específico de tratamento.
 
Algumas perguntas importantes são:
 
1. Qual é formação dele e com quem trabalhou?
 
2. A que associações profissionais pertence? (Se estiver em busca de um terapeuta cognitivo comportamental, por exemplo, pergunte se ele pertence à Associação de Terapias Comportamentais e Cognitivas, à qual pertencem os principais pesquisadores da área.)
 
3. O que ele faz para acompanhar as pesquisas em relação ao tratamento da minha condição?
 
4. Como ele sabe que seu tratamento funciona?
 
5. Ele considera a própria abordagem eclética? (Terapeutas que respondem positivamente a esse quesito têm menos chances de aderirem a tratamentos baseados em evidências.)
 
6. Que manuais ele usa?
 
7. O que ele pode mostrar em termos de resultados?
 
“Um clínico incapaz de dizer quantos pacientes melhoraram não vai se importar com a sua melhora”, afirmou Waller.

Fonte iG

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