Governo do Estado diz que vai ampliar o Pronto Socorro e nega falta de médicos
Sentado em uma cadeira de rodas, o aposentado Lúcio Paulo de Almeida equilibra um balde entre os joelhos com a recomendação médica para vomitar dentro dele caso a pressão alta volte a lhe embrulhar o estômago. Aos 75 anos, "seu Lúcio", como é chamado, aguarda no corredor do Hospital do Servidor Público do Estado de São Paulo (Iamspe), no bairro do Ibirapuera, zona sul. Na última segunda-feira (25), ele se juntou a outros 500 pacientes que receberam atendimento no Pronto Socorro.
Com dificuldade para se comunicar, seu Lúcio delegou o desabafo aos filhos Raquel (36) e Enos de Almeida (39), que, sem lugar para sentar, lhe faziam companhia de pé. “Lá dentro o cuidado é bom, o problema é ser atendido”, lamentou Raquel. Eles comentavam, surpresos, as condições do prédio: “A gente é atendido aqui desde os 6, 7 anos, e nada mudou. Acho que o Pronto Socorro nunca viu uma reforma”, lembra Enos. “Falta estrutura e comunicação: a gente sempre fica na dúvida se vai ser recebido.”
O aposentado Benedito Vicente Alves, de 90 anos, também não sabia como seria o atendimento. Diabético, ele só foi recebido no consultório para tratar as feridas pelo corpo duas horas depois de chegar ao PS, embora a pulseira laranja que ele carregava no pulso recomendasse atendimento em 15 minutos.
“Falta médico”
Presidente da Comissão Consultiva Mista (CCM) do Iamspe, Sylvio Micelli diz que o PS passou por uma pequena reforma nos anos 1980, e que por isso uma "nova ampliação é necessária". "É preciso aumentar o espaço do Pronto Socorro e, principalmente, o número de médicos e consultórios de emergência."
Endocrinologista há 40 anos no Hospital do Servidor, o presidente da Associação Médica do Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual (Amiamspe), Otelo Chino Júnior, diz que a falta de doutores não é problema apenas do PS.
“Precisamos de, pelo menos, 100 médicos de diversas especialidades, principalmente geriatras”, diz ele, que atribui a “alta rotatividade de médicos” aos baixos salários. A remuneração média no hospital é de R$ 3.800, bem abaixo dos R$ 9.813 reivindicados pela categoria.
De acordo com o hospital, 60% dos pacientes têm mais de 60 anos. É por isso que Chino Júnior pede não apenas mais geriatras, mas a criação de outros 30 leitos para esses pacientes. “Na Unidade de Terapia Intensiva [UTI] também faltam 30 camas.”
À reportagem, a assessoria do hospital respondeu que “o corpo clínico é formado por aproximadamente 1.400 médicos que atendem 43 especialidades”, mas não soube informar o número de médicos que dão plantão no PS.
"Falta verba"
Para reestruturar o Pronto Socorro, contratar médicos e aumentar os convênios, Micelli e Chino Júnior defendem um novo sistema de arrecadação. Em dezembro do ano passado, o presidente da CCM se encontrou com o governador Geraldo Alckmin (PSDB) no Palácio dos Bandeirantes para fazer um pedido: ele espera que o governo do Estado repasse ao hospital o equivalente a R$ 500 milhões por ano. Hoje, esse valor é de R$ 100 milhões. “O que a gente quer é que o governo contribua com o mesmo valor arrecadado anualmente com a contribuição de 2% descontados do salário dos servidores.”
Embora não exista nenhuma lei que obrigue esse repasse, Micelli e Chino Júnior fazem uma comparação com o sistema de arrecadação dos planos de saúde privados. “Normalmente, a empresa paga ao convênio médico até mais do que o funcionário”, lembra Micelli.
O advogado trabalhista Andrei Fernandes de Oliveira explica ao iG que a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não obriga a concessão de plano de saúde por parte das empresas, mas que essa já é uma prática consolidada no Brasil. “Nos anos 1990, a maioria das empresas não cobrava participação do empregado, mas como houve um aumento desproporcional da utilização, as companhias estipularam uma participação simbólica do empregado, que costuma arcar com até 20% do plano, enquanto as empresas desembolsam os outros 80%.”
“Com a melhora no Hospital do Servidor, o Sistema Único de Saúde (SUS) receberá menos servidores, que darão lugar aos pacientes que não têm convênio”, avalia o presidente da Amiamspe.
Questionado pela reportagem sobre a possibilidade de aumentar os repasses, o governo do Estado afirma que “investe sistematicamente no Iamspe”. Além do desembolso anual de R$ 100 milhões, ele “está destinando R$ 150 milhões à reforma do hospital” ainda em 2013. “Uma das primeiras obras a serem concluídas é o Pronto Socorro [...] Todas as obras de reforma e ampliação do complexo hospitalar começam este ano”, informa a assessoria do governo.
É o que espera a aposentada Carmen Viana, de 59 anos. Depois de ficar um mês internada no Hospital do Servidor em razão de uma trombose na perna esquerda, ela recebeu alta no último dia 20, mas precisou correr para o Pronto Socorro cinco dias depois porque o remédio receitado lhe causou alergia pelo corpo todo. A filha, Priscila Viana, conta que a mãe aguardava atendimento havia oito horas.
“Ela chegou às 10h, recebeu soro e injeção às 13h30, mas, por falta de médico, aguarda para ser atendida de novo”, conta ao iG no fim da tarde de segunda-feira.
Convênios
A direção do Hospital do Servidor cancelou, no ano passado, convênio com algumas Santas Casas de Misericórdia, deixando sem atendimento servidores do interior e litoral de São Paulo.
Segundo a unidade de Santa Cruz do Rio Pardo, o contrato rompido em 2012 só foi retomado “parcialmente” no começo deste mês. Já a Santa Casa de Lorena volta a atender servidores estaduais a partir de segunda-feira (4), enquanto a de Santos ainda não teve o convênio renovado. “O Iamspe tem todo interesse – e dispõe de recursos próprios – para credenciar um hospital na cidade”, informou a assessoria de imprensa.
Fonte iG