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Foto: Divulgação / Laine Valgas |
Uma dieta com sucos, vegetais e frutas pode até fazer bem, mas não há comprovação científica de que eliminará as toxinas do corpo
Uma semana de dieta detox é aquela resolução de Ano-Novo que entrou aos 45 do segundo tempo depois da comilança que começou no Natal. Se você exagerou nos doces, salgados e, claro, nas bebidas alcoólicas, é bom pensar duas vezes antes de acreditar que esse tipo de mudança alimentar será capaz de fazer uma faxina geral no organismo, mandando embora toxinas e a culpa que vem de carona.
Moda entre os que buscam soluções instantâneas para tudo, a ideia de desintoxicar o corpo rapidamente por meio da alimentação vem despertando a preocupação de especialistas em diferentes áreas, que não encontram na ciência respaldo para tantas promessas milagrosas. A premissa desses tratamentos — que englobam cardápios à base de sucos, consumo de produtos vendidos em supermercados para limpar o organismo e até imersões em spas especializados — é de que a ingestão de frituras, alimentos industrializados e álcool libera toxinas que deixam o corpo contaminado, e que o organismo precisa de ajuda para eliminá-las.
Para o bioquímico Jose Miguel Mulet, professor da Universidade Politécnica de Valência, na Espanha, e autor do livro Comer sin Miedo, isso não passa de uma estratégia comercial.
— Algumas pessoas podem estar com excesso de peso, cansadas, mas isso não significa que estão intoxicadas. Naturalmente, nosso próprio corpo se encarrega de eliminar toxinas. Temos órgãos para isso, como o fígado, os rins e o pulmão. A ideia de que podemos nos desintoxicar rapidamente com esses alimentos ou produtos detox não tem base científica — diz Mulet.
Corpo elimina sozinho as toxinas
É o que também defende David Bender, professor de bioquímica nutricional do University College London e autor de artigos sobre o tema. O especialista é categórico ao afirmar que o grande erro das dietas detox é a ideia de que o corpo não poderia lidar sozinho com a quantidade de toxinas que a vida moderna nos faz acumular.
— Muitos dizem que, por isso, nosso metabolismo fica mais lento e acabamos engordando, o que é absurdo. Se isso ocorresse, estaríamos contaminados, doentes e precisando ir ao hospital — explica
Mercado cresce pela lei do menor esforço
Mas, então, por que o mercado do detox cresce tanto? Para Mulet, o fenômeno faz parte de um estilo de vida imediatista, que procura resultados rápidos com o mínimo de esforço. Todos nós nos sentimos quimicamente sujos, vítimas da poluição das grandes cidades e do que ingerimos. E a indústria se aproveita disso. Para o comércio, desintoxicação é sinônimo de sucesso de vendas.
— De modo geral, o termo detox é designado para "vender" uma ideia irreal de que o consumo da dieta fará uma limpeza imediata no organismo, emagrecendo, prevenindo o estresse e devolvendo a saúde perdida nos dias em que não se cuidou da alimentação. O mais impressionante é que os trabalhos científicos, realizados em ambientes controlados, com testes tanto em laboratórios quanto em pessoas, nunca conseguiram comprovar isso — explica a nutricionista Carla Haas Piovesan, professora da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS).
A especialista, entretanto, não descarta os benefícios que os sucos oferecidos nesses tratamentos podem trazer para o organismo.
— O que precisa ficar claro é que misturar folhas verdes como a de couve com uma fatia de abacaxi, ou meia maçã, mais limão e gengibre é saudável, sim, mas não é milagroso. Não é remédio, não limpa o fígado nem o intestino. Esses alimentos trazem benefícios, mas não compensam os excessos. Sempre que tu optares por uma refeição com vegetais, terás benefício para o corpo. É muito mais saudável, por exemplo, começar o dia com um copo de suco preparado com alimentos frescos do que beber uma xícara de café preto com açúcar — reitera a professora Carla.
Bons hábitos devem ser durarouros para manter o organismo saudável
Apesar do alerta de especialistas, uma variedade cada vez maior de produtos que prometem eliminar toxinas chega ao mercado brasileiro e tem procura crescente.
Em cápsulas de vitaminas e minerais, em sucos prontos para o consumo ou em barras de cereal, eles vêm acompanhados de uma série de promessas que, na maioria das vezes, termina em frustração. A endocrinologista Marcela Ferrão, do Centro de Obesidade e Síndrome Metabólica do Hospital São Lucas da PUCRS, destaca que apenas um programa alimentar equilibrado e permanente é capaz de evitar o efeito "sanfona" e promover a saúde, já que uma dieta saudável é rica em antioxidantes, fundamentais para manter o corpo em equilíbrio.
A explicação está no fato de que, no nosso organismo, o processo de oxidação é constante. São essas reações químicas que levam à produção de energia necessária para nossas atividades diárias. Entretanto, também levam à produção de radicais livres. Quando não há um equilíbrio entre a produção de radicais livres e o consumo de antioxidantes, pode-se ter o estresse oxidativo, que acelera o processo de muitas enfermidades crônicas e degenerativas — como doenças cardíacas, câncer,Alzheimer — e o processo de envelhecimento, explica a nutricionista Carla Haas Piovesan.
— Os vegetais e frutas devem estar distribuídos em um plano alimentar, e esse consumo deve ser diário. Não há a necessidade de fazer uma receita mirabolante passada no liquidificador em jejum às 6h. Se tu comeres uma deliciosa salada de alface, rúcula e abacaxi picado no almoço ou no jantar, assim como frutas distribuídas adequadamente ao longo do dia, terás todos os benefícios que esses alimentos podem dar — conclui.
Radicais Livres: essas moléculas, em quantidades pequenas, são benéficas ao organismo pois auxiliam na defesa contra infecções, por exemplo. Mas o excesso delas é prejudicial à saúde, já que podem danificar o DNA de nossas células, colaborando para o envelhecimento precoce e doenças como Alzheimer, afecções reumáticas, acidentes vasculares cerebrais, Parkinson, entre outras.
Antioxidantes: são moléculas com carga positiva que se combinam com os radicais livres, de carga negativa, tornando-os inofensivos. Portanto, essas substâncias têm a capacidade de anular a ação de oxidação desses radicais.
Oxidação: as células do nosso corpo necessitam constantemente de oxigênio para converter os nutrientes absorvidos dos alimentos em energia. Entretanto, esse processo de queima do oxigênio pelas células (oxidação) libera moléculas instáveis que podem danificar as células sadias. Essas moléculas são chamadas de radicais livres.
Estresse oxidativo: desequilíbrio entre a produção de radicais livres e o consumo de antioxidantes.
Com o pé bem longe da jaca
Exagerou no Natal? Veja algumas dicas para não perder a linha no Ano-Novo
_ Cuidado com o álcool e com bebidas calóricas
Procure controlar sua ingestão e beba bastante água natural sem gás, para uma boa hidratação e para evitar a distensão estomacal, quando o abdômen aumenta de volume por causa do acúmulo de gases e líquidos. É bom ingerir água enquanto estiver consumindo álcool.
_ Mantenha a rotina de atividade física e intensifique os exercícios aeróbicos
Mesmo que a academia não abra neste período, saia para uma caminhada ou corrida.
_ Faça escolhas conscientes!
Planeje-se! Para o Ano-Novo, selecione alimentos que você mais gosta e aproveite para comer pequenas porções dos escolhidos, inclusive as sobremesas.
_ Não pule refeições.
Mesmo no dia da virada, para evitar o descontrole alimentar. E cuidado com os petiscos! Não exagere nas castanhas, nas nozes e nas frutas secas. Aguarde o momento certo para consumir suas calorias.
_ Monte cardápios e preparações prazerosas, com significado para a família e os convidados. No dia seguinte, retome a dieta habitual e equilibrada.
Zero Hora