A alternativa, contudo, pode estar mais perto do que se imagina: de acordo com um estudo feito por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), a erva brasileira Ilex paraguariense pode ser uma ótima — e natural — aliada de quem luta contra a balança. Segundo os estudiosos, a PholiaNegra (extrato da planta) não só reduz o peso corporal tanto quanto a sibutramina, como o faz sem efeitos colaterais.
De um lado, médicos e farmacêuticos defendem que a venda desse tipo de remédio seja fiscalizada com maior rigidez — e que apenas pessoas com prescrição médica tenham acesso a ele. Do outro lado dessa disputa está a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), defensora da tese de que o melhor a ser feito é restringir ao máximo ou até mesmo acabar com a comercialização desses medicamentos, uma vez que apresentariam “riscos à saúde superiores aos benefícios”.
Em outubro do ano passado, a diretoria da Anvisa decidiu proibir a fabricação e venda de remédios para emagrecer que atuem no sistema nervoso central e que sejam derivados de anfetamina — como dietilpropiona, mazindol e femproporex. A sibutramina não entrou na lista dos medicamentos vetados, mas agora seu uso precisa seguir certas restrições, como não ser prescrito por mais de 60 dias e ser indicado apenas para pacientes com índice de massa corpórea (IMC) acima de 30 que tenham assinado um termo de responsabilidade.
Agora, apenas obesos sem histórico de doenças cardiovasculares, diabéticos ou com intolerância à glicose, dislipedêmicos (indivíduos com excesso de gordura no sangue), hiperuricêmicos (com nível elevado de uratos no sangue), mulheres com ovário policístico e com hepatite não alcoólica estão aptos a tomar a sibutramina.
Para pessoas com dificuldades em perder peso, a discussão entre os profissionais de saúde e o órgão regulador pode significar mais e mais quilos extras — e todas as consequências que vêm com eles, como diabetes, hipertensão, fadiga e problemas de baixa autoestima, por exemplo.
No trabalho feito pela USP, os pesquisadores analisaram as propriedades emagrecedoras da PholiaNegra e compararam os resultados com os obtidos pelo uso da sibutramina. Maria Martha Bernardi, professora do departamento de Patologia da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia da USP e coordenadora da pesquisa, explica que a principal diferença entre a planta e a droga é o modo como cada uma atua no organismo. “O fitoterápico age direto no estômago, servindo para diminuir a movimentação dele. A sibutramina tem efeito no cérebro, diminuindo o apetite”, compara. A baixa movimentação do estômago faz com que o alimento demore mais para ser digerido. O resultado é barriga cheia por mais tempo e, consequentemente, menos fome.
Para descobrir os efeitos do fitoterápico, Bernardi e seu grupo de pesquisadores dividiram 60 ratos (30 machos e 30 fêmeas) em seis grupos. Durante um mês, todos comeram ração hipercalórica. No segundo mês da experiência, dois grupos, um de machos e um de fêmeas, foram tratados com sibutramina. Outros dois grupos, também de sexos diferentes, tomaram a PholiaNegra e o restante, apenas água. Após o cálculo da porcentagem de peso semanal e total de todos os grupos, descobriu-se que os resultados com a PholiaNegra e com a sibutramina foram semelhantes. Para as ratas, o experimento se mostrou ainda melhor. “A diferença entre o peso inicial e o final (o chamado Delta de Perda de Peso in vivo) chegou a 10% do peso total, e as fêmeas apresentaram um DPP bem maior que os machos”, completa a pesquisadora.
Polêmica Se, para a Anvisa, os benefícios dos emagrecedores não compensam os riscos, para médicos e, principalmente, pacientes muitas vezes os remédios representam a única alternativa para viabilizar a perda de peso. O endocrinologista Reginaldo Albuquerque é um dos que engrossa o coro dos defensores das medicações. “A proibição só contribui para a permanência de mais gordos”, comenta. Ainda que já existam pesquisas que relacionam o uso da sibutramina ao aumento da incidência de problemas cardíacos, o médico ensina que, se usados com acompanhamento médico e pelo período determinado pelo profissional, não há motivo para temer os emagrecedores. “Eles só devem ser evitados por cardiopatas, idosos e grávidas”, completa.
Graça Coelho, 55 anos, fez uso da sibutramina em 2009. Ao contrário do que acontece com a maioria das pessoas, entretanto, a servidora pública conta que não teve maiores problemas com o medicamento. “Não senti nenhum efeito colateral e ainda emagreci 5kg em seis meses”, detalha. Ela defende que o remédio, aliado a uma dieta de poucas calorias e acompanhamento médico, também a deixava mais tranquila — e só parou de tomá-lo após a restrição da venda da substância. Com remédios fitoterápicos e manipulados a história foi diferente: mesmo com melhores resultados (em seis meses, Graça eliminou 24kg e mudou do manequim 48 para o 40), a qualidade de vida ficou prejudicada . “Sentia muito mal-estar, enjoo e palpitações”, descreve. Agora, ela conta que aprendeu o que deve fazer para se manter em forma. “Como pouco carboidrato e estou mantendo meu peso sozinha, sem médicos ou remédios.”
Para o médico ortomolecular Ícaro Alcantra, o grande problema é que nem sempre esses medicamentos são usados por quem realmente precisa deles. “Infelizmente, as medidas de fiscalização não têm dificultado o acesso e a prescrição abusivos, como seria necessário à saúde da população”, justifica. Segundo o médico, não é raro encontrar pacientes que sentem na pele as consequências dessa má utilização dos remédios — e acabam lotando consultórios em busca de alternativas “naturais” para reparar as sequelas, como ansiedade, pânico, depressão, fadiga, “efeito sanfona” e outros distúrbios orgânicos. “Assim sendo, sou obrigado a ser favorável à medida mais radical: proibição dos ‘controlados’ para emagrecimento”, conclui.
Temor
A servidora pública Rosimari Bortolepto Butinhão, 57 anos, teve a sorte de não ter sofrido com os efeitos colaterais dos remédios controlados. Em meados de 2008, ela fez uso da sibutramina para tentar perder parte dos 127kg que pesava na época. Além da boca seca, nada aconteceu a Rosimari — nem mesmo a perda de peso. Ela passou, então, para outros medicamentos, à base de anfetaminas. “Comecei a tomar um coquetel com substâncias para queimar gordura, com inibidores de apetite e antidepressivos”, explica. Para ela, proibir só ajuda a aumentar a desinformação sobre os verdadeiros efeitos das substâncias. “Acho temerário proibir. As pessoas vão arranjar um jeito de comprar, e aí cai no ciclo vicioso. Quando se compra fora, compra qualquer porcaria, é igual droga”, opina. “Cabe ao médico acompanhar. Em mim, não causou dependência nenhuma.”
Ana Lúcia Oliveira, 31 anos, também aposta na ajuda medicamentosa para controlar o peso. Desde 2001, quando começou o primeiro tratamento, a assistente administrativa já experimentou uma extensa lista de anorexígenos, remédios alopáticos e fitoterápicos. Atualmente, o composto receitado pelo médico tem 11 ingredientes, além de outras quatro fórmulas, com sibutramina e anfepramona. “No início, eu sentia muito enjoo, boca seca, dificuldade pra dormir, taquicardia, agitação e prisão de ventre”, conta. Mesmo com os efeitos colaterais, Ana defende que, uma vez que a obesidade é considerada uma doença, nada mais natural que tratá-la com remédios. “Existem medicamentos para tratar diabetes, pressão alta ou colesterol. Por que não tratar a obesidade dessa forma?”, questiona. “Penso que a pessoa que tem dificuldades em manter o peso dentro do padrão saudável vai ter que se equilibrar na balança pelo resto da vida, assim como o diabético controla a glicemia e o hipertenso a pressão.”
Velha conhecida
Feita do extrato concentrado da planta Ilex paraguariensis, PholiaNegra é o nome comercial do fitoterápico. Mesmo que o nome científico da planta não seja assim tão familiar, ela é velha conhecida dos brasileiros: famosa apenas como erva-mate, é com ela que se faz o chimarrão, bebida especialmente popular no sul do país. Eentre as propriedades da planta estão os alcaloides, como teofilina e cafeína, que, com ação termogênica, aumentam o gasto energético e facilitam a degradação das gorduras do corpo (lipólise).
Tipos
Mesmo com nomes diferentes, os medicamentos para emagrecer podem ser agrupados de acordo com o seu funcionamento no organismo. Veja algumas classificações e características:
» Remédios que diminuem a absorção de gorduras e carboidratos nos intestinos.
Exemplos:
quitosana, orlistat (Xenical), cassiolamina, faseolamina, psyllium.
» Remédios que aceleram o metabolismo como um todo (e reduzem apetite). Têm efeitos similares aos da adrenalina, por isso, são os campeões em efeitos colaterais — como aumento da pressão cardíaca, da frequência dos batimentos cardíacos, da ansiedade e da agitação.
Exemplos:
anfepramona, sibutramina, femproporex, dietilpropiona, PholiaMagra.
» Remédios que aumentam a termogênese, ou gasto de energia, para gerar calor.
Exemplos:
citrus aurantium, garcinia, L-carnitina, cártamo.
» Remédios que desaceleram a digestão.
Exemplos:
slendesta, PholiaNegra, Irvingia gambonensis.
Fonte: Ícaro Alcantra, médico ortomolecular
PholiaNegra X Sibutramina
PholiaNegra
Onde atua: estômago.
Como age: retarda o esvaziamento gástrico, acelera a sensação de saciedade (plenitude gástrica), altera o metabolismo de ácido graxos e de glicose — o que diminui a formação de gordura visceral — e reduz o quociente respiratório. Efeitos colaterais: de acordo com o estudo feito pelos pesquisadores da USP, as cobaias não apresentaram efeitos colaterais.
Sibutramina
Onde atua: cérebro.
Como age: atua em áreas que controlam não só o humor, mas a sensação de bem-estar e o apetite. O remédio inibe a reabsorção, recaptação e degradação de neurotransmissores, como serotonina, noradrenalina e dopamina. Isso faz com que essas substâncias fiquem disponíveis por mais tempo estimulando os neurônios. Aumenta a sensação de saciedade e inibe a fome. Efeitos colaterais: boca seca, aumento da pressão sanguínea, insônia, dor de cabeça, taquicardia, vertigem, irritação no estômago, náusea, vômito, alteração no paladar.