As ofertas foram apresentadas na 4ª Expoquantum, feira de terapias e produtos da chamada medicina quântica, corrente que transpõe conceitos da física para tratamentos alternativos.
A feira aconteceu nos dias 14 e 15 deste mês, no Palácio de Convenções do Anhembi, em São Paulo. Reuniu 5.000 pessoas e 119 expositores.
Editoria de Arte/Editoria de Arte/Folhapress |
A advogada Maria Lucia Teixeira de Araújo, 60, foi "de curiosa". Chegou cética e saiu com uma pulseira holográfica que diz aumentar o equilíbrio --parecida com a pulseira Power Balance, cuja publicidade foi proibida pela Anvisa em 2010.
"Não acreditava", diz. Depois da demonstração feita pelo expositor, não resistiu.
O vendedor pediu que ela cruzasse as pernas, em pé, e tentou desequilibrá-la,
primeiro sem e depois com a pulseira. Com as mãos vazias, ela quase caiu. Quando
segurou a pulseira de silicone, o homem se pendurou no seu braço e ela não se
desequilibrou.
"Ando com mais firmeza. Não tiro a pulseira nem para dormir", disse ela, uma
semana depois.
"Nenhum desses produtos tem relação com conceitos da física quântica", diz
Daniel Bezerra, físico e autor do livro "Pura Picaretagem" (Leya, 176 págs., R$
29,90), escrito com o jornalista Carlos Orsi.
Surgida no século 20, a física quântica trata do mundo microscópico. Ao
observar a atividade de partículas subatômicas, como elétrons, cientistas
descobriram que elas se comportavam de forma diferente da realidade
macroscópica.
"O mundo microscópico se descreve com probabilidades, há elétrons que podem
atravessar paredes. Mas isso tudo no mundo microscópico", diz Marcelo Knobel,
físico e professor da Unicamp.
Para Orsi, os princípios que contrariam o senso comum fazem com que a física
quântica seja usada para justificar terapias alternativas. "O raciocínio é: se a
física quântica não faz sentido e é ciência, por que tal produto não pode ser
também?", diz.
O fenômeno do misticismo quântico começou em 1975, na Califórnia (EUA),
segundo Osvaldo Pessoa Jr., professor de filosofia da ciência da USP.
"Surgem correntes que tentam explicar como a física quântica justifica uma
visão mística da realidade. Isso tem seu auge nos anos 1990 e 2000 [com os
filmes 'Quem Somos Nós?' e 'O Segredo']."
Os dois filmes emprestam outra ideia da física: a de que o ato da observação
define qual característica será manifestada por uma partícula.
"Algumas interpretações da física incluem o observador consciente como
importante nesse processo. Mas o argumento do filme 'O Segredo' de que o
observador pode modificar a realidade não é sustentado", diz Pessoa Jr.
Salto quântico
Para os defensores da medicina quântica, não faltam evidências. "A física quântica é a física das possibilidades", disse à Folha o físico indiano Amit Goswami, hoje o divulgador mais conhecido dessa corrente. Ele esteve no Brasil para um simpósio, realizado com a feira.
Para os defensores da medicina quântica, não faltam evidências. "A física quântica é a física das possibilidades", disse à Folha o físico indiano Amit Goswami, hoje o divulgador mais conhecido dessa corrente. Ele esteve no Brasil para um simpósio, realizado com a feira.
"O processo de cura quântica é completamente conhecido. Não há só o corpo
físico, há também o energético."
Ele reconhece que há falsas promessas vendidas com o rótulo de ciência. "Isso
é esperado. Mas não é suficiente para anular todos os bons resultados dessas
terapias."
Por aqui, o pai da saúde quântica é o engenheiro Wallace Lima (as vogais
foram duplicadas depois de um estudo cabalístico). Organizador do simpósio, ele
conta que sentiu os efeitos de terapias quânticas na sua saúde.
"Tinha 25 anos quando tive um 'salto quântico': estava com gastrite, mudei a
alimentação e isso mudou meu modo de ser. A saúde quântica vê a doença como
oportunidade de transformação."
Para o clínico geral Paulo Olzon, da Unifesp, a abordagem preventiva das
terapias quânticas é interessante.
"Não acredito em formulações mágicas. Mas meditação e mudança de atitude em
relação à vida podem ter influência sobre doenças."
Folhaonline