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Conhecimento em inglês é exigido até para posições operacionais
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Cursos do idioma voltados para áreas específicas podem ser um diferencial no currículo profissional
A língua inglesa deixou de ser uma vantagem no currículo dos profissionais e passou a ser uma exigência há algum tempo. A falta da fluência no idioma e de plena consciência de qual é o nível de conhecimento em inglês pode colocar o profissional em situações constrangedoras em uma entrevista de emprego e fazer com que ele perca oportunidades que poderiam alavancar a sua carreira, como no caso dos 110 universitários bolsistas do programa do governo Ciência Sem Fronteiras, que tiveram de deixar os países em que estavam estudando (84 no Canadá e 26 na Austrália) antes do previsto.
Segundo a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão do Ministério da Educação (MEC), estes alunos não alcançaram os níveis de proficiência em inglês necessários para ingressar nas universidades estrangeiras e estagiar nestes países.
Para o gerente do departamento acadêmico da rede de ensino Cultura Inglesa, Vinícius Nobre, o que aconteceu com os universitários do Ciência sem Fronteiras é resultado de uma ilusão de que só se aprende inglês indo morar fora do País. “É um mito absurdo, realmente perigoso. [Aprender inglês] não é só isso, não acontece do dia para a noite. É preciso ter um conhecimento mais científico e sério do processo”, observa.
A necessidade profissional de aprender a língua fica ainda mais clara durante a procura de um novo emprego. Hoje em dia, mesmo em posições operacionais, como atendentes de telemarketing, o conhecimento básico do inglês é uma exigência das empresas, pela existência de termos técnicos usados no dia a dia do trabalho que são próprios da língua anglo-saxã. E em diversos casos o profissional precisa de muito mais do que o conhecimento básico. É também uma exigência ser fluente e ter um vocabulário amplo e bem desenvolto para lidar com as situações de sua área de atuação, como um advogado de uma multinacional.
Mentira no currículo
No entanto, o que os recrutadores percebem é que uma grande parcela dos profissionais não está ciente de qual realmente é o seu nível de conhecimento em inglês, ou então, mentem no currículo.
“As pessoas mentem mais do que se enganam. Elas sabem que o idioma é uma das principais exigências de pré-avaliação de currículo. Não me interessa se o candidato fala ‘Eu entendo tudo, mas eu não falo’. Isso não é inglês nem fluente, nem avançado e nem intermediário se bobear”, conta a recrutadora Juliana Zuccarello, da Newik, unidade da empresa especializada em recrutamentos Havik.
Para o também recrutador Edson Balestri, gerente da ManpowerGroup Solutions, ao mentir sobre a proficiência de inglês no currículo, o profissional se coloca em uma posição bastante constrangedora.
Ainda que ele consiga passar na entrevista, por ter sido mal avaliado, ele provavelmente terá problemas no dia a dia do trabalho. "São poucos os casos em que a empresa exige o inglês e o profissional não utiliza. Hoje em dia, 75% [das empresas] pedem o idioma", diz.
Como saber qual é o seu nível de inglês?
Para não fazer feio na entrevista e ter certeza de que tem as competências necessárias para a vaga à qual está se candidatando, o ideal é que o profissional seja sincero em seu currículo e coloque o nível de inglês correto. No entanto, a linha que separa um conhecimento avançado de uma fluência, por exemplo, é tênue e, muitas vezes, o candidato pode se confundir ou fazer uma auto avaliação equivocada.
Segundo Nobre, da Cultura Inglesa, só é possível saber com precisão qual é a proficiência de um profissional em um determinado idioma quando ele é testado por um especialista. “Para determinar em qual nível de proficiência a pessoa se encontra, uma série de habilidades são testadas, desde a produção oral, produção escrita, compreensão, conhecimento estrutural, lexical. É uma avaliação bastante complexa. Apenas quem tem o treinamento certo e os recursos apropriados que tem como fazer uma avaliação correta”, conta.
No entanto, para estabelecer uma convenção de quais habilidades são necessárias para cada nível de inglês, o Conselho Europeu criou, em 2001, o Quadro Europeu Comum de Referência para Línguas. Este sistema é utilizado como base para a maioria das instituições de ensino avaliarem corretamente o nível de inglês de quem está sendo examinado. Veja abaixo o Quadro Europeu Comum de Referência para Línguas para ter uma melhor noção de qual é o seu nível de inglês e o que colocar no currículo:
Quadro Europeu Comum de Referência para Línguas
A1 - Iniciante: Tem a habilidade básica de se comunicar e trocar informações de uma maneira simples, como por exemplo perguntar o endereço de algum lugar ou conseguir pedir um prato em um restaurante.
A2 - Básico: Tem a habilidade de lidar com informações diretas e simples e de se expressar em contextos já familiarizados. Por exemplo, contar como está se sentindo naquele dia.
B1 - Intermediário: Tem a habilidade de se expressar de uma maneira limitada em situações familiares e de lidar com situações que não sejam de rotina, como, por exemplo, abrir uma conta em banco.
B2 – Independente: Tem a capacidade de se expressar em diversos tipos de situações e de alcançar os seus objetivos em uma conversa. Por exemplo, guiar um turista pela cidade e dar detalhes sobre os pontos que estão visitando.
C1 - Proficiência Operativa Eficaz (Avançado): Tem a habilidade de se comunicar com eficiência e propriedade em conversas que fogem das situações rotineiras. Por exemplo, consegue argumentar em uma discussão.
C2 - Domínio Pleno (Fluente): Tem a habilidade cognitiva de lidar com materiais acadêmicos e utiliza a língua de maneira tão boa, ou até melhor, que um nativo.
Cursos de inglês específicos são um diferencial
Algumas áreas, no entanto, exigem um vocabulário bastante técnico e que mesmo alguém considerado fluente pode não conhecer, como as áreas de saúde, engenharia, aviação, jurídica ou mesmo a de negócios. Principalmente para quem está iniciando a carreira, a falta de conhecimento específico no idioma utilizado em sua área de atuação pode ser um empecilho em um processo seletivo mais rigoroso. Para isso, existem no mercado os cursos de inglês especializados para determinados setores do trabalho.
“As características dos cursos específicos são muito parecidas com os cursos gerais. O que vai mudar é que as situações selecionadas para prática da língua são daquele contexto. Então, o vocabulário que vai surgir e os recursos linguísticos que serão necessários vão refletir o que a pessoa precisa naquela situação de trabalho”, comenta Nobre. Desta maneira, um estudante de direito que fizer um curso de inglês voltado para a área jurídica será exposto a simulações de um julgamento ou a produção escrita de uma defesa em um processo legal.
Nobre, da Cultura Inglesa, lembra, porém, que qualquer pessoa que já tenha proficiência na língua consegue desenvolver estes conhecimentos sozinha. “Se ela está naquele mercado e tem um nível cognitivo linguístico que seja bastante avançado, ela vai naturalmente assimilar o vocabulário. [No entanto], As pessoas estão sentindo que é mais urgente e buscam diferentes recursos para acelerar”, comenta.
Ser específico é essencial em alguns setores
Em áreas como a aviação, no entanto, ser fluente tanto no inglês do dia a dia como no específico é essencial para ser contratado por uma empresa aérea, segundo a professora Cybele Gallo, fundadora da escola Fly By English School e professora do curso de Aviação Civil da Universidade Anhembi Morumbi.
"Há alguns anos atrás, foram constatando que o número de acidentes envolvendo a falta de proficiência na língua inglesa por parte dos pilotos aumentou, porque quando a aviação era menor, todo mundo conseguia se comunicar com códigos estabelecidos. Com o crescimento da aviação, com países e pessoas de todas as nacionalidades tendo de interagir, os problemas com a língua começaram a crescer", diz ela.
Em 2003, a Organização Internacional de Aviação Civil (INCAO, na singla em inglês) reuniu um grupo de linguistas que montou uma tabela de proficiência inglesa, com níveis de 1 a 6, sendo que pilotos considerados aptos a operar voos devem atingir no mínimo o nível 4 nas provas realizadas pelos órgãos regularizadores de cada país. No caso do Brasil, a prova que atesta a proficiência dos profissionais da aviação é a Santos Dumont English Assessment (SDEA), aplicada pela Agência Nacional de Aviação Civil (ANAC).
“O que era antes um requisito para fazer voo internacional, hoje é requisito para conseguir emprego. As empresas aéreas perceberam que se elas contratam um piloto com nível de inglês 1, 2 ou 3 ele não vai conseguir passar para o nível 4 rapidamente”, observa Cybele, que trabalhou na construção da SDEA e que aplicou provas de inglês para candidatos à vagas nas aéreas TAM e GOL.
A professora conta, inclusive, que em alguns casos os candidatos que tinham plena proficiência no inglês geral e nenhuma no específico se saem pior nas avaliações do que os candidatos com menos conhecimento no idioma do dia a dia e mais no técnico. “Muitas vezes você pegava meninos que tinham feito intercâmbio e vinham fazer uma prova técnica e não sabiam nem o que era trem de pouso. Já peguei também pilotos usando muitas gírias na prova. Aquilo não ia ajudar em nada na comunicação, muito pelo contrário, iria atrapalhar”, comenta.
Nobre lembra, porém, que é preciso tomar cuidado antes de contratar os cursos com propósitos específicos para não correr o risco de fazer um investimento sem retorno. “Eu acho muito perigoso os cursos que vendem soluções milagrosas de pacotinhos de vocabulário para certas áreas. Não adianta você aprender 30 palavras para aquele propósito e não conseguir se comunicar na hora que tem que colocar essas palavras em uma frase inteira”, avalia.
Portanto, o recomendável é que o interessado em fazer algum curso de inglês voltado para sua área, além de manter o estudo no idioma utilizado no dia a dia, pesquise a credibilidade da escola no mercado, contatando ex-alunos e verificando se o método de ensino é eficaz.
iG