Problemas nas adenoides e nas amígdalas podem fazer a criança dormir mal e, por consequência, ter sintomas característicos do déficit de atenção |
Os pesquisadores afirmam que muitas crianças
recebem o diagnóstico de TDAH quando, na verdade, possuem outro problema:
distúrbios do sono, como a apneia do sono. A confusão pode explicar o número
expressivo de casos de crianças com TDAH, e os medicamentos usados no tratamento
podem estar apenas agravando o problema.
"Ninguém está afirmando que a TDAH não existe,
mas existe agora o claro reconhecimento de que precisamos primeiro descartar os
distúrbios do sono", afirmou Merrill Wise, neurologista pediátrico e
especialista em medicina do sono do Centro de Distúrbios do Sono do Serviço
Médico Metodista, em Memphis.
Os sintomas da falta de sono nas crianças são
semelhantes aos do TDAH. Enquanto a pessoa adulta sente sonolência e cansaço com
a falta de sono, a criança geralmente fica inquieta, mal-humorada e
desobediente. Ela pode ter dificuldades para se concentrar, permanecer sentada e
se relacionar com os colegas.
O mais recente estudo sugerindo uma relação
entre sono inadequado e sintomas de TDAH foi publicado no mês passado, no
periódico Pediatrics. Os pesquisadores acompanharam 11 mil crianças
britânicas durante 6 anos, iniciando quando elas tinham seis meses de idade. As
crianças que tiveram o sono afetado por problemas respiratórios, como ronco,
respiração bucal e apneia, estavam entre 40 e 100% mais propensas a desenvolver
problemas de comportamento semelhantes aos do TDAH do que aquelas com respiração
normal.
As crianças que corriam risco maior de
desenvolver comportamentos como os do TDAH tinham distúrbios de respiração
durante o sono que perduraram durante o estudo, mas foram mais graves aos dois
anos e meio de idade.
"A falta de sono é prejudicial ao corpo e à
mente em desenvolvimento da criança, e pode exercer um grande impacto", afirma
Karen Bonuck, principal autora do estudo e professora de medicina social e da
família da Faculdade de Medicina Albert Einstein, em Nova York. "É inacreditável
que não examinemos a presença de distúrbios do sono da mesma forma que fazemos
com a visão e os problemas auditivos."
Adenoides e amígdalas
A pesquisa de Bonuck tem como base estudos
anteriores de menor proporção, os quais demonstram que, após retirar adenoides e
amígdalas, as crianças que tinham problemas de respiração durante a noite
obtiveram resultados melhores em atividades de atenção direta e tiveram menos
problemas comportamentais. Elas estavam menos propensas a receber o diagnóstico
de TDAH nos meses e anos subsequentes do que as crianças que não foram tratadas
das desordens de respiração durante o sono.
Talvez o mais importante seja que, em muitos
casos, o comportamento da criança diagnosticada como portadora de TDAH antes da
operação melhorou tanto que deixou de se ajustar aos padrões característicos da
doença. Os Institutos Nacionais da Saúde iniciaram um estudo denominado
Childhood Adenotonsillectomy Study a fim de entender as consequências da remoção
de adenoides e amígdalas para a saúde e o comportamento de 400 crianças. Os
resultados são aguardados para este ano.
"Estamos nos aproximando cada vez mais da
afirmação de causa e efeito" entre problemas de respiração durante a noite e
sintomas de TDAH em crianças, afirmou Ronald Chervin, neurologista e diretor do
Centro de Distúrbios do Sono da Universidade de Michigan, em Ann Arbor.
Na opinião de Chervin, os problemas
comportamentais associados a problemas respiratórios noturnos são muito
provavelmente consequência de sono inadequado e não da possível falta de
oxigênio. "Observamos os mesmos tipos de sintomas comportamentais em crianças
com outros tipos de distúrbios do sono", afirmou o médico.
De fato, especialistas observam que as crianças
que perdem apenas meia hora por noite de sono necessário – quer devido a um
distúrbio do sono ou por ficarem acordadas até tarde enviando mensagens pelo
celular ou jogando videogames – podem exibir esses comportamentos
característicos da TDAH.
O diagnóstico equivocado não é apenas
estigmatizante, mas o tratamento de TDAH pode agravar o problema real que é a
falta de sono. Os medicamentos utilizados para tratar o TDAH, como Ritalina,
Adderall ou Concerta, podem causar insônia.
"Isso pode se tornar um ciclo vicioso e
acumulativo", afirmou David Gozal, presidente do departamento de pediatria da
escola de medicina Pritzker da Universidade de Chicago, cuja prática clínica é
focada em crianças com distúrbios do sono.
Diagnóstico difícil
É difícil identificar a falta de sono em
crianças. Dos 10 mil membros da Academia Americana de Medicina do Sono, apenas
500 possuem especialização em distúrbios do sono em crianças. Além disso, os
pediatras talvez nem saibam para que especialista encaminhar o paciente, porque
eles geralmente dependem da iniciativa dos pais de falar sobre os problemas para
dormir dos filhos durante a consulta.
Contudo, muitas vezes os próprios pais estão
desinformados em relação a hábitos de sono saudáveis. Um estudo realizado no ano
passado por pesquisadores da Universidade da Pensilvânia, em Harrisburg, e
publicado no periódico The Journal of Sleep Research mostrou que, dos
170 pais participantes, menos de 10 pais não sabiam o que caracteriza um sono
normal", afirmou Kimberly Anne Schreck, psicóloga e analista comportamental da
universidade, e principal autora do estudo. "Muitos achavam gracioso o ronco da
criança e que isso significava que ela estava dormindo profunda e
tranquilamente."
Fonte UOL