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segunda-feira, 20 de novembro de 2017

A calcinha menstrual ‘à brasileira’ criada por três universitárias

As estudantes Raíssa Kist, Nicole Zagonel e Francieli Bittencourt

No passado, a menstruação era para elas motivo de vergonha – e ocultada em pequenos gestos como o de esconder o absorvente na manga da camisa no caminho do banheiro ou não falar do assunto com parentes homens 

Mas hoje, as estudantes Raíssa Kist, de 23 anos, Francieli Bittencourt e Nicole Zagonel, ambas de 25, colocam o tema em primeiro plano – ele motiva um projeto que está definindo as trajetórias profissionais e pessoais das jovens.

Oficialmente uma empresa desde março, a marca Herself, pilotada pelas estudantes, tem por enquanto como carro chefe dois modelos de calcinhas menstruais – peças íntimas reutilizáveis que absorvem a menstruação. A calcinha combina três tecidos com propriedades materiais antimicrobianos e impermeáveis. Na zona íntima, a camada interna é de algodão.

O item começou a ser desenvolvido pelas jovens no final de 2016 e ganhou impulso com uma campanha de financiamento coletivo no site Catarse há quase três meses – que já superou a meta inicial de arrecadação em 50%. A expectativa da campanha era arrecadar R$ 30 mil, mas mais de 340 pessoas já contribuíram e a soma já chega a mais de R$ 46 mil.

O interesse indicou que o projeto, mesmo quando ainda era um embrião, tinha potencial. Kist e Zagonel, estudantes de engenharia química na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), participavam de um curso de capacitação em negócios socioambientais e buscavam soluções que reduzissem o uso de descartáveis no mercado de cosméticos.

Nesse meio tempo, apareceu mais um forte sinal de que havia, ali, um nicho a ser explorado, com a repercussão do um post da nutricionista e apresentadora de TV Bela Gil em que ela contava ter passado a usar uma calcinha menstrual importada dos Estados Unidos.

"Entramos em contato com algumas mulheres para entender incômodos e como elas vivem a menstruação no dia a dia, e percebemos que havia uma busca por novas soluções nessa área. As mulheres não estavam satisfeitas com os absorventes, mas por comodismo e falta de opções, acabavam recorrendo a eles", afirmou Kist em entrevista à BBC Brasil.

Em contato com estas mulheres, as estudantes passaram a aplicar questionários online e desenvolver testes com protótipos de calcinhas.

"Pelo tabu, muitas sentiram um estranhamento em falar do tema, mas depois ficaram agradecidas. Ouvimos sobre necessidades que nem imaginávamos, como cuidados com alergias, calor, assaduras... Aprendemos muito com isso", lembra a universitária.

Segundo as estudantes, a decisão por produzir calcinhas menstruais foi motivada também pela dificuldade, relatada por algumas mulheres, na adaptação ao uso de outra nova alternativa aos tradicionais absorventes: os copinhos menstruais, produtos reutilizáveis geralmente de silicone, em formato de copo e de uso interno.

As calcinhas menstruais só chegaram ao Brasil neste ano - a marca Pantys também passou a vender o produto no país, além da Herself, que por enquanto está entregando somente calcinhas oferecidas como recompensa na campanha de financiamento coletivo. Lá fora, a Thinx, marca usada por Bela Gil e precursora do produto, também foi criada por três amigas, de Nova York.

À brasileira
Experiências internacionais fizeram parte dos estudos para o desenvolvimento do projeto pelas jovens, mas desde o início elas pensaram em um produto 100% brasileiro - seja na mão de obra à adaptação ao clima.

"Compramos os produtos do exterior para conhecê-los, mas, lá fora, o corte das calcinhas é mais largo e tem a cintura mais baixa, e o corpo [das estrangeiras] também é diferente. Pelo clima tropical do Brasil, a calcinha tinha que ser mais fininha e leve", lembra Kist.

"Toda a tecnologia foi desenvolvida no Brasil. Para garantir a procedência e a sustentabilidade do produto, fazemos questão também de ter fornecedores próximos, sabendo como é a qualidade de vida deles", afirma a estudante, citando fornecedores do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina.

Por enquanto, as três estudantes estão se virando na logística, administração e comunicação da marca - mas, entre terminar a faculdade e tocar o negócio, já estão pensando em aumentar a equipe. É que em dezembro a Herself deve dar um salto, lançando um site - para a venda das calcinhas e possivelmente outros produtos afins -, ainda mantido em segredo por elas. As jovens destacam que, diferente do tradicional tabu vivido por tantas garotas, algumas delas ficaram ansiosas para ficarem menstruadas - apenas para experimentar a calcinha. "Houve um vácuo na evolução dos protetores menstruais, com uma carência de anos na inovação da vida menstrual. Pelo tabu, as mulheres não falavam, e o mercado desconhecia as reais necessidades delas. O diálogo que estabelecemos com as mulheres no processo nos mostrou o que era realmente importante para elas", conta Bittencourt, estudante de história também na UFRGS, onde tem se dedicado a estudos sobre questões de gênero.

'Natural' do século 21'
Para Justine Carta Hess, da consultoria Kantar Futures, um produto como a calcinha menstrual é emblemática de tendências turbinadas no século 21 - destacando-se o feminismo e a sustentabilidade.

"O excesso de interações e compartilhamentos nas mídias sociais, entre outras coisas, permitem também que a cultura do tabu, da vergonha, seja conversada.

Por outro lado, um projeto de crowdfunding abre mercados para estas novas conversas, quando no passado é claro que eram os homens que majoritariamente tinham a palavra sobre os produtos e negócios", disse Hess à BBC Brasil.

"Esta nova geração, que chamamos de centennials, tem muito acesso a informação e consideram bastante o custo-efetividade dos produtos. E, diante dos custos financeiros e ambientais dos absorventes tradicionais, produtos como as calcinhas menstruais fazem muito sentido".

Por outro lado, a consultora Christine Pereira, da Kantar Worldpanel, destaca que no Brasil a grande maioria das mulheres ainda recorre a métodos tradicionais para lidar com a menstruação. Segundo dados da consultoria, a penetração nos lares brasileiros é maior para os absorventes externos (em 76% dos lares da amostra em 2016), seguidos do absorvente interno (24%) e do protetor de calcinha (6%). Esta última categoria, porém, tem crescido no longo prazo.

"As jovens entram no mercado pelo absorvente externo e, com o avanço da idade, há uma mixagem, principalmente nas classes econômicas mais altas, com o uso de absorventes internos e protetores de calcinha. Dentre os produtos existentes há inovação, com diferentes tamanhos, larguras, presença de abas ou não e adequação a diferentes estágios da menstruação", afirma Pereira. 

Foto: Divulgação

BBC Brasil/R7

Produção de insulina no Brasil sofre ameaça

https://www.niddk.nih.gov/-/media/Images/Health-Information/Diabetes/Photo-of-a-needle-with-a-bottle-of-insulin.jpg?la=en&hash=2CED11A629047AED95293F1883067D695B13E546Acordo técnico com empresa para desenvolver insulina no Brasil foi firmado em 2006, mas até hoje nenhum frasco da substância foi produzido 

Uma empresa ucraniana, que já recebeu R$ 196 milhões de dinheiro público pela importação de insulina distribuída pelo SUS a portadores de diabetes e para compartilhar a tecnologia de fabricação da substância no Brasil, foi reprovada em inspeção da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Após visitar as instalações da Indar em Kiev, a agência rejeitou o pedido de renovação do chamado certificado de boas práticas de fabricação de medicamentos. Por conta da decisão da Anvisa, a compra do produto da Indar acabou suspensa pelo governo. A suspensão ocorre em meio a concretização de um acordo entre o laboratório europeu e o governo da Bahia. A gestão do petista Rui Costa planeja instalar uma unidade de produção de insulina no estado, com orçamento estimado entre R$ 250 milhões e R$ 300 milhões.

As primeiras tratativas entre o laboratório e o governo brasileiro para atuar no país ocorreram em 2003, primeiro ano das gestões do PT. Em julho de 2006, Indar e Fiocruz assinaram um acordo técnico-científico para transferência de tecnologia destinada à produção de insulina humana recombinante. Porém, este acordo ainda não resultou na produção de um único frasco de insulina no Brasil. Agora, uma nova parceria foi assinada, entre a indústria farmacêutica ucraniana e a Bahiafarma, o laboratório público do governo da Bahia. O governador e seu secretário de Desenvolvimento Econômico, o ex-ministro Jaques Wagner, foram a Kiev no fim de agosto assinar acordo para instalação de fábrica de insulina na região metropolitana de Salvador.

Disputa de mercado 
A compra da substância envolve uma disputa milionária de interesse do mercado farmacêutico. Os grandes laboratórios pressionam contra o avanço de parcerias que permitam a produção própria de insulina no Brasil. A produção é dominada mundialmente por três grandes indústrias farmacêuticas: a dinamarquesa Novo Nordisk, a norte-americana Eli Lilly e a francesa Sanofi. Somente a Novo Nordisk recebeu do Ministério da Saúde R$ 183,5 milhões, em 2016, e R$ 59,6 milhões, neste ano, para fornecer a insulina disponibilizada no SUS. A Eli Lilly recebeu R$ 4,4 milhões do ministério no ano passado, boa parte pelo fornecimento de insulina.

O pedido de inspeção na Indar na Ucrânia partiu da Fiocruz e da própria Bahiafarma. Os técnicos da Anvisa estiveram na indústria uma semana antes da chegada da comitiva do governador. O indeferimento da renovação da certificação ao laboratório ucraniano — a primeira desde 2010, quando a Indar obteve o primeiro certificado — foi publicado no Diário Oficial da União no dia 16 do mês passado. A Anvisa detectou o que os fiscais chamam de “não conformidade” considerada crítica e outras oito consideradas “maiores” — o indeferimento ocorre quando existem pelo menos seis infrações tidas como “maiores”.

Uma das “não conformidades maiores” apontadas pela Anvisa foi a inexistência de conferência em 100% da rotulagem dos frascos, no que diz respeito a lote e validade. Os técnicos da Anvisa também detectaram uma ausência de determinação de vida útil de resinas que fazem a retirada de impurezas da insulina. Sobre higiene, faltaram procedimentos para troca de vestuário e detergentes com atividade germicida comprovada, conforme a Anvisa.

Essa certificação não é obrigatória para a fabricação de medicamentos. Mas técnicos da Anvisa e do mercado farmacêutico entendem ser temerário uma produção de insulina ou qualquer outro medicamento sem o certificado. Este é o entendimento dentro da Bahiafarma, que decidiu suspender qualquer iniciativa de importação até que o problema seja resolvido.

Os R$ 196 milhões gastos com a Indar até agora dizem respeito à importação de insulina e à transferência de tecnologia para fabricar o produto, segundo a Fiocruz. Registros fornecidos pelo Ministério da Saúde, no entanto, apontam que os contratos estipulam gastos de R$ 330,9 milhões com 28,6 milhões de frascos do produto importados entre 2007 e 2016. Cada frasco custou R$ 11,57. A Indar alegou existirem “condições de confidencialidade” no acordo e não forneceu os valores.

7% de toda a insulina do SUS
Pelo contrato, o governo comprava todo ano 2,65 milhões de frascos de insulina da Indar. Isso representa 7% da insulina ofertada via SUS aos pacientes de diabetes. O Brasil tem 14 milhões de diabéticos — 2 milhões fazem uso do medicamento fornecido pelo SUS. Estimativas apontam que 8% da população tem diabetes e, dentre os diabéticos, 14% são insulino-dependentes. A Fiocruz afirmou terem ocorrido “diversos infortúnios com a empresa transferidora (mudança de direção, privatização e reestatização), o que tornou difícil um processo contínuo e dentro do prazo acordado”. Depois do acordo técnico-científico, uma parceria para o desenvolvimento produtivo chegou a ser assinada em 2013. O acordo técnico segue vigente.

A Fiocruz diz que “é possível atestar a qualidade e a segurança do produto distribuído no SUS”. Desenvolvimento preservado, dizem empresa e Fiocruz – O diretor-presidente da Bahiafarma, Ronaldo Dias, disse ao GLOBO que já solicitou à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) uma nova vistoria na Indar — o laboratório ucraniano parceiro na produção de insulina — e que pedirá urgência ao órgão de fiscalização. A expectativa de Dias é que os técnicos viajem outra vez a Kiev no próximo mês. — Estamos vendo os pontos do relatório da Anvisa e já recebemos as respostas da Indar para cada um deles. Nunca houve risco sanitário do produto — afirmou o diretor da farmacêutica do governo da Bahia.

A expectativa mais otimista dentro da Bahiafarma é que a renovação da certificação de boas práticas de fabricação de medicamentos saia em janeiro do próximo ano. A mais pessimista, que a inspeção ocorra em fevereiro e que um eventual novo certificado seja expedido no mês seguinte. O laboratório público sustenta que as irregularidades foram sanadas e que não haverá um novo indeferimento na certificação. O projeto da fábrica de insulina na Bahia prossegue durante essa fase de análise pela Anvisa, segundo o diretor da empresa.

— Não há um comprometimento do processo sanitário. O certificado atual é válido até fevereiro de 2018. Além disso, a renovação do registro do produto foi publicada em março deste ano, com validade de cinco anos — disse Dias. A parceria para o desenvolvimento produtivo destinou à Bahiafarma e Indar um mercado de 13,5 milhões de frascos de insulina por ano.

— Ninguém pode ser produtor único de nada. Foi esse o entendimento prevalecente no Ministério da Saúde. Este é o primeiro grande projeto biotecnológico no Nordeste brasileiro — disse o diretor da Bahiafarma. Em resposta por e-mail, a representante da Indar, Maryna Potibenko, disse considerar “a indicação de não conformidade pelo órgão regulador brasileiro um processo natural”. “A Anvisa é um dos mais exigentes órgãos regulatórios do mundo. Sendo assim, é impossível a presença do produto de má qualidade no mercado do Brasil. A qualidade e a segurança da insulina de Farmanguinhos (produzida por Indar) comprovam os dados de farmacovigilância, obtidos no Brasil”, afirmou.

“Manobra protelatória” 
Potibenko citou a Novo Nordisk, que “não vendia insulina no mercado brasileiro durante 36 meses por motivo de adequação de não conformidade indicada pela Anvisa”. Segundo ela, a farmacêutica dinamarquesa tentou uma proposta de transferência de tecnologia com o governo brasileiro, mas a estratégia não passou de “manobra protelatória, apenas para que não fosse efetivado o acordo com a Indar, mantendo assim indefinidamente a atividade oligopolista da Novo Nordisk”.

Segundo a representante da Indar, a tecnologia foi transferida à Fiocruz. Além disso, a parceria permitiu expressiva redução de preços, conforme a executiva. “O acordo Fiocruz/Farmanguinhos e Indar está vigente. O envolvimento da Bahiafarma é a etapa final da realização do acordo, relacionada com a construção da fábrica”, disse.

A Fiocruz, por meio da assessoria de imprensa, afirma que a transferência de tecnologia segue em andamento. “Farmanguinhos já reproduziu o processo em escala laboratorial até a etapa final de produção de cristais. Atualmente, Farmanguinhos é detentor de bancos de células do agente produtor da insulina e do conhecimento do processo completo”. O estágio atual, segundo a empresa, é de “aumento da escala dos processos para melhorar as condições de portabilidade da produção industrial de cristais de insulina”. Farmanguinhos vai capacitar a equipe da Bahiafarma, segundo a assessoria.

Segundo a Fiocruz, a insulina da Indar é segura. “Durante todo o período de acordo, que já apresenta dez anos de distribuição, não houve registro de quaisquer reações adversas que comprometam a segurança ou eficácia do medicamento”. O Ministério da Saúde diz que a transferência de tecnologia “tem sido realizada”. O governador da Bahia, Rui Costa, informou que a área técnica responderia sobre o caso.

Extra Globo