Agência O Globo |
Preconceito, medo e desinformação são os principais motivos para a baixa procura pela vacina contra o HPV, o Papilomavírus Humano. Segundo a Secretaria de Estado de Saúde do Rio Janeiro, até a última terça-feira, o Estado imunizou somente 43,5% do público alvo, meninas de 9 a 11 anos.
Alguns municípios fluminenses nem alcançaram 20%, como Cardoso Moreira (7,78%), Resende (11,07%), Santo Antônio de Pádua (12,42%), Japeri (18,27%), São Francisco de Itabapoana (16,9%) e São João da Barra (19,92%). A média nacional registrou 49,63%. O Ministério da Saúde tem como meta vacinar 80% das meninas dentro desta faixa etária.
— O HPV é uma doença sexualmente transmissível e as pessoas não se sentem vulneráveis nesta idade, acreditam que esta é uma realidade muito distante. Por isso, não procuram os postos de saúde para se vacinar. Mas é fundamental que tomem as três doses: a segunda seis meses após a primeira, e a terceira dose cinco anos depois – destaca o subsecretário de Vigilância em Saúde, Alexandre Chieppe. — Além da dificuldade para lidar com o tema com meninas bem jovens, muitas famílias tem medo de possíveis efeitos adversos por conta da campanha negativa que ganhou as redes sociais. Incluindo casos que não foram comprovados como reação à vacina.
Chieppe admite que dificilmente chegará à meta do Ministério da Saúde. Mas ressalta que a vacina entrou para o calendário nacional e que por isso está disponível nos postos de saúde o ano inteiro.
Embora não haja grandes estudos demonstrando a falta de segurança da vacina, existem relatos pelo mundo de doenças graves atribuídas a ela como a síndrome de Guillain-Barré, falência ovariana, uveítes, além de convulsões e desmaios. Isso levou o governo do Japão, por exemplo, a não mais recomendar a vacina.
O problema é que o HPV possui mais de 100 subtipos, e a vacina ainda não consegue cobrir todos eles, embora cubram os principais. Assim, não dá 100% de certeza de que as mulheres não terão câncer de colo uterino.
A vacina, no entanto, é recomendada pela Organização Mundial de Saúde (OMS) que atesta a sua segurança. Previne o câncer do colo do útero, o terceiro tipo mais frequente na população feminina e terceira causa de morte de mulheres por câncer no Brasil.
É utilizada como estratégia de saúde pública em outros 51 países, que já realizaram a imunização de mais de 175 milhões de doses desde 2006, sem registros de eventos que pudessem pôr em dúvida a segurança da vacina.
— A probabilidade de uma menina ter alguma reação de importância é a mesma de cair um meteoro na cabeça. É quase nula. Infelizmente a propaganda negativa tomou proporções inimagináveis e por isso temos esta baixa procura — analisa Neila Góis Speck, professora do Departamento de Ginecologia da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coordenadora do Núcleo de Prevenção em Doenças Ginecológicas da Unifesp.
Lembra que as 11 meninas que apresentaram dores de cabeça e paralisia nas pernas, em Bertioga, litoral de São Paulo, em setembro, estão bem (três delas chegaram a ser internadas) e que, provavelmente, tiveram crises de ansiedade e angústia.
Neila diz que está acostumada a tratar mulheres com HPV e que os procedimentos podem ser dolorosos, como o uso de laser e de ácido, por exemplo. E que a vacina também pode evitar este sofrimento.
— Reações podem acontecer e estão relacionadas à quantidade do adjuvante (agente que intensifica o sistema imunológico, aumentando a produção de anticorpos ou estimulando os linfócitos). Por isso, podem ser mais frequentes com a vacina para hepatite B, por exemplo, do que para HPV — comenta Nelia, que lamenta a falta de informação generalizada sobre o tema. — Muitas das reações tem ligação com a ansiedade, o medo natural quando se toma uma vacina. E, no caso de adolescentes, a insegurança aflora, eles são mais voláteis. Quando uma vê a outra passando mal fica condicionada. O caso de Bertioga foi um “piripaque coletivo”, pois a vacinação, em sua primeira etapa (para meninas de 11 a 13 anos) foi dada nas escolas, em várias meninas ao mesmo tempo.
Média mundial é baixa
Isabella Ballalai, presidente da Sociedade Brasileira de Imunizações (SBIm), afirma que a média de adesão desta vacina no mundo é de 44%. Diz que a Austrália, que disponibiliza esta vacina desde 2007, é de cerca de 80%.
— Além do medo e do preconceito com o tema, tem a questão de que é natural a baixa adesão no caso dos adolescentes. Eles não vão ao posto de saúde e os pais não costumam levar como fazem com os bebês, que são indefesos, não podem ir sozinhos e quando nascem, a família vive em função deles.
É cultural — avalia Isabella, que afirma que até um ano de idade, as vacinas tem 95% de aceitação. — Após os cinco anos, a tendência é bem menor.
Ela comenta ainda que as notificações de reações adversas foram apenas alergias. E que não há casos graves relatados. Comenta ainda que o mal estar, as crises de ansiedade, desmaios e etc., não “foram invenções” mas que podem ocorrer com qualquer vacina.
— Imagine que na Colômbia, onde 180 meninas tiveram crises assim. E numa mesma escola! Uma influencia a outra e não ocorreu nada de grave. Quando se vacina em massa, sobretudo em adolescente, é assim mesmo — pondera Isabella, que esclarece que esses casos, como o de Bertioga, no Brasil, não tem relação com diferença de lotes. — Por aqui, não deve ter mais do que dois lotes. Não existe diferença.
O Globo
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