Audiência pública chamada pela Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para discutir a propaganda de cigarros em maços e pontos de venda colocou a indústria tabagista e produtores de fumo de um lado e médicos e associações contra o cigarro de outro.
Mais de 50 pessoas se manifestaram sobre o tema nesta terça-feira, nas quatro horas de duração da audiência. Ônibus trouxeram produtores de fumo do Sul do país para o evento.
A proposta em discussão é a consulta pública 117 de 2010, da Anvisa, que pretende, por exemplo, acabar com a exposição dos maços de cigarro nos pontos de venda --permitida apenas nas tabacarias--, aumentar a área das advertência à saúde nos pontos de venda e proibir abordagens promocionais e pesquisa de mercado no setor.
Por uma decisão judicial que adiou a realização da audiência, a Anvisa teve que garantir espaço físico para mil pessoas. Escolheu fazer o evento no ginásio Nilson Nelson, garantindo a presença de até 14 mil pessoas. Compareceram cerca de 500.
Os médicos que se manifestaram foram todos favoráveis à medida proposta pela agência. "A saúde pública não pode ficar refém dos interesses da indústria", disse Alberto Araújo, representando a Sociedade Brasileira de Pneumologia. Ele classificou de "tabacocídio" as mortes provocadas pelo fumo.
Roberto Gil, ex-presidente da Sociedade Brasileira de Oncologia Clínica e dono de um consultório, disse que se via nas duas posições: médico, tendendo a lutar contra o tabaco, e empresário, tendendo a defender a liberdade do setor.
"Essa é a discussão. Alguém aqui acharia ético eu dizer para meu paciente 'você tem que fumar bastante, porque tenho meus filhos para criar e funcionários para pagar?'. Se eu não tiver que atender mais câncer, me darei por satisfeito", disse.
A favor da medida ainda falaram representantes da OMS (Organização Mundial da Saúde) e da OPAS (seu braço para as Américas), do CFM (Conselho Federal de Medicina), do Inca (Instituto Nacional de Câncer), da Aliança de Controle do Tabagismo e do Congresso Nacional, entre outros.
"A indústria é cara de pau, quer jogar o produtor contra o médico e a ciência. A propaganda deve ser zero", disse o deputado federal Darcísio Perondi (PMDB-RS), presidente da frente parlamentar da Saúde.
Perondi foi tanto vaiado quanto aplaudido. Foram 27 manifestações do público contra a proposta da Anvisa e 18 favoráveis.
O lado contrário à proposta argumentou que ela vai prejudicar produtores e setores do comércio, evocou a liberdade de decisão das pessoas e questionou a competência da Anvisa para fazer esse tipo de regulamentação e a existência de comprovação científica sobre os malefícios do tabaco.
"Querem aprovar o banimento do mercado legal, incentivando não a redução de consumo, mas o aumento do consumo ilegal", criticou José Constante, prefeito de Agrolândia (SC).
Uma das representantes da Souza Cruz, Maria Alicia Lima afirmou que, se a intenção da proposta é proteger jovens do cigarro, bastaria por em prática a legislação atual, que já proíbe a venda do cigarro a menores de 18 anos e restringe a propaganda aos locais de venda.
Um dos mais aplaudidos foi Eusébio Borin, pequeno agricultor. "A maconha tem propaganda? E cada dia aumenta mais o seu consumo!", disse, bastante agitado. "O que a Anvisa vai fazer com as 200 mil famílias envolvidas na produção do fumo? Quem sabe querem que vivam de Bolsa Família para ser cabrestado pelo voto!"
DECISÃO
Um dos diretores da Anvisa e supervisor do assunto, Agenor Álvares afirmou que a agência vai recolher todas as contribuições e tomar uma decisão em colegiado. Segundo ele, isso pode ocorrer já no início do ano e ser concretizada em uma resolução.
Um dos pontos que sensibilizou a diretoria da Anvisa na manhã desta terça foi a proibição das pesquisas de mercado no setor. Duas pessoas argumentaram que a pesquisa está muito separada da propaganda e não deve ser entendida como uma forma de publicidade.
Após interrupção para o almoço, a Anvisa inicia uma segunda audiência pública, dessa vez, discutindo os aditivos de sabor ao cigarro.
Fonte Folhaonline
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