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sábado, 9 de novembro de 2013

Médicos recebem treinamento para dar notícias ruins para pacientes e familiares

Informar uma morte ou diagnóstico grave não é fácil para
 os médicos
Centro de Simulações Realísticas do Hospital Albert Einstein, em São Paulo, ensina profissionais a evitar a frieza extrema ou o envolvimento com a dor do doente
 
O futuro doutor entra no consultório. Luís Antonio Bozutti é estudante do sexto ano de medicina e está ali para comunicar a uma garota que seu pai sofreu um acidente vascular cerebral (AVC) isquêmico devido a um medicamento usado para salvar sua vida quando sofreu um infarto. O pai está com um lado do corpo totalmente paralisado.
 
Com voz mansa, característica pessoal de Luís, ele pede para que a filha se sente. E começa a contar sobre a saúde do pai dela, desde que deu entrada no hospital até o momento que sofreu o AVC. A garota se desespera, contesta, não acredita. Pergunta de novo, questiona a medicação, chora.
 
Luís mantém a voz calma e compreensiva, explica várias vezes a mesma coisa, sem alterar o tom de voz. Pergunta a relação dela com o pai. A garota conta que se sente culpada por estar viajando a trabalho quando o pai passou mal. É possível ver que o futuro médico está tocado pela situação. Luís se aproxima da garota e a toca, em uma forma de consolo não-verbal que representaria “estou aqui do seu lado e vejo a angústia que você está passando”.
 
Um som que anuncia “simulação encerrada” ecoa em um alto falante na sala. Passaram-se dez minutos que os dois estão conversando. A moça, que segundos atrás se debulhava em lágrimas, sorri para Luís e diz “acabou!”. Eles se levantam e saem da sala.
 
Tudo o aconteceu foi um treinamento para que Luís pudesse aprender a comunicar uma má-notícia e lidar com a emoção que ela traz tanto para o paciente como para o próprio médico.
 
A garota é uma atriz contratada pelo Hospital Israelita Albert Einstein para atuar no Centro de Simulação Realística. Luís precisa aprender como comunicar a morte ou um estado de saúde muito grave. O que se espera é que os médicos não sejam frios - e acabem com isso machucando ainda mais a família - nem muito sensíveis, que choram com o doente e seu familiares.
 
Terminada a simulação, Luís volta para uma sala onde, em tempo real, toda a encenação foi transmitida por vídeo para vários estudantes de medicina também do último ano, que estavam com a psicóloga que conduz a discussão.
 
Trazer “maus ventos” não é fácil
Ser portador de más novas não é uma tarefa fácil para os médicos. Embora muitas pessoas sejam céticas em relação à existência de alguma emoção embaixo de um jaleco branco, o cardiologista Luís Jose Tachotti Pires garante que há. O fato é que, por não saber lidar com esses sentimentos, alguns médicos optam pela aparente frieza como modo de autoproteção.
 
“Nunca dei uma má notícia isolado com o sentimento da família. Acabamos sempre estando juntos”, explica ele, que também já participou de um cenário no Centro de Simulações Realísticas do Hospital Israelita Albert Einstein.
 
O cardiologista relembra da época em que fez residência médica e uma paciente já idosa morreu no pronto-socorro no dia em estava como plantonista. Ao comunicar ao marido, Pires conta que ele estava tranquilo, como se já estivesse aguardando a notícia. Mas o viúvo começou a contar a história de vida do casal para o médico.
 
“Ele disse que eles estavam casados havia 60 anos, que tinham vários filhos, e começou a descrever muitos dos momentos bons”, conta. “Quando ele terminou, pedi que acompanhasse a enfermeira para resolver as questões burocráticas e fui para o quarto. Eu desabei. Chorei muito”, relembra. Momentos depois, por força da profissão, Pires teve de se recompor e voltar ao trabalho para cuidar dos outros pacientes.
 
Hoje, com a maturidade profissional, Pires lida com as situações de uma forma equilibrada. “Não tem uma fórmula de como se deve comunicar algo ruim. Aprendemos na prática”, explica. “Eu costumo perguntar quem é quem na família, porque dependendo do grau de parentesco, a recepção da informação é diferente. Costumo recapitular o que aconteceu com o paciente desde o momento em que ele deu entrada no hospital. Como o tratamento evoluiu, até chegar e comunicar a notícia ruim”.
 
Uma das formas de dormir tranquilo depois de um dia em que não conseguiu salvar uma vida, é ter a certeza de que fez tudo o que estava ao seu alcance. "A sensação não é de frustração, mas sim de dever cumprido", conta. "Faço tudo o que for possível para que o paciente se recupere e passe mais tempo ao lado de quem ama. Minha luta é a favor da vida, não contra a morte. A morte faz parte da vida".
 
iG

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