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sexta-feira, 31 de julho de 2015

Sem receber, laboratório deixa de fornecer remédios anticâncer ao GDF

Trecho de ofício enviado pela Secretaria de Saúde do Distrito Federal ao Ministério Público (Foto: Secretaria de Saúde/Divulgação)
Foto: Secretaria de Saúde/Divulgação
Trecho de ofício enviado pela Secretaria de Saúde do Distrito
Federal ao Ministério Público
Secretaria de Saúde enviou ofício ao Ministério Público pedindo intervenção. Pendência é de gestão anterior e chega a R$ 17 milhões, diz Fábio Gondim
 
Responsável por fornecer à rede pública do Distrito Federal remédios usados no tratamento contra câncer, o laboratório Roche encaminhou uma carta à Secretaria de Saúde dizendo não ter interesse em manter contratos com a pasta por causa de dívidas deixadas pela gestão anterior. O titular da pasta, Fábio Gondim, afirmou que acionou o Ministério Público. O G1 procurou o órgão, que disse ainda não ter recebido o documento.
 
“Embora isso não seja explicitamente dito, nós acreditamos que alguns dos laboratórios têm se recusado a entregar os medicamentos em função de despesas do exercício anterior, que ainda precisariam, inclusive, ser apuradas se são realmente devidas, enfim o que está acontecendo. E, infelizmente esses, laboratórios estão usando vidas humanas pra cobrar a administração pública, sem demonstrar nenhum tipo de sensibilidade”, declarou.
 
O gestor afirma que as dívidas com fornecedores de remédios superam R$ 17 milhões. Em nota, a Roche informou que tem cumprido integralmente os contratos com a Secretaria de Saúde do Distrito Federal.

"Em relação ao ofício recebido, informamos que este era inespecífico no ponto relacionado ao prazo de entrega. Portanto, não haveria como a Roche confirmar o fornecimento. A Roche segue empenhada em atender as demandas da área da saúde pública e em acordo com legislação vigente", diz treco da nota.
 
Já são dez entre 65 o número de medicamentos usados pela rede pública no tratamento contra câncer que têm estoques zerados. Quatro deles estão em falta desde o segundo semestre do ano passado. A Secretaria de Saúde afirmou que deu início a um mutirão para adquirir remédios e que a medida deve sanar o problema. Não há prazo para o reabastecimento.
 
De acordo com a pasta, as medicações Rituximabe (50 ml), Citarabina e Bleomicina estão em falta desde outubro do ano passado. O estoque de Rituximabe (10 ml) acabou em novembro de 2014. As doses de Carboplatina terminaram em março, e as de Tamoxifeno, em maio. Já Topotecana, Gencitabina e Melfalano estão indisponíveis desde junho.
 
Os dez se somam a outras dezenas de remédios indisponíveis na rede. Na lista constam ainda antibióticos contra toxoplasmose, sífilis, tétano, tuberculose e infecções no coração, além de um tipo de Ritalina – usado contra déficit de atenção e hiperatividade. A secretaria afirma que o vazio nas prateleiras está relacionado a dívidas com fornecedores herdadas da gestão anterior e alegações dos laboratórios de escassez de matéria-prima e diz não faltar dinheiro para a compra de medicamentos.
 
O oncologista Sandro José Martins afirma que, via de regra, não há tratamento que seja insubstituível. Mas, segundo ele, troca das medicações, no entanto, interfere de modo imprevisível sobre o resultado final para o paciente, porque já não se sabe mais qual a chance de dar certo.
 
"A quimioterapia do câncer é uma modalidade de tratamento que requer o uso diligente de medicamentos: na hora certa, na dose certa, para o paciente certo. Falha em observar qualquer uma destas condições interfere de modo desconhecido com a segurança e eficácia do tratamento", explica.
 
A preocupação passou a fazer parte da rotina do técnico em informática Israel Cardoso dos Santos, que conta que a mãe luta contra um câncer nos ovários desde 2013. Sem o medicamento Gencitabina na rede, a idosa de 69 anos está há três semanas sem fazer quimioterapia.
 
“Não avisam antes. Na hora que chega para consultar é que avisam que está faltando o remédio, mandam de volta para casa”, afirma. “Eu me sinto péssimo, quantos anos minha mãe contribuiu para o INSS e hoje aposentada não tem direito [a tratamento?] A gente fica constrangido.”
 
Relatório médico aponta falta do medicamento Gencitabina, usado em quimioterapia no tratamento contra câncer (Foto: Israel Cardoso dos Santos/Arquivo Pessoal)
Israel Cardoso dos Santos/Arquivo Pessoal
Relatório médico aponta falta do medicamento Gencitabina,
usado em quimioterapia no tratamento contra câncer Foto:
Santos diz ainda que a mãe desenvolveu depressão por causa da doença e ficou pior depois que o medicamento ficou indisponível na rede. “Ela está preocupada com isso. E eu fico com medo de perdâ-la, corro para cá, corro para lá, fico angustiado.”
 
O oncologista afirma que situações do tipo causam "muito sofrimento" ao doente e aos familiares, atrapalhando a terapia. "Qualquer condição estranha ao tratamento que possa interferir na sua continuidade como previsto – exemplo: falta de medicamentos, autorizações de convênio atrasadas, dificuldades pessoais e econômicas – causam enorme frustração, sensação de impotência e medo – emoções que prejudicam sobremaneira o paciente."
 
Dados da pasta mostram que, entre 1º de janeiro e 15 de julho, o DF recebeu 336 notificações judiciais para fornecimento de remédios. Os principais medicamentos oncológicos solicitados por meio de demandas judiciais são o Bortezomibe, a Abiraterona e o Fingolimode.
 
Tratamento
A secretaria não respondeu o número de pessoas atualmente em tratamento contra câncer na rede pública. Os tipos mais comuns em homens são próstata, cólon e reto e traqueia, brônquio e pulmão, enquanto mulheres são atingidas em maior frequência na mama, cólon e reto e no colo do útero.
 
O tratamento é oferecido em oito hospitais: da Criança, Base, regionais de Taguatinga , Asa Norte, Sobradinho, Gama e Ceilândia, além do Materno Infantil. As consultas são marcadas pela central de regulação. A rede oferece quimioterapia e radioterapia.
 
G1

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