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sexta-feira, 1 de janeiro de 2016

Como a indústria farmacêutica responde às doenças tropicais negligenciadas?

Nos primeiros anos deste século, apenas quatro em cada cem novos medicamentos produzidos foram dedicados a doenças que atingem principalmente populações em países tropicais de baixa renda

Medicamentos para males tropicais não são dos mais visados pela indústria farmacêutica
Medicamentos para doenças tropicais não são os mais visados pelas industrias farmacêuticas

Em números concretos, só 37 (cerca de 4%) dos 850 novos remédios registrados entre 2000 e 2011 eram indicados para malária, diarreia, tuberculose e o rol das chamadas "doenças tropicais negligenciadas" listadas pela OMS (Organização Mundial de Saúde).

Os dados, compilados num estudo colaborativo que incluiu pesquisadores de agências privadas e da própria OMS, são de 2013 e foram publicados pela revista científica The Lancet. Segundo a OMS, a cada ano 1,5 bilhão de pessoas em 149 países sofrem com esse tipo de doenças, que não recebem a devida atenção.

A lista inclui alguns males bastante conhecidos (e até em alta) no Brasil, como dengue, chikungunya e chagas. Por um lado, há a crítica de que, embora afetem muita gente, essas doenças não são prioridade para as pesquisas farmacêuticas, que historicamente preferem se dedicar ao desenvolvimento de remédios que garantam retorno financeiro.

De outro, o mesmo estudo mostra que houve um avanço: entre 1975 a 1999, somente 1,1% dos novos tratamentos eram dedicados aos males tropicais que afligem populações de média e baixa renda.

Além disso, gigantes da indústria farmacêutica consultadas garantem estar investindo no desenvolvimento de soluções para essas doenças.

O fator emergente
Algumas das maiores empresas mundiais do setor dizem estar de olho no mercado de países emergentes, cujas economias se expandiram na última década.

A gigante GlaxoSmithKlein, por exemplo, pesquisa com a brasileira Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) uma versão de vacina para a dengue. Em outra frente, sua vacina contra malária, a Mosquirix, foi recomendada pelo órgão de saúde da União Europeia e aguarda políticas da OMS para o uso em populações carentes.

Segundo seu porta-voz, Aoife Pauley, a empresa também acompanha as epidemias causadas pelos vírus chikungunya e zika e investiga possibilidades de vacinas.

A francesa Sanofi Pasteur lançou neste mês em outro emergente, o México, a primeira vacina contra a dengue, que aguarda liberação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) para uso no Brasil.

"É a primeira vez que temos uma vacina que é primeiramente registrada e autorizada em um país em desenvolvimento, o México", diz o diretor do programa para dengue da empresa, Cesar Mascareñas. "Não é novidade apenas por irmos a populações maiores, mas também por desenvolvermos infraestrutura e pesquisa clínica (em países em desenvolvimento)", acrescentou.

Outras companhias, como a suíça Novartis, dizem ter centros dedicados a pesquisa de males tropicais.

A médica brasileira Fabiana Alves, pesquisadora da DNDi – ONG que atua no desenvolvimento de medicamentos para doenças negligenciadas –, reconhece avanços vindos da indústria.

"Não posso negar que atualmente, dentro da nossa área de trabalho, há vários projetos com colaboração de diferentes indústrias farmacêuticas. Principalmente no acesso às bibliotecas de compostos que podem ser usados. Isso já é um grande passo", afirma.

Mas faz uma ressalva: "A indústria farmacêutica funciona na base do lucro, e não do que é o bem para a humanidade", diz.

A questão do acesso (e da qualidade)
Além de criticar a falta de investimento suficiente em soluções para as doenças que atingem populações carentes, especialistas e ativistas chamam atenção para outro obstáculo: a falta de acesso a tratamentos eficazes e de qualidade.

Um dos exemplos é a malária, que, embora não conste da lista da OMS de males negligenciados, é endêmica nos países da África Subsaariana, gigantesca parte do continente localizada ao sul do deserto do Saara e que concentra alguns dos países mais pobres do mundo.

Embora tenha havido, desde a virada do milênio, uma queda de 37% nos casos e de 60% nos óbitos, a OMS estima o surgimento de 214 milhões de novos casos da doença neste ano, dos quais 438 mil resultaram em mortes – cerca de 90% delas na África.

Gabriel Alcoba, conselheiro para doenças tropicais da ONG Médicos Sem Fronteiras, diz ser frustrante tentar fazer medicamentos contra a doença chegarem a todos os atingidos nessas populações.

"Às vezes não há remédios suficientes, em especial quando há um grande surto e precisamos fazer a administração em massa", diz o médico.

Segundo ele, o problema não é só levar medicamentos a esses locais, mas também o tipo de droga oferecida.

Alguns remédios mais antigos não surtem efeito e chegam, segundo o especialista, a atrapalhar o tratamento, pois podem levar à resistência do parasita.

"As indústrias farmacêuticas precisam liquidar os estoques de remédios antigos antes de produzir os novos (…) O fato é que ainda encontramos formulações antigas, que não são muito eficazes, ainda sendo produzidas."

A Médico Sem Fronteiras é uma das organizações que advoga pelo acesso das populações carentes a aos chamados medicamentos ACTs (terapia combinada de artemisinina, na sigla em inglês) de última geração, que são considerados os mais eficientes no combate ao parasita.

Alcoba reconhece, porém, que não é algo fácil de ser alcançado. "É uma questão de preço - os ACTs são caros. Quando falamos de acesso, preço é obviamente um das grandes barreiras."

A empresa suíça Novartis afirma ter entregue, sem obter lucro, mais de 300 milhões de tratamentos com ACTs para o combate à malária.

iG

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