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sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

“Meu primeiro namorado me contaminou com o vírus HIV”

Carina Penha, 30 anos, está no grupo eleito como um dos mais vulneráveis à aids: as mulheres jovens

Carina queria ser Cinderela. Uma princesa do tipo moleca, que gostava de subir em árvores quando menina, mas sonhava com a chegada do príncipe e do casamento com véu e grinalda.

No conto de fadas em que vivia, no município de Caxias do Sul (RS), não imaginava que o primeiro namorado iria apresentá-la ao vírus causador da aids e infectá-la com uma doença que parecia, naqueles tempos, ser personagem só de história de terror.

“Nem sabia direito o que era HIV. Era uma daquelas coisas que a gente pensa que só acontece com o vizinho”, lembra Carina Penha, hoje com 30 anos e sabidamente soropositiva desde os 24.

“Comecei a namorar aos 16. Tinha um relacionamento de 8 anos quando descobri estar infectada. Quase morri de tristeza. Mas sobrevivi”, diz ela, que agora é professora e contadora de histórias.

Carina ainda adora os contos de príncipes e princesas – sempre presentes em seus trabalhos com crianças, adolescentes, adultos e idosos – mas salpica seus relatos com informações sobre a aids.

Aproveita o talento para contar histórias do mundo da fantasia e dissemina informações contra o preconceito real existente em torno da doença. Alerta às jovens que, basta transar sem camisinha – mesmo que o parceiro pareça um príncipe – para estar no alvo dos novos casos de contaminação.

O grupo etário feminino (de 13 a 25 anos), inclusive, foi classificado nesta semana pelo Ministério da Saúde, como um dos mais vulneráveis ao vírus HIV. A vivência de Carina consegue exemplificar um pouco o porquê das mulheres jovens ocuparem esta posição.

“E talvez a minha trajetória ajude outras mulheres da minha idade a não entrarem para as estatísticas da aids”, acredita ela, que sempre começa a contar sua história assim.

Estatísticas
Em 2010, os números absolutos de novos casos de aids em meninas de 13 a 19 anos superou pela primeira vez os registros entre os meninos de mesma idade, conforme o boletim divulgado nesta segunda-feira, dia 28, pelo Programa Nacional de Aids.

Nesta população feminina, foram 349 registros contra 296 entre os garotos. A ascensão delas no gráfico do HIV começa já no ano 2000, tempo em que Carina Penha colocava a timidez no bolso – algo que sempre a afastou dos garotos. Mesmo com toda a vergonha do mundo, aceitava sair com o vizinho, pegar um cinema e até dar um beijo no retorno para a casa.

“Ele precisou insistir bastante para a gente sair a primeira vez. E, depois do terceiro convite, resolvi aceitar. Ele era bonito e eu fiquei encantada”, lembra.

Durante os oitos anos de relacionamento com o primeiro e único namorado, as brigas e o ciúme fizeram parte do enredo.

“Como boa representante do signo de Virgem” (define-se), Carina bradava seu perfeccionismo, não gostava que as coisas saíssem do que tinha sido planejado. Chegar fora do horário ou esquecer de avisar um outro compromisso, era motivo para uma briga (das feias).

Em uma dessas desavenças, ela e o namorado ficaram 15 dias sem conversar.

“Quando fui procurá-lo para fazer as pazes, descobri que estava internado no hospital, em um leito de isolamento, impossibilitado de receber visitas”, lembra. Como os amigos deles disseram ser meningite, Carina foi para casa, preocupada com o namorado (ex?) e ficou torcendo por sua recuperação.

Preservativo
A busca da perfeição pela garota virginiana fazia com que ela procurasse o médico, a cada seis meses, para fazer exames periódicos e checar se estava tudo bem com a saúde. Mas entre os critérios de autocuidado, uma falha foi crucial – e cometida quase sem querer.

“Nunca usei camisinha com meu namorado. Nunca exigi preservativo e nem conversei sobre isso”, lembra.

Esta postura reflete a adotada por 60% das pacientes do sexo feminino com menos de 20 anos e é explicada pela ginecologista especializada em saúde do adolescente e da mulher, Albertina Duarte. Segundo ela, as garotas têm um medo intenso de desagradar o parceiro.

“Elas ainda temem parecer promíscuas quando exigem a camisinha. Uma bobagem que persiste”, diz.

Um outro ponto ressaltado pelo Ministro da Saúde, Alexandre Padilha, é que a geração contemporânea de jovens não viveu os tempos mais árduos da aids, registrados no início da epidemia na década de 80. Por isso, eles se sentem à margem da contaminação.

Um terceiro aspecto já descrito pelo infectologista Jean Grinchteyns, do Instituto Emílio Ribas – referência nacional antiaids – é que esta população, em especial quando não tem múltiplos parceiros sexuais, acredita estar protegida do HIV.

Esta mistura de fatores caiu por terra, e pesando uma tonelada, quando os médicos de Caxias do Sul chamaram Carina Penha para entregar a ela os resultados do exame de sangue.

“Em uma conversa rápida, mas bem explicativa, eu não apenas aprendi o que era aids e HIV mas tive de assimilar que tudo aquilo estava acontecendo comigo.”

Espera
Ao saber que estava infectada, primeiro, Carina Penha caiu em um choro de horas e teve a sensação de que ia morrer a qualquer momento.

“Depois, entrei em um processo de luto que durou quase dois anos”, conta.

“Não saía de casa, não queria comer, parei de estudar e de trabalhar.”

O resgate dessa situação foi ocorrendo aos poucos e começou com a reação da mãe, que não a julgou, apesar da tristeza. O pai também deu total apoio e o irmão mais velho disse que “a amava incondicionalmente e que o HIV não era definidor de caráter”.

Carina foi convidada a fazer uma oficina para contar histórias e o primeiro passo dado ao sair do casulo foi procurar o ex-namorado para uma conversa.

“Descobri que ele já sabia ter o vírus há muito tempo e não me contou. O curioso é que não tive mágoa. Hoje sou até amiga dele, conversamos sobre prevenção.”

No emprego, Carina contou ser soropositiva. Para os vizinhos e amigos também disse ter o HIV. Ela acredita que a revelação deixa menos espaço para o preconceito. Ao mesmo tempo, sabe que a discriminação ainda é uma realidade para a aids e respeita quem prefere o segredo.

“Algumas pessoas, em especial namoradinhos, se afastaram depois que souberam do meu diagnóstico. Mas eu sei que o homem certo e maravilhoso ainda vai aparecer.”

Carina ainda é um pouco Cinderela. O sonho não foi excluído só por causa do HIV. A princesa moleca toma antiretrovirais todo dia e espera o príncipe encantado com quem – agora sabe – sempre irá usar camisinha.

Fonte IG

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