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Durante teste, as pessoas se esqueceram da ética até na
hora do cara ou coroa
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Diversas resoluções de Ano Novo foram feitas – e sem dúvida ignoradas. Entretanto, existe uma que provavelmente nem mesmo consta em muitas listas, e deveria: agir mais eticamente.
A maioria das pessoas, se pressionadas, reconheceriam que precisam ajustar sua ética. Pode ser que no ano passado, tenha manipulado alguns números no trabalho, amassado um carro e não deixado um bilhete e permanecido em silêncio quando um amigo fez uma brincadeira racista.
O problema, segundo uma pesquisa, é que geralmente existe uma incongruência entre como pensamos que agiremos quando enfrentarmos uma decisão moral e o que de fato acontece.
Aqui está apenas um dos muitos exemplos de uma experiência da Universidade Northeastern: os participantes foram instruídos a jogar cara ou coroa para ver quem deveria fazer certas tarefas. Uma tarefa é demorada e trabalhosa; a outra é rápida e divertida.
O participante joga a moeda sozinho (embora secretamente observado por câmeras de vídeo), relata David DeSteno, professor de Psicologia da Northeastern que conduziu a experiência. Apenas 10% agiram honestamente. O restante nem jogou a moeda, ou continuou jogando até que a moeda caísse na posição desejada.
Tentar se tornar mais ético – ou ensinar as pessoas a como se tornar – parece fadado ao fracasso então. Na verdade, não é bem assim. O problema é que a forma como ensinamos ética tem de parear o que já sabemos sobre o funcionamento da mente humana.
Grupo cria site sobre ética empresarial
Uma área que claramente precisa de atenção é a ética empresarial, especialmente considerando as transgressões no mundo financeiro nos últimos anos. Alguns dos maiores pesquisadores dos Estados Unidos concordam. Um grupo deles – a maioria sendo das universidades americanas – criou um novo site, o EthicalSystems.org, em janeiro.
O site é o primeiro a unir esforços em pesquisas e recursos extensivos no assunto da ética empresarial objetivando disponibilizar o vasto acervo às escolas, ao governo e às empresas – especialmente aos responsáveis pela conformidade.
"Antigamente, a ética empresarial nascia da filosofia, com o foco em fazer o que é certo", afirma Jonathan Haidt, professor de Ética e Liderança da Faculdade de Administração Leonard N. Stern da Universidade de Nova York. Nos últimos dez anos houve uma explosão de pesquisa da economia comportamental" e das razões subjacentes pelas quais as pessoas agem como agem.
Parte da pesquisa foi atualizada pelos escândalos da Enron e da WorldCom se desdobrando na época, assim como a crise financeira mundial. Esses eventos, em parte, "inspiraram um pequeno grupo de pesquisadores a desenvolver uma abordagem da ética empresarial mais realista psicologicamente", diz Haidt, que encabeçou o site.
Esta abordagem – que se aplica à ética em geral, e não apenas à ética empresarial – incorpora o que agora sabemos sobre como as pessoas reagem quando confrontam dilemas morais e quais ferramentas podem ser usadas para levá-las a fazer a coisa certa.
Lembre-se de quando você se engana
Primeiramente, precisamos ter mais consciência das maneiras como enganamos a nós mesmos.
Temos de aprender e subconscientemente evitar dar as costas quando confrontamos um dilema moral. E depois devemos aprender a como desafiar as pessoas adequadamente nessas situações.
"Quando as pessoas predizem como irão agir em uma dada situação, o dever predomina – devemos ser justos, devemos ser generosos, devemos impor os nossos valores", analisa Ann E. Tenbrunsel, professora de Ética Empresarial da Universidade de Notre Dame que está envolvida com o site EthicalSystems. "Porém, quando chega o momento de agir, o 'querer' predomina" – não quero parecer um tolo e não quero ser punido.
"O nosso instinto de sobrevivência é o de querer ser amado e aceito", afirma Brooke Deterline, diretora executiva da Courageous Leadership, uma empresa de consultoria que oferece oficinas e programas em como lidar com situações éticas. "Não fazemos coisas ruins intencionalmente, contudo, quando estamos sob ameaça, o nosso instinto inicial é minimizar ou ignorar situações problemáticas".
A maioria das pessoas conhece a sensação: algo acontece que sabemos que é errado e intencionamos nos manifestar ou consertar. Todavia, não sabemos bem como fazê-lo e o momento passa, justificando posteriormente, que foi certo agir como agimos. Assim, como mudar isso?
Medo de falar o que pensa
Usando a psicologia comportamental social e cognitiva assim como a neurociência, o primeiro passo é nos conscientizarmos das nossas inclinações naturais, afirma Brooke Deterline.
"Pense em retrospecto: quando você fica vulnerável a não falar aquilo que pensa e não dizer o que precisa ser dito?", pergunta. É quando uma autoridade está presente? Quando isso poderia afastá-lo dos amigos? Quando isso poderia fazer com que seus subordinados o desprezem?
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A ansiedade pode levar as pessoas a não falarem o que pensam
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"Quando a maioria de nós se sente constrangida, calamos a boca. Porém, precisamos usar o desconforto para saber que esse é o sinal para sermos corajosos e uma dica para agirmos em vez de ficarmos parados."
O foco no motivo das pessoas agirem ou não eticamente, é claro, não é limitado ao mundo dos negócios. Afinal, são necessários bons cidadãos para termos bons funcionários.
Philip G. Zimbardo, professor emérito de Psicologia da Universidade de Stanford, é pioneiro no estudo do poder social – por bem e por mal – e deu início a um programa, em 2007, chamado Projeto Imaginação Heroica. O seu interesse na ética é antigo; em 1971 ele criou o notório Experimento Prisão de Stanford, onde os alunos universitários "guardas" diminuíam e humilhavam os alunos "prisioneiros". O experimento teve de ser interrompido antecipadamente porque se tornou muito abusivo.
Após estudar a degradação moral há décadas, Philip começou a se questionar sobre os aproximadamente 10% a 20% das pessoas em cada situação que resistiram. Quem eram essas pessoas que ele chamou de heróis, e podemos ensinar alguém a ser um?
Por meio do Projeto Imaginação Heroica – para o qual Brooke já trabalhou – alunos do ensino fundamental, do ensino médio e da faculdade aprendem sobre dinâmicas de grupo, tal como o efeito espectador, no qual quanto mais pessoas houver em uma cena, menor a probabilidade de alguém ajudar.
Utilizando videoclips e situações reais, os professores explicam como os alunos podem resistir a tal comportamento, e os ajudam a explorar o motivo pelo qual agiram – ou deixaram de agir – em situações específicas.
Embora os alunos sejam instruídos a não serem "heróis burros" e se arriscarem à toa, Zimbardo afirma, "lhes ensinamos que o conhecimento nos obriga a fazer alguma coisa – agir heroicamente".
O seu programa sem fins lucrativos disponibilizou muitos dos seus recursos de graça e está nos estágios finais de receber fundos para treinar um grupo de professores em Flint, Michigan, começando na primavera. Graduados da Universidade de Michigan auxiliarão no programa e, certamente, desenvolverão descobertas longitudinais da sua efetividade, explica.
Kristen Renwick Monroe, professora de Ciências Políticas da Universidade da Califórnia, Irvine, há muito estuda porque algumas pessoas agem corretamente e outras não. A professora descobriu em sua pesquisa que os "salvadores dizem, 'O que mais eu poderia fazer?'", afirma. "O expectador diz, 'eu era apenas uma pessoa? o que eu podia fazer?'"
"Temos de pensar, 'Quem sou eu, e como as minhas ações criam quem eu sou?'", acrescenta Kristen.
A professora relata ter entrevistado uma holandesa que assistia enquanto judeus eram jogados em um caminhão e levados embora durante a Segunda Guerra Mundial e que posteriormente salvou mais de 12 outros. Ela lembra que a mulher lhe disse: "Todos nós temos lembranças de quando deveríamos ter feito algo, e levamos isso para o resto de nossas vidas".
iG
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