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segunda-feira, 10 de agosto de 2015

"Fico me perguntando se vale a pena ser honesto nesta vida", diz vítima de remédio falsificado

Remédios caros são os maiores alvos de falsificação
Agência alerta que é preciso estar atento e não comprar medicamentos em feiras ou em camelôs

Em 2003, o engenheiro equatoriano Julio Cahuano, resolveu dar um presente ao pai, Cezar Augusto Cahuano. Instalado desde 1994 no Rio de Janeiro, onde atua há mais de vinte anos em uma empresa de porte, via sinais de envelhecimento no pai e o convidou para vir do Equador ao Brasil, a fim de ser submetido a uma operação de catarata.

Cézar e a esposa vieram. E o que prometia ser um alívio para os seus olhos se tornou um drama para a vida da família. Cézar recebeu aplicações de metilcelulose, colírio que protege em operações de catarata, mas o medidamento era falsificado. Resultado: ele ficou cego do olho esquerdo e teve a visão do direito comprometida. Retornou para o Equador sem nunca mais querer pisar no Brasil. Ao R7, Cahuano lamenta.

— Queria ajudar meu pai, não o via há algum tempo. Ele e minha mãe chegaram felizes. E saíram muito chateados, depois de terem ficado meses sem poder deixar o País, por causa das questões judiciais. E eu não podia fazer nada. Meus irmãos, por um bom tempo, me rejeitaram.

Até hoje ele está para receber a indenização determinada pela Justiça à família: R$ 25 mil mais 40% de um salário mínimo por mês. O caso ocorreu há quase 13 anos e não houve punição. Por isso ele, hoje com 50 anos, não vive mais em paz depois do ocorrido, por não ter visto os culpados serem punidos.

— A empresa que comercializou e distribuiu o medicamento não tinha alvará. Agora vejo o seu antigo proprietário solto, comercializando outros produtos. Amo o Brasil e o Rio de Janeiro, mas algumas coisas que acontecem, não só aqui, nos deixam sem chão. Quando o mínimo de dignidade humana não é respeitado, me pergunto: vale a pena ser honesto, quando essas pessoas má intencionadas se beneficiam e saem vitoriosas? Acho que vale, mas muita gente não vê desta maneira.

Cézar morreu há cerca de três anos, amargurado. E o filho diz que sente pelo fato de não poder fazer o tempo voltar. Para ele, a sorte foi que, podendo retornar sempre ao Equador, continuou vendo o pai, que não o acusou, e se reconciliou com os irmãos. Mesmo assim Cahuano não esconde uma ponta de tristeza.

— Ele (o pai) colocou uma prótese, mas nunca mais se conformou. Ficou revoltado com o que houve.

Era uma pessoa independente que, com problemas de visão, começou a se fechar. Foi até se desinteressando da vida. Confesso que penso se eu poderia ter feito algo a mais por ele. Mas não consigo ver o que. Minha mãe também ficou traumatizada. Hoje ela tem um problema no joelho.

Cheguei a sugerir que ela viesse para cá se tratar. Ela me disse: cirurgia nunca mais. Ainda mais no Brasil.

Efeitos da falsificação
Cahuano conta ainda que cerca de outros 50 pacientes tiveram o mesmo problema que o do seu pai. Mas apenas dois, incluindo ele, entraram na Justiça. Muitos sentem o efeito mas não conseguem detectar que a causa foi o uso de um remédio falso, algo que vem cresendo no País.

A falsificação de medicamentos no Brasil é uma realidade que, apesar da tecnologia para rastreamento, ganha números cada vez maiores no Brasil. Lotes com produtos de origem criminosa já ocupam 20% do comércio de remédios no País, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde) ameaçando os usuários com um tratamento ilusório de uma doença, podendo provocar efeitos colaterais e, muitas vezes, a morte.

Segundo a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), os medicamentos mais falsificados são os mais caros. Em nota ao R7, a agência informa que entre os produtos identificados com maior frequência pode-se destacar medicamentos para a impotência, medicamentos oncológicos e hormônios de crescimento.

O aumento deste tipo de atividade no Brasil, segundo o biólogo Amilcar Lopes, presidente da empresa Rastreabilidade Brasil, decorre do fato de o mercado farmacêutico brasileiro estar crescendo e, por ironia, da evolução científica que tem propiciado remédios cada vez mais avançados, muitos deles descobertos recentemente.

— Há medicamentos que começaram a ter maior valor agregado. A evolução da indústra farmacêutica fez surgir remédios mais caros e sofisticados. E é lógico que os falsificadores vão atuar em cima deste tipo de produto.
 
Se os usuários têm enormes prejuídos, os criminosos obtêm lucros exorbitantes com a falsificação: foram R$ 13 bilhões movimentados em 2014 no Brasil, segundo Edson Vismona, presidente do Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade (FNCP).
 
Em vez das substâncias adequadas, medicamentos podem ter tinta, giz, farinha e até cimento em sua composição. Material barato, sem gastos com pesquisas e livre de impostos. Para o presidente da Interfarama (Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa), Antônio Britto, a internet também tem sido um meio de propagação dessa atividade ilícita.

— É preciso muito cuidado, especialmente no caso de compras pela internet. Estima-se que até 50% das compras online de medicamentos sejam de remédios falsos ou roubados. O consumidor deve ficar atento a sites de procedência desconhecida, especialmente quando eles oferecem medicamentos por preços abaixo da média de mercado. Para as compras fora da internet, recomenda-se dar preferência para farmácias e drogarias, em especial as já conhecidas.
 
Na tentativa de evitar as falsificações, a Anvisa informa que, além dos esforços na busca dos produtos falsificados, é importante que o usuário tenha consciência e evite comprar remédios em feiras ou em camelôs. O correto é adquiri-los em farmácias e drogarias com alvarás sanitários e reputação reconhecida. Outra iniciativa importante é decifrar o código na lateral da embalagem, que precisa ser raspada.
 
Para explicar a dificuldade em chegar aos falsificadores, a Anvisa afirma que os remédios são falsificados fora do país.
 
— Nas ações de fiscalização e investigações realizadas não foram identificadas atividades de fabricação de medicamentos no Brasil. As informações obtidas indicam que estes produtos irregulares têm sido fabricados no exterior e são contrabandeados no Brasil. Em muitos casos, os blisters (que armazenam comprimidos) são comercializados soltos ou acondicionado em embalagens falsificadas.
 
A esperança no rastramento
Uma nova tecnologia, conhecida como Datamatrix, deverá ser um fator fundamental para diminuir os índices de falsificação. A Anvisa já estipulou as normas para o rastreamento, que estão à espera de uma implementação formal desde 2009. Pelo sistema de rastreamento, composto de um código e de imagem, fica possível, por meio de um banco de dados, saber toda a movimentação do produto.
 
Segundo Lopes, os laboratórios já se adequaram a esta lei, que criou esse sistema, denominado SNCM (Sistema Nacional de Controle de Medicamentos), já existe e só falta um acordo no Senado Federal para que outro projeto não substitua sua implantação definitiva, que deverá ser totalmente incorporada aos laboratórios, após espera de mais de seis anos, em janeiro de 2017.
 
— Países que adotaram esse rastreamento reduziram as falsificações a algo entre 1% e 4%. Isso inclusive barateia o medicamento, pois a bula pode ser lida por um aplicativo, não necessitando de papel. O fim da necessidade de contratar um seguro específico também reduz o custo. E quando um número rastreado não conferir, é certo que houve falsificação. Essa lei trará muitos benefícios ao consumidor.
 
R7

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