Pesquisadores de duas universidades monitoraram a atividade de dez pacientes terminais para tentar descobrir tudo o que se passa no cérebro no exato momento em que estamos morrendo
O que passa em nossa cabeça no momento da morte? Não se sabe exatamente e, embora os cientistas tenham alguma resposta, a resposta continua sendo um grande mistério. Além de difícil solução, tentar respondê-la pode criar implicações éticas. No entanto, uma equipe de cientistas da Universidade Charitée, em Berlim, e também da Universidade de Cincinnati, nos Estados Unidos, encontraram uma maneira de realizar um pioneiro estudo sobre a neurobiologia da morte. A pesquisa foi liderada pelo cientista Jens Dreier.
O título da pesquisa foi “Depolarização da difusão terminal e silêncio elétrico na morte do córtex cerebral humano”. Para realizá-la, os cientistas precisaram do consentimento dos parentes de vários pacientes terminais. O estudo exigia um monitoramento neural considerado invasivo. Os pacientes tinham sofrido terríveis acidentes de trânsito, acidentes vasculares cerebrais ou paradas cardíacas. Ou seja, nesses casos, não havia mais como salvá-los, segundo os pesquisadores.
Ao trabalhar com essas pessoas, os cientistas descobriram que os cérebros dos animais e dos seres humanos morrem de uma maneira parecida. Eles agora dizem mas que também existe um exíguo momento em que o funcionamento do cérebro pode ser restaurado, ao menos de forma hipotética. O objetivo do estudo não era apenas observar os últimos momentos de um cérebro, mas também compreender como seria possível salvar vidas no futuro.
Cérebros de animais
Grande parte do que até então se sabia sobre a morte cerebral era produto de experimentos com animais, realizados no século passado. Até então, o que se conhecia era o seguinte: “A lesão total e irreversível dessas células se desenvolve em menos de dez minutos quando a circulação cessa completamente”, explica um dos cientistas no estudo.
Cérebro humano
A equipe de pesquisadores queria ter mais detalhes sobre o que acontece com o cérebro dos humanos, algo que ainda estava cheio de enigmas. Para isso, à medida que o paciente terminal piorava, os cientistas monitoraram sua atividade neurológica usando dezenas de eletrodos. Em primeiro lugar, em oito dos dez pacientes, os pesquisadores detectaram o movimento de células cerebrais que tentavam impedir o inevitável, ou seja, a morte que já se avizinhava.
De maneira geral, os neurônios funcionam com íons carregados, o que cria desequilíbrios elétricos entre eles e seu ambiente – isso permite que pequenos choques, ou sinais, sejam criados. Para os autores do estudo, a manutenção desse sistema fica mais difícil quando a morte está chegando. Para se alimentar, essas células “bebem” oxigênio e energia química da corrente sanguínea. Quando o corpo morre e o fluxo de sangue que chega ao cérebro para, os neurônios – privados de oxigênio – tentam uma de suas últimas saídas: acumular os recursos que sobraram, dizem os pesquisadores.
Enviar sinais de um lado para o outro, como normalmente ocorre, acaba se tornando um desperdício nos últimos momentos da vida. Portanto, os neurônios se “calam” e, ao invés de enviar sinais, usam suas reservas de energia para manter cargas elétricas internas, esperando o retorno de um fluxo de sangue que nunca virá. Esse fenômeno foi chamado de “depressão não dispersa”, pois ele ocorre simultaneamente em todo o cérebro.
Depois, o que se segue é a fase da “despolarização da difusão”, conhecida como “tsunami cerebral”. Ocorre uma grande liberação de energia térmica, porque o equilíbrio eletroquímico que mantinha as células vivas entram em colapso – esse “tsunami” leva à intoxicação e destruição das células. Todas essas reações foram observadas pelos cientistas nos pacientes terminais. E à medida que os níveis de oxigênio caíam, a atividade elétrica também silenciava em todo o cérebro.
É então que a morte chega
No entanto, o estudo revelou que, no futuro, todo esse processo pode não ser tão inevitável como é agora. “A despolarização expansiva marca o início das mudanças celulares tóxicas que eventualmente levam à morte, mas não é o ponto chave da morte por si só, pois essa despolarização é reversível até certo ponto, com a restauração do suprimento de energia”, disse o principal autor do estudo, Jens Dreier, do Centro de Pesquisas de Acidentes Cardiovasculares da Universidade Charité, de Berlim.
Os dados obtidos pelo estudo, publicados pela revista científica Annals of Neurology, apontam que a ressurreição celular continua sendo possível. Porém, novas pesquisas devem ser feitas até que isso seja possível. Como Dreier assinala, “a morte é um fenômeno complexo” para o qual “não há respostas fáceis.”
G1
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