Estudo da USP com 800 mulheres mostra que 60% delas usaram o contraceptivo de emergência; 18,5% recorreram ao remédio mais de uma vez em 1 ano
A pílula do dia seguinte chegou a entrar na rotina de Bárbara (nome fictício) durante parte da adolescência. Aos 16 anos, ela começou a namorar sério, abandonou a camisinha e decidiu confiar apenas na tabelinha. "Evitava ter relação quando estava no período fértil, mas teve uma vez que o impulso foi mais forte", conta ela, hoje com 18 anos. Bárbara, moradora da zona norte de São Paulo, faz parte de um universo no qual quase 60% das jovens já usaram o método emergencial contraceptivo uma vez na vida.
O porcentual surpreendeu pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP), que ouviram 800 jovens. "Estudos anteriores em regiões metropolitanas indicavam taxas menores, em torno de 50%", afirma Ana Luiza Borges, professora da Escola de Enfermagem e coordenadora do trabalho apresentado na Conferência Internacional de Planejamento Familiar, na semana passada na Etiópia.
Feito em Arujá em 2011, o trabalho entrevistou alunos entre 15 e 19 anos e seus resultados podem, segundo os pesquisadores, ser estendidos à Região Metropolitana. Do total, 307 jovens disseram ter vida sexual ativa. Entre os alunos de escolas públicas, 57,9% disseram ter usado a pílula e 57% dos estudantes das particulares também já recorreram ao método.
O medo de engravidar e "decepcionar a família" levou Bárbara a ir com uma amiga a uma farmácia em busca do medicamento. "Sempre tinha ouvido que essa pílula causava vários efeitos colaterais, mas não senti nada de diferente quando tomei. Por isso, acho que acabei relaxando. Se na primeira vez usei por desespero, a partir da segunda, virou comodismo", diz ela, que tomou o remédio por quatro meses seguidos.
A maioria fez como Bárbara e comprou o produto nas farmácias: 74,6%. Apenas 6,8% obtiveram os contraceptivos em posto de saúde. A pílula é acessível e custa em torno de R$ 12. Para a professora, o comportamento tem um lado positivo: "Jovens conseguem tomar medidas para evitar gravidez indesejada", diz. Para Ana Luiza, no entanto, a baixa procura por profissionais de saúde representa a perda de oportunidade de se repassar informações aos jovens.
Abuso. Ana Luiza, porém, destaca que não é a maioria dos jovens que seguem o comportamento de Bárbara, que usou a pílula por diversas vezes. "O receio de que a pílula de emergência fosse usada indiscriminadamente não foi confirmado", diz. Do total, 18,5% dos jovens recorreram ao método mais de três vezes em um ano. "Só no quarto mês de uso comecei a ver que aquilo estava me fazendo mal. Meu ciclo menstrual ficou desregulado", diz Bárbara.
A professora observa que a maior parte dos jovens (31,6%) recorre à contracepção de emergência por insegurança. "É o medo de não ter usado de forma adequada o contraceptivo", diz Ana Luiza. Foi esse sentimento, por exemplo, que levou a universitária Camila (nome fictício), de 18 anos, ao uso da pílula do dia seguinte. Ela usou quando ainda era virgem. "Tinha 16 anos e meu maior medo era engravidar. Minha irmã tinha engravidado e eu sabia como era difícil. Só que teve um dia que eu e meu namorado começamos a nos beijar, foi dando aquela vontade e quase aconteceu. Como teve contato direto do meu corpo com o dele, fiquei desesperada", conta a jovem moradora de Diadema, no ABC paulista.
"O aconselhamento é importante para todos os grupos", diz a pesquisadora, mas um dado é preocupante: 19,8% não quiseram usar nenhum contraceptivo. Remédio de emergência, a pílula do dia seguinte deve ser usada no máximo até 72 horas depois da relação sexual. O acesso ao medicamento no Sistema Único de Saúde (SUS) foi facilitado em abril deste ano.
Estadão
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