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terça-feira, 22 de abril de 2014

A perturbadora verdade por trás do surto de Ebola na África

Após décadas de uso de armas químicas e biológicas em guerras e experimentos, os governos ocidentais e suas organizações “internacionais” de saúde já deram razões de sobra para serem vistos com desconfiança e medo pelos países do Oeste africano
 
Original em New Eastern Outlook, tradução por Vinicius Gomes – da Fórum Semanal 143
 
No artigo do The Guardian, “Pânico com o vírus mortal do Ebola se espalha pelo oeste da África”, lia-se:
 
Desde o surto na Guiné do mortal Ebola Zaire, em fevereiro, cerca de 90 pessoas morreram, na medida em que o vírus se propagou para países vizinhos, como Serra Leoa, Libéria e Mali. O surto lançou ondas de choque pelas comunidades que sabem pouco sobre a doença ou sobre como ela é transmitida. Os casos no Mali aumentaram o temor de que esteja se espalhando pelo Oeste da África.”
 
O jornal também relatou que os Médicos Sem Fronteiras (MSF) estabeleceram centros de tratamento na Guiné, e um deles chegou a sofrer um ataque dos locais, que acusaram o grupo de assistência de ter levado a doença ao país. Também é alvo de críticas o governo de Guiné, que se mostrou incapaz de lidar com a crise.
 
Esse ultimo surto, que ainda precisa ser contido e está sendo considerado pelo MSF como uma “epidemia sem precedentes”, ilustra diversas verdades inconvenientes a respeito do tratamento médico global, da resposta emergencial a surtos e da percepção que muitos têm de que o Ocidente está submetendo o mundo em desenvolvimento a uma “tirania médica”.
 
A Falha na preparação
Em 2012, quando os MSF concluíram sua resposta a um surto de Ebola em Uganda,  escreveram: “A resposta de emergência dos Médicos Sem Fronteiras a um surto de Ebola em Uganda chegou ao final. A equipe médica entregou ao Ministério da Saúde de Uganda o centro de tratamento que havia montado no distrito de Kibaale.”
 
Lia-se também no texto: “Como parte de um plano de preparação para futuros surtos, os MSF também restauraram uma unidade de tratamento no hospital de Mulago, localizado na capital Kampala. ‘Uganda desenvolveu a capacidade de responder a crises de Ebola’, disse a coordenadora da MSF, Olímpia de la Rosa. ‘Nós podemos confiar na capacidade da equipe do Ministério da Saúde em assumir e gerenciar casos de Ebola, com todas as garantias de segurança.’”
 
Se os MSF e outras organizações internacionais podem treinar uma equipe médica ugandense e entregar ao governo de Uganda a responsabilidade de prevenir futuros surtos, por que não houve ações similares em países como Guiné, Libéria, Mali e Serra Leoa? De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), surtos de Ebola ocorrem “primeiramente em vilas remotas no centro e no oeste da África, próximos a florestas tropicais”. Por que, então, os países nessas regiões da África não foram preparados para tais surtos – principalmente pelo fato de que muitos dos países que financiam os MSF já estão fortemente envolvidos com os assuntos internos de seus assuntos internos?
 
Apenas a França tem gasto centenas de milhões de euros em suas operações militares no Mali – em 2013 foram quase 2,7 milhões de euros ao dia. O dinheiro investido em operações militares designadas para promover a hegemonia ocidental por todo norte e oeste da África – uma extensão da intervenção ocidental na Líbia – faria qualquer um acreditar que tais fundos deveriam também ser direcionadas para prevenir “epidemias sem precedentes” de doenças mortais como o Ebola, mas aparentemente as mesmas preparações feitas na Uganda foram negligenciadas em Mali (ocupada pela França), assim como em outros países tendentes aos surtos de Ebola.
 
Além de Guiné, os países mais afetados pelo surto do vírus mortal foram Libéria, Serra Leoa e Mali
Divulgação
Além de Guiné, os países mais afetados pelo surto
 do vírus mortal foram Libéria, Serra Leoa e Mali
Enquanto o Ocidente posa como um chefe arbitrário da humanidade através de suas organizações internacionais, intervindo em crises pontuais, sua falha em preparar outras nações vulneráveis ao surto de Ebola usando a mesma fórmula de Uganda, no mínimo, abala a confiança pública. Esta é ainda mais enfraquecida quando o Ocidente intervém nesses mesmos países por ambições geopolíticas, sob a justificativa de “democracia”, “desenvolvimento” e “direitos humanos” e, em seguida, falha terrivelmente em atender a necessidades desesperadoras, como prevenção de epidemias, das mesmas populações.
 
Desconfiança gera suspeita
Enquanto os MSF e o governo de Guiné alegam que as pessoas que atacaram os médicos estavam apenas em pânico, existem verdades perturbadoras a respeito do Ocidente e seu uso de agentes químicos e biológicos tanto para experimentos como parte do avanço de suas ambições geopolíticas – que resultou na genuína suspeita dos locais de que o surto de Ebola foi intencional.
 
A devastação deixada na esteira do uso de Agente Laranja na guerra do Vietnã e na contínua tragédia resultante do uso de urânio empobrecido no Iraque são dois exemplos extremos de como o Ocidente submeteu populações inteiras a agentes mutagênicos que irão ecoar nas gerações ainda por vir. Mais perturbador ainda é o papel que agências internacionais, supostamente neutras, tiveram ao encobrir tais atrocidades.
 
O artigo do Guardian, “Como a OMS encobriu o pesadelo nuclear do Iraque”, mostra como as conclusões da organização foram manipuladas por uma ciência politizada. Além do Agente Laranja e urânio empobrecido, a ONU e os EUA são acusados de ter participação em centenas de milhares de casos de esterilizações forçadas no Peru entre 1995 e 1997. Houve também uma matéria da NBC, intitulada “EUA pede desculpas à Guatemala pelos experimentos com DST”, onde lia-se:
 
“Os pesquisadores da área de medicina do governo dos EUA infectaram propositalmente com gonorréia e sífilis centenas de pessoas na Guatemala, incluindo pacientes mentais institucionalizados, sem o conhecimento ou permissão deles, há mais de 60 anos.
 
Muitos desses infectados eram encorajados a passar a doença para outros, como parte do estudo. Cerca de um terço dessas pessoas nunca conseguiram tratamento adequado”.
 
Mais perturbadoras ainda são as palavras dos políticos e lobistas do Ocidente: a ideia de usar armas biológicas em alvos geneticamente escolhidos foi mencionada no Projeto Neoconservador para um Novo Século (PNAC, sigla em inglês) de 2000: “Remontando as Defesas da América”, no qual lia-se em algumas partes:
 
“A proliferação de mísseis balísticos e veículos aéreos não-tripulados tornarão muito mais fácil projetar um poder militar ao redor do mundo. As próprias munições estão ficando cada vez  mais precisas, enquanto novos métodos de ataque – eletrônicos, não-letais, biológicos – estarão amplamente mais disponíveis.
 
Como a conclusão do processo de transformação pode levar décadas, a arte de se guerrear no ar, na terra e no mar estará muito diferente do que é hoje e o ‘combate’ provavelmente se dará em novas dimensões: no espaço, no ‘cyber-espaço’ e talvez no mundo dos micróbios. 
 
E formas avançadas de tecnologia de guerra biológica que podem ‘alvejar’ genótipos específicos podem transformar o arsenal biológico do reino do terror em uma ferramenta politicamente útil.”
 
Quando lobistas dão declarações dizendo “formas de guerra biológica que podem ‘alvejar’ genótipos específicos” como “ferramentas politicamente úteis”, frente a seu comprovado histórico de utilização de agentes químicos e biológicos em outras populações, percebe-se que não foi mero “pânico” o que levou à violência contra os trabalhadores dos MSF em Guiné.
 
Helicóptero dos EUA espalhando o "Agente Laranja", durante a Guerra do Vietnã, As consequências dessa arma química são sentidas até hoje pela população vietinamita (Wikimedia Commons)
Wikimedia Commons
Helicóptero dos EUA espalhando o “Agente Laranja”, durante a
 Guerra do Vietnã, As consequências dessa arma química são sentidas
 até hoje pela população vietinamita
Se o último surto de Ebola é parte de alguma conspiração ou não, talvez nunca se saiba. A questão central é a falta de confiança que se tem nas agências ocidentais quando eles tentam responder a uma crise. Desconfiança baseada não em medos irracionais, mas em de décadas de abusos, atrocidades, exploração e, principalmente, na contra produtividade do que o Ocidente faz além de suas fronteiras.
 
E se o Ocidente falha em sua função como único árbitro da humanidade, o que deveriam fazer os outros países do mundo? A resposta é bem simples: devem construir um mundo multipolar com agências multipolares que colaborem entre si em vez de depender constantemente do Ocidente e de suas organizações “internacionais”. As nações do Norte e Oeste da África que enfrentam potenciais surtos de Ebola – ou então as nações por toda a Ásia que encaram temores similares quanto à Síndrome Aguda de Respiração Severa (SARS) – , precisam, elas próprias, encontrar parceiros internacionais.  A estes não devem recorrer apenas em tempos de crise, mas para treinar e preparar seus profissionais de saúde para que sejam autossuficientes e capazes de lidar com surtos antes que eles ocorram.
 
Parte do que muitos chamam de “tirania médica” do Ocidente é a criação de circunstâncias nas quais os países da “periferia” dependem constantemente deles para ajuda, expertise e assistência. Tal dependência é contrária ao conceito de soberania nacional e ameaça a liberdade e segurança de indivíduos dentro da nação. Em Guiné, a inabilidade do governo em lidar com a crise permitiu que ela ganhasse proporções perigosas, enquanto as pessoas necessitavam da ajuda de agências estrangeiras nas quais simplesmente não confiavam.
 
Os países precisam chamar a responsabilidade para eles ao terem de lidar com surtos e nações parceiras deveriam guiá-los nessa tarefa, em vez de “segurar sua mão” a cada crise que surge. O último surto no Oeste africano ilustra o quão mal  preparadas estão essas agências “internacionais” do Ocidente para proteger a população global, e como essa mesma população global estaria melhor assistida se procurasse meios de se proteger sozinha.
 
Foto de capa: Wikimedia Commons
 
Revista Forum

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