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terça-feira, 22 de abril de 2014

Venezuelanas arriscam saúde com injeções de silicone nas nádegas

Denny prefere não se identificar pois sua família não sabe que ela tomou as injeções de silicone (Foto: BBC)
Foto: BBC
Denny prefere não se identificar pois sua família não sabe que
ela tomou as injeções de silicone
Mesmo com proibição, a estimativa é de que 30% das mulheres entre 18 e 50 anos optam por esse procedimento para ficarem 'mais belas'
 
A moda de nádegas grandes na Venezuela está levando algumas mulheres a extremos como o uso de injeções de silicone na região do corpo, uma prática proibida no país e que coloca a saúde em risco.
 
Denny, uma advogada de 35 anos que prefere não dar o sobrenome, é uma destas mulheres, Ela contou à BBC que acordou um dia com um inchaço do tamanho de uma bola de futebol na região lombar.
 
Ela não conseguia andar ou se inclinar, a dor era muito intensa.
 
Antes mesmo de consultar um médico, a venezuelana sabia que o inchaço deveria ser um efeito colateral do silicone líquido injetado em suas nádegas. O líquido se moveu para as costas e estava pressionando sua coluna.
 
''Foi um choque terrível. Eu não conseguia andar. Foi assim que minha agonia começou'', disse.
Injeções nas nádegas são um dos muitos procedimentos cosméticos aos quais as venezuelanas se submetem para corresponder aos modelos de beleza vigentes no país.
 
Mas estas injeções foram proibidas pelo governo em 2012, seis anos depois de Denny ter passado pelo procedimento.
 
Apesar da proibição, as injeções continuam. Até 30% das mulheres entre 18 e 50 anos escolhem este procedimento, segundo a Associação de Cirurgiões Plásticos Venezuelanos.
 
Homens também costumam injetar este tipo de silicone nos músculos peitorais, mas os números são bem menores.
 
Daniel Slobodianik é um dos dois especialistas do país que pode retirar o silicone líquido do corpo da paciente (Foto: BBC/Reprodução)
Foto: BBC / Reprodução
Daniel Slobodianik é um dos dois especialistas do país que pode
retirar o silicone líquido do corpo da paciente
Sem barreiras
As injeções são feitas com silicone de biopolímero. A aplicação direta na massa muscular torna este silicone líquido muito mais perigoso do que os implantes comuns, nos quais o silicone está contido em uma espécie de bolsa.
 
A atração deste tipo de implante é o fato de ele ser mais barato do que as cirurgias convencionais.
Uma injeção pode custar cerca de 2 mil bolívares (pouco mais de R$ 700) e o procedimento todo não leva mais do que 20 minutos.
 
Mas, os riscos são muito altos.
 
"O silicone pode migrar para outras áreas do corpo, pois não tem nenhuma barreira. O corpo também pode dar uma resposta imunológica ao material estranho, criando muitos problemas", disse Daniel Slobodianick, cirurgião plástico venezuelano.
 
Os pacientes podem sofrer reações alérgicas e fadiga crônica. Se o líquido migrar para outras áreas do corpo também poderá causar dores intensas nas juntas.
 
O médico acrescenta que os sintomas poderão aparecer apenas anos depois das injeções.
 
No caso de Denny, o silicone se moveu para cima, para as costas, o que resultou em uma pressão dolorosa na coluna e dificultou movimento como, por exemplo, caminhar. Mas, de certa forma, ela teve sorte.
 
Os números não são precisos, mas a Associação de Cirurgiões Plásticos da Venezuela estima que pelo menos uma dúzia de mulheres morrem a cada ano devido a estas injeções.
 
Daniel Slobodianick é um dos apenas dois cirurgiões do país especializados na remoção do tecido afetado pelas injeções.
 
O médico afirma que tem uma longa fila de espera e Denny, por exemplo, teve que esperar por um ano até conseguir uma vaga.
 
No entanto, muitas não conseguem pagar pela cirurgia, que custa 60 mil bolívares (mais de R$ 21 mil).
 
Problema nas costas
Horas antes da cirurgia, Denny explica à BBC que não quer divulgar o sobrenome pois alguns familiares não sabem a razão de ela ter ficado doente.
 
Eles acreditam que a advogada tem algum problema nas costas, algo que ela também acreditou durante anos, antes do aparecimento do caroço.
 
Denny afirma que não teria tomado a injeção se soubesse dos riscos e descreveu a pressão que a levou a fazer o procedimento.
 
"Houve um boom. No escritório todas as mulheres tinham nádegas lindas. A gota d'água foi quando uma colega com quem trabalhava chegou com nádegas lindas, pareciam dois balões, tão bonitas. Foi ela quem me incentivou", disse.
 
'Nunca fui obcecada com medidas perfeitas, mas me deixei levar pela ideia de que mulheres venezuelanas deveriam parecer bonecas Barbie', acrescentou.
 
Venezuela é conhecida por ter vencido sete vezes o concurso de Miss Universo (Foto: BBC/Reprodução)
Foto: BBC /  Reprodução
Venezuela é conhecida por ter vencido sete vezes o concurso
de Miss Universo
Concurso de Miss
A Venezuela já venceu sete vezes o concurso de Miss Universo, dando ao país a reputação de fábrica de rainhas da beleza.
 
Carolina Vazquez Hernandez, consultora especialista em questões femininas, diz que a pressão da sociedade é muito intensa no país, maior do que em outros países.
 
"Nós, mulheres venezuelanas, não temos uma identidade clara de nossas raízes. Por causa desta nossa falta de identidade, nossa autoestima é muito fraca e somos capazes de nos submeter a qualquer coisa que desenvolva nossa autoestima", disse.
 
Astrid de la Rosa concorda. Ela é uma das ativistas líderes da associação Não ao Biopolímero (organização sem fins lucrativos que dá apoio a vítimas destas injeções).
 
Ela mesma passou pelo procedimento quando seu parceiro estava para deixá-la.
 
"Pensei que uma pessoa iria amar outra por causa da aparência", disse.
 
Logo depois ela começou a se sentir mal. Médicos disseram que o sistema imunológico de Astrid tinha sido afetado e ela foi diagnosticada com leucemia.
 
A proibição do uso destas injeções no país ocorreu em parte graças às ações da associação. Mas para Astrid de la Rosa ainda não é o bastante.
 
Padrões de beleza estão prejudicando autoestima de venezuelanas (Foto: BBC/Reprodução)
Foto: BBC / Reprodução
Padrões de beleza estão prejudicando autoestima de venezuelanas
Ajuda
Astrid afirma que ainda recebe telefonemas semanais de mulheres que receberam as injeções, mesmo depois da proibição.
 
"Não é uma questão de gênero ou classe social. Mulheres e homens fazem isto, há políticos, atores, que já fizeram. Onde esta a ajuda para nós?", disse.
 
O governo proibiu as injeções por causa dos riscos à saúde. E as companhias de seguro não cobrem os cursos de tratamento para cuidar dos danos causados pelas injeções, pois estas companhias não reconhecem os efeitos colaterais das injeções como uma doença.
 
Para tentar enfrentar este problema, Astrid afirma que a organização coleta dinheiro para ajudar a pagar pelas cirurgias reparadoras.
 
Denny, por sua vez, conseguiu pagar pela cirurgia com as economias que tinha, mas no momento ela não pensa no dinheiro.
 
Deitada de bruços depois da cirurgia, ela sabe que serão necessárias três semanas até que ela se recupere totalmente. E a cicatriz vai ficar para sempre.
 
Denny também sabe que o silicone ainda pode afetar sua saúde no futuro.
 
No entanto, a advogada espera que sua experiência sirva como um alerta para outras venezuelanas.

G1

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