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domingo, 3 de agosto de 2014

Pré-natal psicológico pode prevenir depressão pós-parto

Os números referentes à depressão pós-parto no Brasil são impressionantes
Vulnerabilidade socioeconômica e idealização da maternidade explicam incidência de 26% no Brasil, média da OMS é de 15%; doença não tem relação com rejeição ao bebê, diz especialista 

Os números referentes à depressão pós-parto no Brasil são impressionantes. Estudos recentes afirmam que a incidência é, na média, de 26%. Entre as mulheres com perfil sócio- econômico baixo e atendidas pelo Sistema Único de Saúde (SUS) este índice aumenta para 40%. A média da OMS no mundo é de 10% a 15%.

Entre as consequências decorrentes da depressão pós-parto estão os problemas no desenvolvimento do bebê, problemas na relação mãe e filho e pode, inclusive, levar ao suicídio da mãe. "É o transtorno de maior incidência subtratado no País", afirma a psicóloga Alessandra Arrais.

Entre os fatores de risco estão a vulnerabilidade socioeconômica, qualidade do relacionamento conjugal, falta de apoio familiar, intercorrências durante a gestação e a existência de episódios depressivos anteriores e durante a gravidez.

Diante disso, Alessandra decidiu promover alguns estudos de intervenção que propuseram oferecer pré-natal psicológico a esse grupo de risco. “Um fator que percebo, principalmente na classe média, é a questão da idealização da maternidade, que faz com que a mulher acredite que ser mãe é ‘padecer no paraíso’. O choque entre a idealização e a realidade leva à depressão. Tive uma paciente que chegou a dizer que a vontade dela era reclamar no Procon. Esta idealização precisa ser trabalhada”, diz.

Pré-natal psicológico
O programa, pioneiro em Brasília, tem contribuído para a tese de que a depressão pós-parto pode ser evitável. Ao todo já foram atendidas 119 mulheres pelo projeto. As gestantes participam de reuniões mensais em grupo, onde discutem a mudança de papéis, a relação com o marido, o corpo, amamentação e todo o aspecto psicológico envolvido durante a gestação.

Um recorte com dez mulheres, onde cinco participaram do chamado pré-natal psicológico e outras cinco acompanharam o curso de mães em um hospital público, mostrou que é possível prevenir a depressão pós-parto.

Entre o grupo que participou do pré-natal psicológico em uma clínica particular, todas tinham fator de risco, como por exemplo problema de relação conjugal, histórico de depressão e falta de apoio da família. Nesse grupo, ninguém desenvolveu a doença.
Já no grupo controle, com mulheres que apresentavam os mesmos fatores de risco, duas colaboradoras apresentaram a depressão pós-parto, o que representa 40%. 

“Acredito que não é preciso um pré-natal psicológico, mas que a questão psicológica seja tratada no pré-natal. No Brasil temos poucas ações neste sentido, enquanto os números de depressão pós-parto só crescem”, diz Alessandra.

É preciso falar sobre o medo
A nutricionista Lastenia Vicente, de 37 anos, participou do grupo de pré-natal psicológico durante a gestação da filha Elena, hoje com um ano e oito meses. Como ela já havia tido um quadro de depressão e tinha desmaiado durante um exame de sangue durante a gravidez, foi considerada paciente de alto risco. 

“Foi horrível, fiquei muito assustada. Sempre passei mal tirando sangue e achei que não fosse aguentar o parto normal. Fiquei muito preocupada e com medo”, disse.

Lastenia foi às oito reuniões do pré-natal psicológico. Nesse período, enfrentou as pressões do mito da maternidade, do parto perfeito e da mãe com conhecimento instintivo. Em grupo, ela discutiu as mudanças que estavam acontecendo na sua vida e também contou com o apoio do marido. “É tudo muito novo e é muito difícil lidar com as mudanças que ocorrem dentro de você”, disse.

Trabalhou seus medos e no fim da gestação de nove meses estava segura o suficiente para aceitar que, no caso dela, não havia problema em fazer uma cesariana. “No caso dela, tentamos trabalhar a questão do parto normal, mas o objetivo principal era fazer com que ela se sentisse segura”, explica Mariana Mourão, psicóloga e também autora do estudo.

Lastenia não se sentia preparada para o parto normal, durante a gestação tinha pensamentos de que iria morrer após o nascimento da filha. “Quando chegou a hora, fiz cesariana mesmo com a bolsa estourada. Claro que cada mulher é uma mulher. 

Passei muito tempo com pensamento de morte e a opção da cesariana pareceu a mais segura para o meu caso”, disse.

A pesquisadora Alessandra afirma que é justamente na classe média e entre as mulheres que desejam muito ter filhos ou que passam por um longo processo de reprodução assistida, que estão os casos mais graves de depressão pós-parto que já atendeu. “E a doença não tem relação alguma com rejeição ao bebê, como muitos dizem erroneamente, tem a ver com encarar a maternidade real”, afirma. 

É uma depressão como qualquer outra, com o agravante de ocorrer após o nascimento do bebê. “É justamente em um momento que a mulher não pode ficar ensimesmada porque tem a criança para cuidar. Ela reprime este sentimento e ninguém também entende que justo nesta hora ela está deprimida", acrescenta Alessandra.

Existem muitas teorias para a depressão: uma afirma que se trata de um problema químico que atua em neurotransmissores – serotonina, noradrenalina e dopamina. Outra acredita que a depressão é resultado de um desequilíbrio entre o lado direito e esquerdo do cérebro. Mas os dados da pesquisa realizada em Brasília mostram que a parte psicológica pode ser prevenida. “Tem a parte química, mas a questão psicológica, emocional pode ser prevenida”, diz Mariana.

Mariana ressalta que é preciso considerar o chamado baby blues, uma tristeza logo após o parto. “Existe uma tristeza depois do parto que é muito comum e passageira. Ela tem relação hormonal e é preciso que a mãe saiba disso para não se assustar. Sabendo disso ela inclusive evita um depressão pós parto.”

Atualmente, Lastenia está gravida pela segunda vez. Espera a chegada de Maria e de uma maternidade possível, segura e não idealizada.

iG

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