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domingo, 8 de setembro de 2013

Em busca dos segredos do 'Homem Elefante'

Pesquisadores britânicos tentam esclarecer que doença acometeu Joseph Merrick, 123 anos após sua morte
 
Queen Mary University
Mesmo depois de 123 anos de sua morte, curiosidade sobre a doença do 'Homem Elefante' continua viva

O "Homem Elefante", cujo nome verdadeiro era Joseph Merrick, foi objeto da curiosidade de muita gente, durante toda a sua vida na Inglaterra, inclusive de diversos médicos da era vitoriana, que fizeram vários estudos sobre sua anomalia.
 
A história de Merrick foi consagrada nos anos 1980 pelo diretor David Lynch, que levou às grandes telas o drama do britânico que tinha 90% do corpo deformado pelo que se acreditava ser uma neurofibromatose múltipla - doença degenerativa óssea que hoje em dia tem tratamento.             
                          
Exibido como um monstro em circos, Merrick chegou a ser visto como débil mental, já que tinha dificuldades para falar. O médico Frederick Treves foi quem mais se aproximou de Merrick para tentar entender sua doença.

Mas hoje, 123 anos depois da morte de Merrick, cientistas acreditam que seus ossos contém segredos sobre sua anomalia que podem beneficiar a ciência médica.

Merrick começou a desenvolver a doença ainda quando criança. Apesar de ter sido bastante examinado na época por vários médicos, a causa da má formação da sua cabeça, da curvatura acentuada de sua espinha dorsal, da pele cheia de saliências, do braço direito mais crescido que o esquerdo, nunca foi totalmente esclarecida pela medicina.

BBC
Anomalias de Merrick são consideradas as mais severas já vistas até hoje; face foi especialmente comprometida com crescimento ósseo exagerado

Dilema do esqueleto
Para efeito de comparação, a condição genética dos ossos do rei Ricardo III , encontrado este ano enterrado por centenas de anos debaixo de um estacionamento em Leicester, no norte da Inglaterra, é bem melhor do que os ossos de Merrick pelo fato de nunca terem sido alvejados com cloro.
 
As graves deformidades do Homem Elefante são facilmente notadas no esqueleto, mas restritas a apenas determinadas áreas do corpo. Seu crânio tem grandes saliências de ossos crescidos na fronte e no lado direito.
 
O braço direito e bem mais longo do que o esquerdo, que parece ser do tamanho normal. Seu fêmur direito (parte de cima da perna) é bem mais longo e grosso do que o esquerdo. Sua coluna também é extremamente curvada, deixando o corpo todo torto.
 
"Quando Merrick estava sendo formado na barriga de sua mãe, é bem provável que uma alteração genética tenha acontecido, não antes do espermatozoide e o óvulo terem se juntado - mas provavelmente num estágio em que existia um certo número de células, onde apenas algumas contribuíram para o desenvolvimento do problema", afirma Trembath.
 
Desafios
O esqueleto do Homem Elefante é mantido trancado em um pequeno museu do Royal London Hospital (Hospital Real de Londres), onde normalmente não está em exibição. Este é o mesmo hospital onde Merrick passou seus últimos anos como amigo e paciente do famoso médico da era vitoriana, Frederick Treves, local onde ele morreria aos 27 anos de idade em abril de 1890.
 
De acordo com Treves, Merrick morreu ao ter o pescoço deslocado enquanto dormia, por causa do grande peso de sua cabeça.
 
O time de geneticistas que tenta extrair o DNA é liderado pelo médico Michael Simpson, do King's College. Em seu laboratório, ele tem trabalhado em segmentos de ossos para tentar desenvolver novas técnicas para extrair informação genética a partir de material severamente danificado por embranquecimento a cloro.
 
Os geneticistas tiveram sucesso em obter o DNA, mas continuam trabalhando em métodos para limpar o DNA severamente danificado para obter uma sequência genética completa.
 
Este passo é importante para se identificar onde o código genético de Merrick sofreu alguma mutação. Para complicar a tarefa ainda mais, Simpsom acredita que os ossos também foram encerados (impermeabilizados com cera), o que também afeta o DNA.
 
Para completar essa tarefa, Simpson admite que "há alguns desafios".
 
"Com algumas otimizações, eu estou confiante que teremos sucesso. Nós temos uma grande chance de obter um bom sequenciamento do genético", diz Simpson.
 
A técnica envolve a perfuração de uma área para se obter uma pequena quantidade de pó do osso, tratamento com detergentes e enzimas para extrair proteína e assim remover o DNA.
 
Quando o trabalho começar no esqueleto de Merrick, a intenção é fazer comparações entre o DNA em áreas danificadas dos ossos com a de áreas normais. Duas áreas principais foram identificadas para perfuração e obtenção do pó do osso: a parte de dentro do crânio e a raiz de um dos dentes.
 
Resultados para a ciência
Além da curiosidade científica para descobrir a real condição médica do Homem Elefante, Trembath acredita que os resultados da pesquisa poderão ajudar a ciência médica moderna a entender melhor o processo de divisão celular.
 
"Este é um exemplo significativo de tecido hiperdesenvolvido", explica Trembath enquanto examina áreas crescidas de osso no crânio.
 
"O entendimento da regulagem do crescimento celular é um das coisas mais fundamentais que precisamos conhecer. Isto está por trás do desenvolvimento de tumores e precisamos entender melhor como os tumores se desenvolvem", explica.
 
Ele aponta que o próprio Merrick era engajado em ajudar os médicos vitorianos entender sua doença. Mais de um século depois, o trabalho ainda continua.
 
"Eu tenho a sensação de que ele (o Homem Elefante) é um parceiro sempre querendo nos ajudar a chegar lá. Ele representa um dos mais casos mais graves de hiper crescimento (ósseo) já vistos. Por isso, essa é uma oportunidade única para obtermos conhecimentos fundamentais sobre biologia humana, e Merrick sabia que ele continha essa informação".             

Fascínio com o 'homem elefante' 
- A história de Merrick está em livros, peças de teatro e em filme. A peça escrita por Bernard Pomerance, em 1977, com o título "O Homem Elefante", foi sucesso de montagem na Brodway, com David Bowie dentre os atores que fizeram o papel de Merrick.

- O ator John Hurt ganhou um Bafta (British Film Awards) por sua interpretação de Merrick no filme "O Homem Elefante", de David Lynnch, em 1980.

 - Michael Jackson teria tentado comprar os ossos de Merrick do Royal London Hospital em 1987.

Possíveis causas da anomalia de Merrick
-  Neurofibromatose do tipo 1: condição genética que afeta um em 3 mil nascidos e que causa o crescimento de tumores ao longo do sistema nervoso. Sintomas mais leves incluem marcas de cor marrom ou saliências na pele

- Síndrome de Proteus: condição rara que causa o hiper crescimento dos ossos, tecidos e órgãos, frequentemente acompanhado por tumores - o nome deriva do deus grego 'Proteus' que podia mudar de forma.

BBC Brasil/iG

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