Há o interesse de incluir o Brasil em parceria internacional que apoia a descoberta de novas drogas, com foco em malária, doença de Chagas e leishmaniose
Em um cenário de globalização e mudanças climáticas, as chamadas doenças tropicais negligenciadas estão deixando de ser um problema restrito a países pobres ou em desenvolvimento. À medida que os patógenos e seus vetores se adaptam e se expandem pelo globo, mais pessoas entram na zona de risco e mais urgente se torna a necessidade de encontrar novos tratamentos menos tóxicos e com maior eficácia.
O tema foi debatido por pesquisadores de diversos países nos dias 13 e 14 de novembro, na sede da FAPESP, durante o workshop “Frontiers in Science on Neglected Diseases”.
Organizado pela FAPESP, em parceria com a Royal Society of Chemistry (RSC), do Reino Unido, e as organizações Drugs for Neglected Diseases iniciative (DNDi) e Medicines for Malaria Venture (MMV), o evento teve como objetivo não apenas promover a troca de informações sobre pesquisas em andamento como também criar a base para uma futura colaboração voltada a acelerar o desenvolvimento de novos medicamentos.
De acordo com Alejandra Palermo, gerente de inovação da RSC, a entidade firmou há cerca de um ano um acordo com a DNDi e a MMV para apoiar a descoberta de novas drogas em um modelo open Science (acesso aberto), com foco principalmente em malária, doença de Chagas e leishmaniose. Há, segundo ela, o interesse de incluir o Brasil na parceria.
“Quando falamos em expandir nossa rede de colaboração, temos de considerar o Brasil, pois o país tem uma comunidade forte na área de Química e porque muitas das doenças sobre as quais estamos falando são endêmicas no país. A RSC pode oferecer acesso à nossa rede de colaboração e ferramentas e softwares que facilitam a troca de conhecimento. E os pesquisadores brasileiros poderão ter a oportunidade de trabalhar com a orientação e a parceria da DNDi e da MMV, que são organizações sem fins lucrativos cujo objetivo é desenvolver drogas que sejam acessíveis aos mais pobres”, disse Palermo.
Durante a abertura do evento, o diretor de Descobertas e Desenvolvimento Pré-clínico da DNDi, Robert Don, explicou que a organização é uma parceria público-privada criada há 11 anos e conta atualmente com uma rede de 130 parceiros em pesquisa e desenvolvimento em todo o mundo.
“Nossa sede fica em Genebra (Suíça), mas temos escritórios regionais em diversos locais. Fazemos parcerias com pesquisadores em nível local e internacional e os colocamos juntos para trabalhar no desenvolvimento de novos produtos para doenças negligenciadas”, disse Don.
Até o momento, a entidade tornou disponível dois novos tratamentos para malária, um para doença do sono (tripanossomíase africana), um para leishmaniose visceral, uma combinação de drogas contra leishmaniose visceral específica para a Ásia e um tratamento pediátrico com dose adaptada para doença de Chagas. Outros 12 compostos químicos estão em fase de desenvolvimento.
A DNDi também mantém um programa em colaboração com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) intitulado Lead Optimization Latin America Project (LOLA), voltado a triar e aprimorar compostos químicos principalmente contra Chagas e leishmaniose.
Paul Willis, diretor da MMV, disse que a organização, também com sede na Suíça, recebe doações de governos, empresas e fundações como Bill e Melinda Gates e Welcome Trust para operar pesquisas que podem ser feitas em parceria com a academia ou a indústria.
“Nossa missão é salvar vidas desenvolvendo novas drogas para tratar malária. Fazemos isso descobrindo compostos, desenvolvendo medicamentos e fazendo com que eles sejam acessíveis às pessoas necessitadas. Já colaboramos com mais de 300 parceiros de todo o mundo”, afirmou.
“Esta reunião é extremamente importante para lidar com o problema da malária. Acredito que, com a ciência existente no Brasil, o acesso aos parasitas, vontade política, apoio e financiamento, podemos, juntos, fazer uma grande contribuição no combate à malária”, afirmou Jeremy Burrows, chefe do Departamento de Descoberta de Drogas do MMV.
Internacionalização
Durante a abertura do encontro, o diretor científico da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz, afirmou que o evento está alinhado com a estratégia da Fundação de fomentar conexões entre pesquisadores de São Paulo e de outros lugares do mundo.
“Queremos aprender sobre as oportunidades nesse campo e em algum momento do futuro poderemos considerar ter um programa conjunto com as organizações que estão aqui para financiar pesquisas relacionadas a doenças negligenciadas”, disse.
Na avaliação de Walter Colli, coordenador adjunto da FAPESP para a área de Ciências da Vida e um dos organizadores do evento, os pesquisadores britânicos têm grande experiência no desenvolvimento de substâncias químicas que atacam parasitas, enquanto os grupos brasileiros conhecem bem seus mecanismos básicos de funcionamento.
“Os grupos do Brasil, nos quais eu me incluo, procuram estudar o funcionamento dos parasitas com a esperança de que, conhecendo seu metabolismo, possamos desenhar uma droga mais eficaz para combatê-lo. Mas nunca chegamos lá. Eles [grupos internacionais] estão chegando lá, então devemos absorver esse conhecimento”, disse Colli, que também é professor da Universidade de São Paulo (USP).
Em sua apresentação, o químico britânico Simon Campbell – membro da MMV e da RSC – destacou que o processo de desenvolvimento de novas drogas é extremamente multidisciplinar e defendeu a necessidade de concentrar especialistas de áreas como Química Sintética, Química Medicinal, Biologia, Medicina Translacional em um único local. Segundo ele, é preciso evitar a tentação de criar redes virtuais de colaboração, pois dessa forma o trabalho e o conhecimento ficam dispersos.
“Há grandes oportunidades para o Brasil na área de doenças negligenciadas. Há uma grande comunidade científica, há conhecimento sobre as doenças, sobre os pacientes e sobre os desafios. Existe financiamento no país, bons laboratórios. É preciso investir no desenvolvimento de Química Sintética e Medicinal para traduzir o conhecimento da Biologia em novas drogas. Acadêmicos que não têm experiência em desenvolvimento de drogas podem aprender por meio de parcerias com entidades como a MMV”, afirmou.
“No mundo de hoje, qualquer pessoa pode ser infectada com qualquer doença. Não estamos apenas tratando pacientes em uma região distante, mas também as pessoas expostas de nossa sociedade. Precisamos de drogas mais eficazes e, ainda mais importante, com menos efeitos colaterais. Porque, caso contrário, não há adesão ao tratamento”, disse.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as doenças negligenciadas afetam mais de 1 bilhão de pessoas no mundo, são importante causa de mortalidade e morbidade e representam 10,5% do fardo global das doenças. Das 17 doenças negligenciadas listadas pela OMS, 14 estão presentes no Brasil.
O tema foi debatido por pesquisadores de diversos países nos dias 13 e 14 de novembro, na sede da FAPESP, durante o workshop “Frontiers in Science on Neglected Diseases”.
Organizado pela FAPESP, em parceria com a Royal Society of Chemistry (RSC), do Reino Unido, e as organizações Drugs for Neglected Diseases iniciative (DNDi) e Medicines for Malaria Venture (MMV), o evento teve como objetivo não apenas promover a troca de informações sobre pesquisas em andamento como também criar a base para uma futura colaboração voltada a acelerar o desenvolvimento de novos medicamentos.
De acordo com Alejandra Palermo, gerente de inovação da RSC, a entidade firmou há cerca de um ano um acordo com a DNDi e a MMV para apoiar a descoberta de novas drogas em um modelo open Science (acesso aberto), com foco principalmente em malária, doença de Chagas e leishmaniose. Há, segundo ela, o interesse de incluir o Brasil na parceria.
“Quando falamos em expandir nossa rede de colaboração, temos de considerar o Brasil, pois o país tem uma comunidade forte na área de Química e porque muitas das doenças sobre as quais estamos falando são endêmicas no país. A RSC pode oferecer acesso à nossa rede de colaboração e ferramentas e softwares que facilitam a troca de conhecimento. E os pesquisadores brasileiros poderão ter a oportunidade de trabalhar com a orientação e a parceria da DNDi e da MMV, que são organizações sem fins lucrativos cujo objetivo é desenvolver drogas que sejam acessíveis aos mais pobres”, disse Palermo.
Durante a abertura do evento, o diretor de Descobertas e Desenvolvimento Pré-clínico da DNDi, Robert Don, explicou que a organização é uma parceria público-privada criada há 11 anos e conta atualmente com uma rede de 130 parceiros em pesquisa e desenvolvimento em todo o mundo.
“Nossa sede fica em Genebra (Suíça), mas temos escritórios regionais em diversos locais. Fazemos parcerias com pesquisadores em nível local e internacional e os colocamos juntos para trabalhar no desenvolvimento de novos produtos para doenças negligenciadas”, disse Don.
Até o momento, a entidade tornou disponível dois novos tratamentos para malária, um para doença do sono (tripanossomíase africana), um para leishmaniose visceral, uma combinação de drogas contra leishmaniose visceral específica para a Ásia e um tratamento pediátrico com dose adaptada para doença de Chagas. Outros 12 compostos químicos estão em fase de desenvolvimento.
A DNDi também mantém um programa em colaboração com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) intitulado Lead Optimization Latin America Project (LOLA), voltado a triar e aprimorar compostos químicos principalmente contra Chagas e leishmaniose.
Paul Willis, diretor da MMV, disse que a organização, também com sede na Suíça, recebe doações de governos, empresas e fundações como Bill e Melinda Gates e Welcome Trust para operar pesquisas que podem ser feitas em parceria com a academia ou a indústria.
“Nossa missão é salvar vidas desenvolvendo novas drogas para tratar malária. Fazemos isso descobrindo compostos, desenvolvendo medicamentos e fazendo com que eles sejam acessíveis às pessoas necessitadas. Já colaboramos com mais de 300 parceiros de todo o mundo”, afirmou.
“Esta reunião é extremamente importante para lidar com o problema da malária. Acredito que, com a ciência existente no Brasil, o acesso aos parasitas, vontade política, apoio e financiamento, podemos, juntos, fazer uma grande contribuição no combate à malária”, afirmou Jeremy Burrows, chefe do Departamento de Descoberta de Drogas do MMV.
Internacionalização
Durante a abertura do encontro, o diretor científico da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz, afirmou que o evento está alinhado com a estratégia da Fundação de fomentar conexões entre pesquisadores de São Paulo e de outros lugares do mundo.
“Queremos aprender sobre as oportunidades nesse campo e em algum momento do futuro poderemos considerar ter um programa conjunto com as organizações que estão aqui para financiar pesquisas relacionadas a doenças negligenciadas”, disse.
Na avaliação de Walter Colli, coordenador adjunto da FAPESP para a área de Ciências da Vida e um dos organizadores do evento, os pesquisadores britânicos têm grande experiência no desenvolvimento de substâncias químicas que atacam parasitas, enquanto os grupos brasileiros conhecem bem seus mecanismos básicos de funcionamento.
“Os grupos do Brasil, nos quais eu me incluo, procuram estudar o funcionamento dos parasitas com a esperança de que, conhecendo seu metabolismo, possamos desenhar uma droga mais eficaz para combatê-lo. Mas nunca chegamos lá. Eles [grupos internacionais] estão chegando lá, então devemos absorver esse conhecimento”, disse Colli, que também é professor da Universidade de São Paulo (USP).
Em sua apresentação, o químico britânico Simon Campbell – membro da MMV e da RSC – destacou que o processo de desenvolvimento de novas drogas é extremamente multidisciplinar e defendeu a necessidade de concentrar especialistas de áreas como Química Sintética, Química Medicinal, Biologia, Medicina Translacional em um único local. Segundo ele, é preciso evitar a tentação de criar redes virtuais de colaboração, pois dessa forma o trabalho e o conhecimento ficam dispersos.
“Há grandes oportunidades para o Brasil na área de doenças negligenciadas. Há uma grande comunidade científica, há conhecimento sobre as doenças, sobre os pacientes e sobre os desafios. Existe financiamento no país, bons laboratórios. É preciso investir no desenvolvimento de Química Sintética e Medicinal para traduzir o conhecimento da Biologia em novas drogas. Acadêmicos que não têm experiência em desenvolvimento de drogas podem aprender por meio de parcerias com entidades como a MMV”, afirmou.
“No mundo de hoje, qualquer pessoa pode ser infectada com qualquer doença. Não estamos apenas tratando pacientes em uma região distante, mas também as pessoas expostas de nossa sociedade. Precisamos de drogas mais eficazes e, ainda mais importante, com menos efeitos colaterais. Porque, caso contrário, não há adesão ao tratamento”, disse.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as doenças negligenciadas afetam mais de 1 bilhão de pessoas no mundo, são importante causa de mortalidade e morbidade e representam 10,5% do fardo global das doenças. Das 17 doenças negligenciadas listadas pela OMS, 14 estão presentes no Brasil.
Agência FAPESP / Saúde Web
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