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quinta-feira, 31 de março de 2011

Seus contratos podem ser vistos à luz do dia?

As relações jurídicas no mundo moderno estão cada vez mais complexas e diversificadas. Com os médicos e seus tomadores de serviços não poderia ser diferente. E, como em todas as relações humanas, esta deve ser regida pela boa-fé, mas nem sempre este princípio contratual está presente nas do médico com o tomador de serviços, em que se espera (espera-se muito) seja a legislação cumprida.

Esse “espera-se muito” não é sem razão. O judiciário está cheio de casos de médicos e tomadores de serviços com a melhor das intenções, mas, que, muitas vezes, não podem mostrar suas relações jurídicas assim, à luz do dia.

Antes de tudo, vamos deixar claro alguns tipos de contratação e suas principais características.

Podemos começar pela tradicional relação celetista, ou seja, a relação de emprego, disciplinada na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que comporta o médico como empregado e o tomador dos serviços como empregador.

Para tanto, é necessária a presença concomitante dos requisitos: pessoalidade (pessoa física), prestação de serviços não eventual, dependência (subordinação) e salário. Além das obrigações impostas na CLT ao empregador, há também legislação esparsa e convenção coletiva da categoria que consagram outros direitos ao empregado, por exemplo, depósito mensal do FGTS numa conta vinculada junto à Caixa Econômica Federal, data-base do aumento salarial e respectivo percentual.

A pessoalidade significa que o serviço só pode ser prestado pelo médico “x” contratado pelo empregador, ou seja, aquele não pode se fazer substituir por outro médico, ainda que da mesma especialidade. A prestação dos serviços tem que ser contínua, constante, ininterrupta, portanto, não eventual.

Já a dependência prevista na lei não é a profissional, vale dizer, não há e nem poderá haver interferência na autonomia do médico, mas sim a dependência e subordinação vinculadas ao ”modus operandi” da prestação de serviços, por exemplo, o médico tem que cumprir os horários e escalas determinados pelo empregador e registrar horários de entrada, saída e refeições. Não há liberdade para o médico estabelecer os seus horários de forma variável de acordo com a sua agenda e outros compromissos particulares e profissionais.

O salário é a contraprestação pecuniária paga pelo empregador ao médico empregado.

É muito comum haver a prestação de serviços médicos por intermédio de pessoa jurídica, ou seja, a empresa cujos sócios são médicos é contratada pela instituição/empresa ou plano de saúde. Este é um contrato regido pela legislação civil.

Aqui cabe uma divisão no que tange às particularidades do contrato, vez que a contratação da pessoa jurídica de médicos por planos de saúde, ou deles diretamente como pessoa física, tem normatização específica, sem prejuízo do Código Civil: Resolução Normativa 71/2004 - ANS.

Aliás, não podemos deixar de citar o movimento que as respeitáveis entidades da classe médica estão fazendo: AMB, CFM e FENAM, com vistas à paralisação no próximo dia 7 de abril para, dentre outras diretrizes, exigirem a regularização dos contratos entre operadoras e médicos, nos moldes da Resolução acima mencionada.

Há outra forma de prestação de serviços que se dá por intermédio de cooperativa, que é uma sociedade de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias e legislação específica: lei 5.764/71, na qual não se tem as amarras de uma relação de emprego e onde há a busca, pelos cooperados, de um objetivo comum, mas com independência na execução dos serviços.

Por fim, há o trabalhador autônomo, que presta serviços eventuais, assumindo integralmente os riscos, tendo total discricionariedade e organização na sua prestação de serviços.

Fraude X Boa-fé

Dadas as diferenciações, vamos aos problemas.

É importante frisar que, não obstante existir contrato regido pela legislação civil, nos casos em que há intermédio da pessoa jurídica de médicos, se a realidade fática levar à caracterização da relação de emprego, conforme os requisitos acima expostos poderá haver pelo Poder Judiciário, nos termos do art. 9º da CLT, a declaração de nulidade de tal instrumento contratual, vez que ele poderá ter existido apenas para fraudar direitos trabalhistas do médico, e o reconhecimento deste como empregado do tomador de serviços, tudo em respeito ao princípio da primazia da realidade.

Noutra linha de raciocínio, também não é medida de justiça e muito menos de ética, tenha o profissional médico se beneficiado da relação jurídica civil pelo tempo que lhe foi conveniente, na qual ele teve liberdade de estabelecimento de horários, de elaboração de escalas, de substituição por outro colega, sem subordinação jurídica e, de repente, entenda que a sua relação jurídica era empregatícia.

Deparamo-nos rotineiramente com as duas situações na Justiça do Trabalho. Numa verifica-se a fraude geralmente de fácil identificação, noutra, a total falta de boa-fé - para se usar um eufemismo.

Em qualquer forma de prestação de serviços, necessário, para segurança das partes, que haja o instrumento contratual (contrato escrito) que reflita a realidade pretendida e vivida por elas na consecução do seu objeto, bem como que as partes norteiem esta relação sempre com boa-fé, esta, agora, em seu significado literal.

postado por Verônica Cordeiro da Rocha Mesquita

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