Aplicativos, carreira, concursos, downloads, enfermagem, farmácia hospitalar, farmácia pública, história, humor, legislação, logística, medicina, novos medicamentos, novas tecnologias na área da saúde e muito mais!



terça-feira, 11 de março de 2014

LSD volta a ser experimentado clinicamente após mais de 40 anos

LSD volta a ser experimentado clinicamente após mais de 40 anos Ben Mills/The New York Times
Foto: Ben Mills / The New York Times
Segundo cientistas, terapia com alucinógeno reduziu ansiedade de pacientes com câncer terminal

Ele ficou sabendo sobre o teste clínico com a droga por meio de um amigo na Suíça e decidiu que valia a pena se oferecer como voluntário, mesmo que isso significasse longas e dolorosas jornadas ferroviárias de sua Áustria natal, além da possibilidade real de um desastre mental.

Ele não tinha muito tempo, afinal, e a Medicina tradicional nada fizera pra aliviar os sintomas da degeneração da coluna vertebral.

– Eu nunca havia tomado a droga antes, então o que eu sentia – bem, acho que a palavra correta para isso, é pavor – disse durante entrevista telefônica Peter (50), um assistente social austríaco. Ele pediu que o sobrenome fosse omitido para proteger sua identidade.

– Havia o medo de que tudo pudesse dar errado, que poderia ser uma viagem ruim.

Nesta terça-feira, o "Journal of Nervous and Mental Disease" vai publicar resultados online do primeiro teste clínico controlado com LSD em mais de 40 anos. Realizado no consultório de um psiquiatra suíço nos arredores de Berna, o estudo testou os efeitos da droga como um complemento para 12 pacientes de terapia em estado terminal, incluindo Peter.

A maioria dos pacientes tinha câncer terminal, e vários morreram dentro de um ano após o estudo, mas não antes de ter uma aventura mental que parece ter reduzido a tristeza existencial de seus últimos dias.

– A ansiedade deles foi reduzida e assim se manteve – disse o Dr. Peter Gasser, que realizou a terapia e fez um acompanhamento com os pacientes um ano após a conclusão do experimento.

A nova publicação marca a mais recente de uma série de pequenos passos de uma coalizão informal de pesquisadores e arrecadadores de recursos que trabalham para levar as alucinações de volta ao seio da psiquiatria convencional.

Antes de a pesquisa ser proibida nos Estados Unidos em 1966, os médicos testaram a eficácia do LSD em uma série de sintomas, incluindo a ansiedade do fim da vida. Porém, nos últimos anos, psiquiatras norte-americanos e do exterior – trabalhando em conjunto com órgãos reguladores públicos e conselhos éticos – testaram a terapia com auxílio do ecstasy para transtorno de estresse pós-traumático; e outros estudos clínicos com alucinógenos estão a caminho.

– A iniciativa é política e científica – disse Rick Doblin, diretor executivo da Associação Multidisciplinar para Estudos Psicodélicos, fundação que financiou muitos dos estudos. – Queremos tirar essas substâncias do crivo da contracultura e trazê-las de volta ao laboratório como parte de um renascimento psicodélico.

Antes de tomar LSD, os 12 pacientes do estudo suíço se encontraram com Gasser em seu consultório para duas ou mais sessões visando se conhecerem. O estudo clínico exigia dois cursos de terapia auxiliada por drogas, separados entre si por algumas semanas. Os efeitos da droga durariam até dez horas, depois das quais o paciente dormiria num sofá no consultório, atendido o tempo todo pelo terapeuta ou um assistente.

– Contei a eles que cada sessão seria aqui, em um ambiente seguro, e eu faço parte dele – disse Gasser. – Eu lhes disse que não podia garantir que não teriam aflições intensas, mas expliquei que elas passariam caso acontecessem.

E aconteceu assim mesmo – elas passaram de verdade, embora nem sempre com facilidade. Muitos choraram, a maioria se contorceu; um homem de 67 anos relatou ter encontrado o pai ausente, morto há muito tempo, em algum lugar do cosmos, dando sua aprovação.

Todos falaram durante períodos com Gasser, que atuou como âncora na tempestade e colega explorador, acompanhando as fontes dessas emoções. No jargão da profissão, a terapia foi focada no paciente, aberta e "integradora", no sentido de se concentrar em hábitos atuais de pensamento e em antigas cenas da infância.

– Eu tive o que se poderia chamar de experiência mística, creio eu, que durou algum tempo, e a maior parte foi composta de aflição pura com todas aquelas lembranças das quais eu havia me esquecido com sucesso durante décadas. Esses sentimentos dolorosos, remorsos, o medo da morte.

Eu me lembro de sentir muito frio durante um longo tempo. Eu estava tremendo, embora suasse. Era um frio mental, creio eu, uma lembrança da negligência.

Ele também fez algo com essas sensações, algo que quase nunca praticara antes.

O paciente falou sobre elas. – Foi uma surpresa. Eu não sabia que estava falando até o Dr. Gasser me fazer notar.

Depois de quase dois meses de terapia semanal, os oito participantes que receberam doses integrais de LSD melhoram em aproximadamente 20 por cento segundo a escala da medida padrão de ansiedade, e os quatro que ingeriram uma dose menor pioraram.

Terminado o estudo, esses pacientes tiveram permissão para "mudar de lado" e experimentar a dose completa. Os achados duraram um ano em quem sobreviveu.

O estudo clínico foi pequeno demais para ser conclusivo, garantiu Gasser, cujos coautores foram Doblin, Dominique Holstein, do Hospital Universitário de Zurique, e Rudolf Brenneisen, da Universidade de Berna. Entretanto, os pesquisadores encaram os resultados como um começo.

A droga não causou efeitos colaterais sérios, somente períodos de aflição temporária, considerados valiosos terapeuticamente. De modo geral, os participantes consideraram a terapia compensadora.

– É a prova do conceito. Ela prova que esse tipo de estudo clínico pode ser realizado com segurança, e que vale muito a pena ser feito – disse Doblin. 

Peter, o assistente social, concordou. 

– Admito que estou mais emotivo desde que o estudo terminou, e nem sempre alegre, mas acho que é melhor sentir coisas fortes – é melhor do que estar apenas vivo.

The New York Times / Zero Hora

Nenhum comentário:

Postar um comentário