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terça-feira, 29 de março de 2011

Metal pesado contamina mulheres durante estudo contra câncer

Por acidente, mulheres que participavam de um estudo com pacientes com câncer de mama receberam centenas de pequenas partículas do metal pesado tungstênio no tecido mamário e músculos peitorais. As partículas se originaram de um equipamento usado durante a cirurgia. Depois disso, o equipamento passou por um recall.

Ignora-se se o metal faz mal à saúde porque foi feita relativamente pouca pesquisa sobre seus efeitos a longo prazo no corpo. Mas ele é visto em mamografias, podendo dificultar sua avaliação, um efeito particularmente perturbador para mulheres que já tiveram câncer de mama e temem sua volta - as partículas parecem depósitos de cálcio, que podem indicar câncer.

Cerca de 30 mulheres foram afetadas, segundo o fabricante do equipamento que causou o problema, o Axxent FlexiShield Mini. As mulheres vivem um dilema.

Pelo menos uma delas, temendo que o tungstênio possa causar câncer ou outras doenças, está tentando decidir se vai se livrar das partículas removendo o seio e o tecido subjacente numa cirurgia radical e mutiladora.

Vinte e sete casos aconteceram no Hoag Memorial Hospital Presbyterian, em Newport Beach, Califórnia. Onze dessas mulheres fizeram mamografias e o tungstênio apareceu em todos os exames. Funcionários do hospital se recusaram a dar entrevistas, mas divulgaram uma nota reconhecendo que o problema aconteceu.

Duas outras mulheres foram tratadas durante estudo no Karmanos-Crittenton Cancer Center, em Rochester Hills, Michigan. A porta-voz do hospital disse que as duas pacientes foram informadas sobre o recall e o problema em potencial, mas não voltaram ao hospital.

O episódio lança dúvidas sobre a segurança das pessoas que participam de pesquisa médica e quanto à capacidade da Food and Drug Administration (FDA) proteger o público de equipamentos médicos defeituosos.

O Axxent FlexiShield Mini foi autorizado pela FDA em junho de 2009, num processo abreviado usado para equipamentos equivalentes a produtos já em uso. Esse processo, conhecido como 510, é mais rápido do que outros procedimentos empregados para aprovar um novo equipamento e, geralmente, não exige testes com humanos. O aparelho Axxent FlexiShield Mini foi alvo de um recall mês passado. Nem o fabricante nem a FDA souberam explicar o que deu errado.

Karen Riley, porta-voz da FDA, afirmou que estava apenas começando a revisar o equipamento e o recall. Até agora, disse ela, toxicologistas da FDA não encontraram provas de que o tungstênio seja tóxico ou de que as pacientes foram afetadas.

Riley contou que o processo 510 foi usado para evitar que se "reinventasse a roda" no caso de produtos essencialmente iguais a outros e que já haviam sido examinados pela agência.

As mulheres que foram expostas ao tungstênio estavam participando de um estudo sobre uma técnica de radiação que, para alguns médicos, seria um grande avanço no tratamento do câncer de mama. Em vez do habitual período de cinco a sete semanas de sessões de radiação diárias, o novo método aplica todo o tratamento de uma única vez enquanto a mulher ainda está na sala de cirurgia, depois de passar por uma lumpectomia, procedimento cirúrgico que remove da mama apenas a quantidade de tecido afetada e mais uma margem de tecido sadio.

Mas no estudo, o equipamento, que é colocado temporariamente dentro das incisões durante o tratamento com radiação, parecia estar com defeito, cravando tungstênio em seus seios. O Axxent FlexiShield Mini, disco de tungstênio e silicone que custa US$ 100, era usado para proteger da radiação o tecido saudável.

A primeira paciente a participar do estudo no Hoag afirmou que o evento acabou com sua fé na vigilância da FDA, no hospital e em seu médico, que a convenceu de forma entusiasmada a participar, enfatizando como seria conveniente acabar o tratamento com radiação antes de acordar da cirurgia.

"Eu trabalho, então a proposta era atraente", contou a mulher, uma psicóloga de 57 anos que é dona de uma clínica movimentada e que alegou motivos particulares para não ter o nome divulgado.

O propósito do estudo não era testar o novo tratamento radiativo em si, mas determinar se o diagnóstico por imagem poderia apontar corretamente que mulheres seriam candidatas a ele. O fabricante do equipamento não pagou pelo estudo.

Nunca passou pela cabeça da primeira paciente que o equipamento poderia ser defeituoso, a psicóloga afirmou, porque sabia que ele havia sido aprovado pela FDA. Ela também confiava nas garantias do médico e do hospital de que o estudo era seguro. "Eu tinha a ilusão, como a maioria das pessoas, de que a FDA não deixaria que isso fosse acontecer. Eu me sinto um rato de laboratório".

O fabricante, Xoft, comprado pela iCad em dezembro, pretendia que o escudo fosse usado com seu aparelho portátil de radiação, o Axxent Electronic Brachytherapy System. O presidente da iCad, Ken Ferry, disse que a empresa comprou a Xoft porque a ideia de fazer o tratamento radioativo durante a cirurgia parecia promissor. Um estudo publicado no ano passado mostrou bons resultados com uma máquina de radiação diferente que usava a mesma técnica.

Ferry contou ter acreditado que o procedimento poderia vir a ser usado para tratar metade das 270 mil mulheres por ano nos Estados Unidos que desenvolvem câncer de mama. "Achamos que o crescimento do procedimento será impressionante nos próximos três anos. Foi isso que nos levou a comprar a empresa".

Só que a iCad também adquiriu o problema com o tungstênio, que veio à tona somente uma ou duas semanas depois que o acordo foi fechado. "Azar, se quisermos usar essa palavra, foi o que a iCad sentiu quando aconteceu", disse Ferry. Contudo, "isso não diminui nosso entusiasmo".

A psicóloga, que está processando o Hoag Hospital e o fabricante, ficou sabendo que algo estava errado em dezembro, ao fazer mamografias de rotina seis meses depois da lumpectomia e da radiação. A imagem mostrava centenas de marquinhas espalhadas pelo peito e também no músculo da parte posterior da parece torácica. Os médicos não sabiam o que eram as marcas, mas o radiologista disse que algumas lembravam as calcificações que podem indicar câncer. "Fiquei apavorada. Parecia que estava nevando dentro do meu peito", declarou.

A biópsia apontou tungstênio. "Procurei meu oncologista. Ele ficou transtornado e disse: 'É preciso tirar isso. É tóxico. Você não pode deixá-lo no seu organismo'". O oncologista insistiu em fazer uma mastectomia e recomendou um cirurgião, mas este lhe disse que, para tirar o tungstênio, seria necessário remover a mama inteira e uma parte dos músculos peitorais.

"Eu ficaria com um afundamento no peito. Ele falou que não queria fazer nada antes de ter mais informações porque o resultado seria mutilador. Isso me deixou mal fisicamente. Quase me acostumei com a ideia de fazer uma mastectomia, mas não em ficar mutilada." A iCad se ofereceu para pagar os exames toxicológicos das mulheres afetadas, além de exames de sangue e urina para medir o tungstênio. A empresa também afirmou que iria avaliar o pagamento das mastectomias e encomendou um relatório para examinar os dados científicos sobre o tungstênio. O relatório concluiu que a toxicidade parecia baixa, mas que não havia estudos de longo prazo.

Steven Markowitz, médico do Queens College, Nova York, especializado em medicina ocupacional e ambiental, disse haver poucas informações sobre os efeitos do tungstênio puro, como o usado nos escudos. A maioria das pesquisas, segundo ele, tem a ver com exposição a compostos de tungstênio no trabalho. "Em função da forma heterodoxa de exposição, fica difícil falar muito sobre as prováveis consequências", explicou.

A primeira paciente no estudo do Hoag Hospital afirmou ter consultado uma toxicologista que afirmou que pouco se sabe sobre os efeitos do tungstênio a longo prazo na saúde, mas que ela, a toxicologista, provavelmente não o deixaria no corpo. A paciente se disse inclinada à cirurgia, mas acrescentou: "adoraria saber que existem provas de que não há nada com o que se preocupar".

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