São Paulo - Pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) e da
Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) observaram uma maior variabilidade
genética do vírus HIV em crianças e adolescentes do que a apontada em estudos
anteriores feitos com adultos.
De acordo com os pesquisadores, isso sugere que o
perfil da epidemia está mudando no Brasil, o que pode ter implicações tanto na
produção de diagnósticos como na definição de terapias e no desenvolvimento de
vacinas. Foram colhidas amostras sanguíneas de 51 soropositivos nascidos entre
1992 e 2009 na capital paulista.
Segundo o coordenador do projeto, professor Sabri Saeed Mohamed Al Sanabani,
do Instituto de Medicina Tropical da USP, existem dois tipos (1 e 2) de vírus
causadores da aids. O tipo 2 é praticamente restrito ao Continente Africano. O
tipo 1, que prevalece no restante do mundo, se divide em vários grupos, sendo os
principais M, N, O e P. O grupo M, que causa a grande epidemia conhecida
atualmente, por sua vez, possui subtipos. "Há ainda as formas recombinantes, que
são a mistura genética de subtipos de vírus", explicou à Agência
Brasil.
Estudo publicado em 2011 pelo mesmo grupo de cientistas mostra que o subtipo
B é o mais frequente no país. Isso foi atestado com a análise de 113 amostras
sanguíneas de homens soropositivos com média de idade de 31 anos e também por
meio da análise do DNA viral. Mais de 80% dos pacientes estavam infectados com
esse subtipo do vírus. A pesquisa mais recente feita com a faixa etária de 4 a
20 anos, por outro lado, apontou uma prevalência de apenas 52,4%.
As crianças e os adolescentes que participaram do estudo, coordenado pela
professora Regina Succi, eram acompanhados pelo Centro de Atendimento da
Disciplina de Infectologia Pediátrica da Unifesp. Em todos os casos, a
transmissão ocorreu durante a gestação, parto ou amamentação. Quase 40% deles
estavam infectados com o subtipo BF1 Mosaico, uma mistura genética dos subtipos
B e F1. Outros 9,5% apresentaram o subtipo F1.
Al Sanabani destaca que esse resultado não era esperado inicialmente. "A
gente pensava que fosse encontrar um tipo genético igual ao dos adultos. Fomos
surpreendidos com essa alta diversidade", declarou. O pesquisador explica que
essa variabilidade genética pode ser justificada pelo fato de a maior parte das
mães serem de um grupo de risco, com muitos parceiros sexuais e histórico de uso
de drogas. "Esses fenômenos de recombinação que, no caso das crianças, chega a
40%, é resultado dessa mistura de vírus. As mães foram infectadas,
provavelmente, por mais de um vírus", declarou.
O professor explica que, quanto maior a diversidade do HIV, mais difícil será
desenvolver uma única vacina para o combate à doença. Há consequências também na
definição de uma terapia, já que a mutação genética pode fazer com que o vírus
adquira resistência ao tratamento. Além disso, pode haver falhas no diagnóstico
da doença, pois a mudança nos códigos genéticos pode levar à não identificação
do vírus. "A gente precisa saber o que está circulando no nosso ambiente. Se o
HIV tem capacidade de mudar ou recombinar, ele pode, inclusive, constituir outro
tipo de aids", alertou.
Embora a mutação genética faça parte do ciclo de vida do vírus, um tratamento
eficiente diminui bastante a carga viral no paciente e reduz o risco de
transmissão. "Estamos baseando os nossos casos em crianças e adolescentes de São
Paulo e sabemos que aqui há tratamento de qualidade disponível. É preciso fazer
isso chegar dessa forma a outras regiões, para não agravar o problema",
defendeu.
O coordenador informou que um novo estudo está em curso para caracterizar os
tipos de HIV circulantes em quatro estados, Pernambuco, Rio de Janeiro, São
Paulo e Minas Gerais. "Por meio do sequenciamento de alta escala do genoma do
HIV, vamos enxergar o vírus de ponta a ponta. É uma forma de saber quem está
recombinando e quem está puro", declarou.
Agência Brasil
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