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segunda-feira, 30 de maio de 2011

Produtos falsificados prejudicam o bolso e a saúde do consumidor

Reportagem do Fantástico revela esquema de pirataria em camelôs e grandes lojas do Brasil, inclusive com venda de medicamentos falsificados.


A equipe do Fantástico percorreu todo caminho da pirataria: da fábrica até as prateleiras dos mercados populares. São R$ 40 bilhões que o Brasil perde todos os anos por causa da indústria ilegal. Um teste em laboratório comprova que a falsificação também prejudica a sua saúde do consumidor.

Nossos repórteres mostram quais são os caminhos que importadoras usam burlar a fiscalização e trazer para o país produtos ilegais por preços abaixo do mercado. Para mostrar imagens inéditas dos piratas em ação, entramos em uma fábrica de relógios clandestina.

Em uma oficina em Cidade do Leste, no Paraguai, sete homens produzem 30 mil relógios por mês. As marcas? As mais famosas do mundo.

“Aqui nós recebemos pedidos de brasileiros que vem de São Paulo pegar. Nós fazemos a marca que ele quer”, diz um dos homens da fábrica.

Todas as peças são importadas da China e param nos portos brasileiros. Depois, são transportadas de caminhão até o Paraguai. Por acordo assinado entre os dois países, o Brasil não pode inspecionar a carga.

”As peças vem separadas, tanto o mostrador, os ponteiros, as coroas, as caixas e as pulseiras, vem tudo”, explica o dono da fábrica.

O processo é artesanal. Feito por pessoas especializadas no ofício, com precisão. É possível observar como o momento de colar a marca é delicado.

O dono da fábrica, que prefere não ser identificado, recebe um dólar por relógio montado, só pela mão de obra. Ao fim do mês, arrecada o equivalente a R$ 54 mil.

“Por que a montagem é feita no Paraguai e não no Brasil?”, pergunta o repórter.

“Eu acho que é porque aqui é mais barato, a mão-de-obra é mais barata e a fiscalização também é menor”, responde o dono da fábrica.

Depois de embalados, os relógios são passados para os chamados atravessadores, que cruzam a fronteira.

“Tem que passar pela ponte, tem uns que passam pelo rio”, explica um deles.
A polícia e a Receita Federal desenharam a rota dos produtos piratas. De Foz do Iguaçu a mercadoria é levada para São Paulo, de onde é distribuída para todo Brasil.

Em São Paulo, os repórteres encontram relógios semelhantes aos produzidos no Paraguai. Só no ano passado, a Receita Federal apreendeu R$ 46 milhões em relógios contrabandeados.

Outro produto popular no Centro de São Paulo é a escova de dentes. À olho nu, elas são iguais às originais, até na embalagem. Os piratas têm uma técnica para conquistar o mercado: chegam a misturar escovas falsas às verdadeiras.

“O povo das farmácias fazem assim: eles compram um pouco de uma e um pouco da outra, aí mistura e vai embora. O povo não desconfia, é igualzinha”, conta comerciante.

Um revendedor explica como a fraude funciona. O segredo está no detalhe da falsificação: “o importante, hoje em dia, de você verder a Oral B é ter o código de barras. Se tem o código de barras, já era”.

Assim como os relógios, há escovas chinesas que chegam ao Brasil via Paraguai. Na Cidade do Leste, nossa equipe encontra uma fornecedora. Ela confirma que o produto é falso.

“Ela é primeira linha, ela é réplica perfeita, vem igual a do Brasil. Mas original não tem não. São todas chinesas”, afirma a vendedora.

Levamos as escovas para um teste no laboratório da Associação Brasileira de Odontologia e a conclusão é que elas são um risco para a saúde. As cerdas têm um péssimo acabamento.

“São pequenas lâminas, que você vai perceber, que vão entrar em contato e corta a gengiva.”, explica Heitor Panzeri, da Associação Brasileira de Odontologia.

Além da réplica da marca original, a vendedora também apresenta outra opção: “tem uma que é parecida com Oral B, tem o mesmo desenho. Só muda o nome”, diz revendedora.

Existe a cópia industrial, uma forma mais sofisticada de burlar a fiscalização e enganar o consumidor.

“É a sofisticação da falsificação. Não está falsificando a marca, mas falsifica o produto. O desenho industrial do produto está sendo falsificado”, esclarece Edson Luiz Vismona, do Fórum nacional Contra a Pirataria.

Seu Chadi, o barão das escovas de dentes Juliana. Dono da maior distribuidora da Cidade do Leste. Ele diz que seu produto é feito na fábrica da Colgate e da Oral B, na China.

As escovas são cópias descaradas dos modelos das principais marcas do mercado brasileiro. Chadi tenta convencer os repórteres que o produto dele é melhor do que qualquer réplica.

De acordo com a investigação de um escritório de inteligência de mercado, que defende as marcas que criaram os modelos originais, Chadi movimenta US$ 6 milhões por mês, despejando no Brasil dois milhões de escovas.

Em São Paulo, a escova Juliana é um sucesso. Juliana, que nunca foi certificada pela Associação Brasileira de Odontologia, também foi reprovada no teste da associação brasileira de odontologia.

A Associação Brasileira de Farmácias e Drogarias diz que desconhece a comercialização de escovas piratas. Na embalagem da Juliana, a falsificação é tão grosseira que até a língua portuguesa é desrespeitada.

Um perigo ainda maior para a saúde são os remédios falsificados.
“Ninguém compra um remédio sabendo que é falso. Aí pode ter implicações, com certeza terá, na saúde das pessoas”, alerta Heitor Panzeri.


Na Cidade do Leste, os repórteres do Fantástico encontram remédios para disfunção erétil. A vendedora nega que sejam falsificados. Mas a autoridade fiscal assegura que o Paraguai não fabrica esse tipo de medicamento.

“Com certeza, 100% dos produtos para impotência são de origem da China. O Paraguai não tem os elementos e nem a indústria para finalizar esses produtos”, informa Julio Garay, da Associação Brasileira de Combate à falsificação.

O remédio Pramil que a vendedora oferece não é legalizado no Brasil. Mas é encontrado facilmete no Rio, em São Paulo e em outras capitais.

A vendedora ainda facilita a entrega: “Pramil é o que mais se leva. Por atacado é US$ 2,90. O senhor tem MSN?”, pergunta a vendedora novamente.

Acompanhamos uma operação da Polícia Rodoviária Federal em Foz do Iguaçu. Em um dos primeiros ônibus inspecionados, os agentes encontram medicamentos para impotência sexual.

“Já tivemos apreensões da ordem de 140, 150 mil comprimidos desse tipo. Ocorre muito isso, passageiros de ônibus, de automóveis levando pequenas quantidades, mil comprimidos, isso é constante”, diz Marcos Pierre, inspetor da Polícia Rodoviária Federal.

Contrabandear remédios é crime hediondo, o mesmo que tráfico de drogas. A pena é dez a 15 anos de cadeia.

Levamos os medicamentos para o laboratório de farmacologia da Unicamp. Os pesquisadores comprovaram que eles até têm o mesmo princípio ativo dos originais, mas isso não garante que façam efeito.


“O fato de ter a mesma quantidade de princípio ativo no comprimido não implica que ele seja absorvido”, diz Gilberto de Nucci, professor de farmacologia da Unicamp.
Geralmente os remédios falsificados são encontrados fora das caixas.

“É proibida a venda do chamado Blister. Não vai encontrar esse produto em uma venda regular, legal dessa forma. Só vai encontrar em caixas”, alerta Heitor Panzeri.

O presidente do Fórum Nacional Contra a Pirataria e Ilegalidade dá uma dica: só compre remédios com embalagem lacrada e que possuam na lateral a chamada tinta reativa.

“Todos os medicamentos tem que ter essa tinta reativa, você passando a moeda você vai encontrar a marca do fabricante do medicamento com a palavra qualidade”, diz ele.
Durante a blitz da Polícia Rodoviária Federal, também foram apreendidas peças para celulares. Desmontar o produto é uma técnica usada pelos contrabandistas. É uma maneira de despistar a fiscalização e sonegar impostos.

Para entender como funciona essa fraude, os repórteres do Fantástico se passaram por comerciantes interessados em revender um videogame trazido da China. Eles marcaram um encontro com a representante do Grupo Baska, uma das maiores importadoras brasileiras.

A representante consulta a tabela de importação e concluiu que para importar o jogo eletrônico, a Receita Federal cobraria 20% de taxa de importação e 40% de impostos sobre produtos industrializados - o IPI - sobre o preço do produto. Ela então propõe uma alternativa para reduzir os tributos.

“Tem clientes que desmontam a peça. Então a classificação fiscal fica outra. Enquanto você recebe 40% de IPI desmontado vai ser só 15% ou 10%, o que é uma redução bem grande”, diz a representante.

“Também não é possível. Seguindo esse mesmo acordo internacional que o Brasil é signatário o produto vindo montado ou por montar, completo ou incompleto, inacabado ou não ele tem a mesma classificação fiscal”.

A representante ainda sugere outra forma de importar o jogo com impostos reduzidos: mudar a descrição do produto.

“A gente pode encontrar uma outra classificação fiscal para o video game e nesta calssificação vão estar os impostos menores. Por exemplo: eu tenho um cliente que vai começar a vender em Santa Catarina uma bíblia eletrônica. Então eles importam lá da China um mp5 e a gente faz um estudo de qual poderia ser a classificação fiscal para aquilo. Até porque tem GPS e não sei mais o que junto. O imposto de importação dele ficou zero”, conta a representante.

Ou seja, ficou zero, porque a empresa alegou para a Receita Federal que estava imporatando bíblias. E bíblias são isentas de imposto no Brasil. O repórteres qusetionam o esquema, mas a representante da importadora insiste que é seguro.

“Não, não. Porque é como eu estou te falando: essa pesquisa que a gente faz não é nada ilegal. Meu diretor vai achar uma classificação que caiba o videogame, não é algo do tipo: ‘vou botar o videogame como se fosse televisão’. Não é isso. É porque como existem muitos itens e coisas técnicas, existe um item ali que três classificação fiscais’’, explica a funcionária.

Mas a Receita Federal diz que isso é uma fraude. Cada produto só se enquadra em uma classificação fiscal.

Durante a conversa, a representante admite mais uma iligalidade. Ela diz que pode importar produtos piratas. No caso, o vídeo game chinês a ser encomendado é uma cópia fajuta de um outro muito popular no Brasil.

“Você tributar um produto pirata é o mesmo que tributar qualquer tipo de droga que ingressa no país”, alerta Márcio Gonçalves, especialista e propriedade intelectual.
“Há um claro desvio de conduta, neste comércio, e que nós temos que alertar as autoridades. Porque, além da evazão fiscal, são produtos que podem afetar a saúde e a segurança dos consumidores”, esclarece Heitor.

O presidente do grupo Baska, Luiz Ramos, diz que não orienta os funcionários da empresa a gir dessa forma: “ essa pessoa falou sem qualquer autorização da empresam sem qualquer conhecimento, seuqre, da empresa. Eu diria que ninguém tem conhecimento desse fato”.

No mundo, a pirataria movimenta cerca de US$ 600 bilhões por ano. Quase o dobro do dinheiro que circula com a venda de drogas. No Brasil, o prejuízo à economia nacional é estimado em R$ 40 bilhões por ano. E dois milhões de posto de trabalho deixam de existir.

E se você ainda tem dúvida se vale a pena comprar produtos piratas, veja esse diálogo:
Um vendedor transforma uma furadeira sem marca em uma das líderes de mercado.
“É original, mas não da Bosch. A máquina é original, qualidade boa. Ela é furadeira e parafusadeira”, diz o vendedor. “Eu tenho o selinho aqui, dá pra colocar o selinho nele”, continua ele. “Você pode levar e colocar lá. Vem tudo branco e é só colocar nela aí", conclui ele.

assista o documentário:

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