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sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Imposição do plano em reutilizar medicação coletivamente é ilegal

Segundo presidente da Federação de Hospitais do Estado de Santa Catarina algumas operadoras buscam uma interpretação, no mínimo, estranha da RN 241

A Resolução Normativa no. 241 de 3 de dezembro de 2010 editada pela Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Saúde Suplementar, conforme artigo primeiro, estabelece que as operadoras de planos de assistência à saúde deverão ajustar os instrumentos jurídicos firmados com os prestadores de serviços de saúde, que apresentem como parte integrante dos seus serviços de atenção à saúde a utilização de medicamentos de usos restritos a hospitais e clínicas.

Apesar de esclarecedora, verificamos que algumas operadoras de planos de saúde ainda buscam uma interpretação, no mínimo, estranha desta resolução normativa.

Constatamos que foi apresentada para alguns hospitais uma lista de medicamentos que deveria servir de base para uso e remuneração, estabelecida de forma unilateral e em profundo desrespeito às condições básicas adotadas no relacionamento comercial entre as partes. Inclui também o uso fracionado de medicamentos.

Inicialmente, é importante esclarecer sobre a previsão constitucional do direito social à saúde. A Carta Magna prevê o direito à saúde, dentre um dos direitos sociais elencados no artigo 6º, sendo esse inerente à plena realização digna do ser humano, supedâneo específico também dos artigos 196, 197 e 199.

A tutela dos direitos fundamentais, dentre eles à saúde plena, integral, digna, ampla, são garantias evolutivas inerente ao desenvolvimento completo do ser humano em sociedade.

Nesse contexto, a força normativa da Constituição e a eficácia horizontal dos direitos humanos ultrapassaram a seara de direito público, consolidando seus fundamentos também nas relações entre particulares.

Diante da imposição de prática deveras duvidosas ao corpo médico dos hospitais, não é demais destacar também os ditames a serem observados no Código de Ética Médica, são eles:


Capítulo I

PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS

III – Para exercer a Medicina com honra e dignidade, o médico necessita ter boas condições de trabalho e ser remunerado de forma justa.

VIII – O médico não pode, em nenhuma circunstância ou sob nenhum pretexto, renunciar à sua liberdade profissional, nem permitir quaisquer restrições ou imposições que possam prejudicar a eficiência e a correção de seu trabalho.

O Código de Ética Médica é cristalino ao afiançar que a liberdade médica na execução do trabalho é irrenunciável. Compete ao médico, e somente a ele, examinar o paciente, proceder ao diagnóstico e prescrever a medicação ou terapia que entender melhor ao restabelecimento daquele.

Os hospitais primam pela plena liberdade de clínica médica e não se coaduna com qualquer tipo de imposição de terceiros ao livre exercício da medicina.

X – O trabalho do médico não pode ser explorado por terceiros com objetivos de lucro, finalidade política ou religiosa.

XIX – O médico se responsabilizará, em caráter pessoal e nunca presumido, pelos seus atos profissionais, resultantes de relação particular de confiança e executados com diligência, competência e prudência.


Capítulo III

RESPONSABILIDADE PROFISSIONAL

Art. 20. Permitir que interesses pecuniários, políticos, religiosos ou de quaisquer outras ordens, do seu empregador ou superior hierárquico ou do financiador público ou privado da assistência à saúde interfiram na escolha dos melhores meios de prevenção, diagnóstico ou tratamento disponíveis e cientificamente reconhecidos no interesse da saúde do paciente ou da sociedade.

Capítulo V

RELAÇÃO COM PACIENTES E FAMILIARES

É vedado ao médico:

Art. 32. Deixar de usar todos os meios disponíveis de diagnóstico e tratamento, cientificamente reconhecidos e a seu alcance, em favor do paciente.


É indubitável que a imposição de lista fechada de medicamentos e reutilização de medicações em mais de um paciente pode resultar em dano e risco de agravamento à saúde do enfermo.

Percebe-se pela leitura das resoluções do Conselho Federal de Medicina e pelos artigos correlacionados do Código de Ética Médica, a eleição da liberdade no exercício da medicina como valor fundamental. O médico, na busca irrestrita da eficiência no diagnóstico e tratamento do paciente não pode ser influenciado por interesses econômicos e deve agir sem qualquer vício de consentimento.

A imposição de lista fechada de medicamentos e a reutilização de medicação, além de se constituírem práticas danosas para os hospitais, são atos de desrespeito ao direito do médico de prescrever qual a medicação adequada, conforme sua decisão e em benefício dos pacientes.

Compelir o médico a prescrever somente os medicamentos previstos em listas determinadas pelas operadoras de planos de saúde e impor reutilização de medicação são infrações sérias que devem ser levadas ao Conselho Regional de Medicina e até ao Conselho Federal de Medicina, com vista a denunciar tais condutas e registrar em ato formal, os riscos aos pacientes.

A remuneração dos medicamentos de uso restrito a hospitais e clínicas deve observar o disposto na Resolução Normativa nº 241, de 03 de dezembro de 2010.

Assim, deve ser resultado da negociação entre as partes, espelho da realidade de mercado, que utiliza largamente o BRASÍNDICE como orientador na negociação da referida taxa administrativa. A imposição de outra metodologia, como a indicação dos medicamentos pelo SAL resulta na menor remuneração dos medicamentos do mercado, o que põe em dúvida a qualidade dos produtos, e até eventuais danos aos pacientes.

Ainda como alternativa, a remuneração dos medicamentos pode ser efetuada tendo como referência o Preço Fábrica (PF), registrado na Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA, acrescido da remuneração pelos serviços descritos no Inciso II, do art. 1º, da Resolução Normativa nº 241 da ANS. Convém exortar que a forma de remuneração desses serviços deverá ser acordada previamente entre as operadoras de planos de saúde e os prestadores de serviços de saúde.

A remuneração dos medicamentos também pode ser efetuada tendo como referência uma Lista de Preços, negociada entre as partes, na forma de uma padronização de medicamentos com a participação ativa do Corpo Médico, onde o valor final contemple a remuneração dos custos dos medicamentos e a remuneração pelos serviços descritos no Inciso II, do art. 1º, da Resolução Normativa nº 241 da ANS.

Outrossim, a negociação pode se pautar apenas nos medicamentos de uso restritos a hospitais e clínicas, não sendo objeto necessário de negociação com a operadora de saúde para os demais medicamentos com margem Preço Máximo ao Consumidor – PMC.

No que tange ao direito econômico, urge sinalizar que algumas operadoras de planos de saúde, através de sua força e pela imposição de cláusulas desproporcionais, gera uma situação de desequilíbrio na relação econômica, sendo a parte prejudicada detentora do direito de questionar em juízo e pleitear a revisão do contrato, por se tratar de ato danoso a sua sobrevivência financeira e em desarmonia com as boas práticas das relações comerciais.

Ademais, o uso exclusivo dos medicamentos inseridos na tabela criada pela operadora de plano de saúde, com foco no menor custo possível, restringe a liberdade clínica do médico, que se vê compelido a apenas receitar aqueles medicamentos previstos na tabela.

Nessa linha de intelecção, também importa registrar a opção exercida por algumas operadoras de planos de saúde para que os hospitais fracionem os medicamentos a serem ministrados nos seus associados atendidos. A esse respeito, destaca-se a Resolução da Diretoria Colegiada – RDC n° 80, de 11 de maio de 2006 – ANVISA:

Art. 34. As restrições desta resolução não se aplicam:

I – aos estabelecimentos de atendimento privativo de unidade hospitalar ou de qualquer outra equivalente de assistência médica, desde que os medicamentos fracionados se destinem à elaboração de doses unitárias para uso exclusivo de pacientes internados ou em atendimento de urgência ou emergência

Art. 35. O descumprimento das disposições contidas nesta resolução constitui infração sanitária, nos termos da Lei n.º 6.437, de 20 de agosto de 1977, sem prejuízo da responsabilidade civil, administrativa e penal cabíveis.

Pela leitura da Resolução, o fracionamento de medicamentos é destinado à elaboração de doses unitárias, ou seja, de uso individual, o que não se confunde com a reutilização da mesma medicação em mais de um paciente. Essa última prática é totalmente proibida pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, pelo alto risco de contaminação. Compete ao hospital obter provas, preferencialmente escritas, da imposição da operadora de plano de saúde em reutilizar medicação coletivamente, e notificá-la junto à ANVISA, sob pena de co-responsabilidade.

Portanto, cabe às federações e associações que congregam as empresas prestadoras de serviços de saúde orientar adequadamente os seus associados para que não caiam em armadilhas impostas por algumas operadoras de planos de saúde, cuja única finalidade é conquistar o lucro ao menor custo possível, onde o grande perdedor é o usuário, que em nome do menor custo pode ser submetido a práticas inseguras e a condições de riscos à sua saúde e até à sua vida.


*Newton Quadros é administrador de empresas e diretor da Federação de Hospitais do Estado de Santa Catarina e da Associação de Hospitais do Estado de Santa Catarina.

Fonte SaudeWeb

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