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Os próprios profissionais da área de saúde admitem: a rede de suprimentos ainda não é tratada com a relevância merecida dentro dos debates relacionados à vida hospitalar. Porém, como foi possível observar durante workshop dedicado ao assunto nesta quarta-feira (27/03), em São Paulo, é também consenso que a relação entre as partes envolvidas no tema urge por mais atenção, e demanda, para já, ações conjuntas que possam melhorar o fluxo nesta cadeia – da produção do insumo à chegada do produto no cliente final.
Sede do evento, o Hospital das Clínicas tratou de mostrar a importância do assunto no complexo composto por 13 institutos, que representam 11% do orçamento da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo. “Os suprimentos correspondem a R$ 400 milhões do nosso orçamento anual [o total do HC está na casa dos R$2,5 bi], são cerca de 10 mil itens e 150 milhões de unidades.
Para ter uma ideia, quando a nova gestão assumiu em 2011, o valor do estoque era de R$ 60 milhões, o suficiente para cerca de 90 dias”, disse o coordenador do Núcleo de Infraestrutura e Logística (NILO) do HC, Marco Antônio Bego.
Foi no mesmo ano de 2011 que o complexo deu início ao projeto Brilho nos Olhos, que se debruçou sobre todos os processos e funcionamentos das áreas do HC. Agora, com a conclusão de uma primeira etapa focada no diagnóstico interno, a instituição conta com um parceiro terceirizado para essa área de logística e gerência de estoques, assim como acaba de instalar um novo Centro de Distribuição em Guarulhos.
“Ainda tem muita coisa a ser feita, mas já conseguimos mudar muita coisa na área de depósitos, como o novo local para recebimento de suprimentos, por exemplo [as entregas no complexo travavam a avenida Rebouças, importante corredor do coração econômico de São Paulo, colado em outras vias movimentadas como Paulista e Consolação]. Agora a gente quer ter até o final de 2014 um projeto grande que inclua toda a operação de logística e dê esse próximo passo no nosso projeto, o de tratar o tema para fora dos nossos limites, conectando todas as partes deste processo”, completou Bego.
Dentro desse debate, a terceirização tem sido apontada não só como uma tendência, mas mais que isso, como uma necessidade, uma grande saída para o segmento. O diretor de Supply Chain (Cadeia Logística) da Pfizer, Rodrigo Lozano, acredita que as parcerias irão aumentar cada vez mais.
“Uma das tendências é o aumento da terceirização da logística, já que as empresas estão cada vez mais interessadas no core business delas”, coloca, além de listar outras perspectivas como “o aumento da percentagem de vendas diretas a hospitais, a utilização de operações mais customizadas, o reconhecimento da logística como atividade diferencial, a pressão por reduções nos níveis de inventários e a serialização”.
O especialista destacou ainda que o Brasil tem caído no ranking da logística feito pelo Banco Mundial, ocupando agora o 65° lugar e em posições muito ruins em pontos específicos como o dos procedimentos alfandegários (posição 94°), entrega internacional (81°) ou cumprimento de prazos (61°). Num conjunto de problemas que leva a esse índice, Lozano cita principalmente a falta de investimentos no setor; os problemas na matriz de transporte; a guerra fiscal entre os estados; os prazos dilatados para obtenções de licenças junto aos órgãos públicos; a dificuldade de espaço físico para recebimento de mercadorias; e o tempo decorrido entre a produção e a chegada ao cliente final – nas contas da Pfizer, na casa dos 8,1 meses.
“Isso nos traz o desafio de aumentar a flexibilidade com os sistemas corporativos e melhorar os prazos, os processamentos, as padronizações. Nas nossas reuniões com toda a América Latina, todo ano eu preciso explicar porque o Brasil é o mais caro em logística”, acrescentou Lozano.
Além de fazer coro à avaliação do colega, Ana Ferraz, que ocupa o mesma função de diretora da área de logística da Smiths Medical, criticou os problemas encontrados no processo de licitação e na relação da indústria com os compradores, como os hospitais.
“Vivemos com o risco de indefinição da entrega, sem previsibilidade de demanda. Certa vez ganhei uma licitação de 300 mil unidades, tinha 100 mil no estoque e mandamos produzir mais. Até o terceiro mês, não havia saído nada. No quarto, recebemos um novo pedido de um outro hospital querendo aderir ao processo. Fui lá e aumentei a produção. Já se passaram 12 meses e nem um, nem outro comprou nada ainda”, contou.
Se segundo Marco Antonio Bego, do HC, o complexo só comprava 40% de tudo que licitava (hoje os números, diz ele, já estão na casa dos 60%-70%). Ana também alerta para a necessidade de uma maior segurança nos contratos.
“Precisamos ter mais confiança para poder planejar. O HC só tem R$ 60 milhões no inventário porque não confia no fornecedor, não é mesmo? Se soubesse exatamente quando vai receber, não precisava de tudo isso. Podemos melhorar essa transparência, inclusive acho ótimo que os hospitais façam a medição da minha performance enquanto fornecedora. Ainda que eu não esteja bem, prefiro saber, eu preciso saber”.
Por fim, o professor Newton Garzon Moreira Cesar, da Fundação Dom Cabral, classificou a atual situação como uma realidade inconveniente: isolamento logístico da América do Sul, posicionamento de baixo valor agregado, alto peso bruto, e dificuldade de oferta de operador logístico. “A relação brasileira de custo logístico pelo valor da mercadoria é de 26% segundo números do Banco Mundial. E a tendência é de 30%. Já Estados Unidos e OCDE estão, respectivamente, com 9,5% e 9%, ambos querendo chegar em 4% em 2020.
Para dar um exemplo claro: a exportação da soja na Rússia, um país que tem sete meses de solo congelado, leva seis dias; no Brasil, 39. A gente está ficando para trás e precisa retomar a competitividade”, finalizou, clamando por terceirizações – “dão foco, reduzem custo e melhoram serviços e recursos” – e parcerias público-privadas, que “são os melhores negócios que podem acontecer no mundo”.
SaudeWeb
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