Agência O Globo: Departamento de Justiça dos Estados Unidos informou, via comunicado, que não irá barrar estudos sobre o uso da maconha medicinal, mas continuará a punir os usuários |
Rio - O governo americano começa a abrir os olhos para as pesquisas que demonstram os benefícios da maconha no tratamento do câncer. Nesta sexta-feira, o Instituto Nacional para o Abuso de Drogas (Nida, na sigla em inglês) publicou um relatório em que admite o potencial da erva no combate às células cancerígenas.
Atualmente, vários estados dos EUA permitem o uso da maconha medicinal e alguns permitem o uso recreativo, mas o governo federal o proíbe.
O documento cita a pesquisa do pesquisador Wai Liu, da Universidade de Londres, que mostra que o uso de canabidiol (CBD) e tetrahidrocanabinol (THC) — duas substâncias canabinoides presentes na maconha — inibem o glioma, tipo de câncer do cérebro. O documento afirma: “evidências de um estudo realizado em animais sugere que extratos da planta inteira da maconha podem encolher um dos mais graves tipos de tumores cerebrais. Testes em camundongos mostraram que estes extratos, quando utilizados com radioterapia, aumentaram ainda mais os efeitos”. E este não é o único estudo sobre o tema.
— Desde a década de 1990, vários estudos vêm mostrando que existe uma ação grande do uso de canabinoides no tratamento do câncer, a maioria ainda em modelos animais — explicou o neurocientista da Unifesp Renato Filev, citando resultados positivos nos casos de tumores de mama, útero, testículos, pâncreas e tecidos hepáticos, entre outros.
Na Espanha, teste em humanos
Filex lembra que, por enquanto, apenas um estudo espanhol, do pesquisador Manuel Gusmán, chegou a testar os canabinoides em humanos, mas apenas num grupo pequeno de pessoas. Enquanto isto, um resumo publicado pelo Instituto Nacional do Câncer dos EUA (NCI) cita 41 referências sobre os efeitos antitumorais da planta.
— Já existe um grande número de estudos nesta linha — reforça Antonio Zuardi, professor de Psiquiatria da USP de Ribeirão Preto que também estuda os usos medicinais da maconha.
Um dos efeitos mais conhecidos do público e também com bases científicas mais fortes é o de canabinoides no alívio de sintomas da quimioterapia.
— É uma prática já bem estabelecida. Desde o início dos anos 1980, dois produtos contendo THC sintético ou análogo, o dronabinol e o nabilone, são comercializados nos EUA para a náusea e vômito que acompanham a quimioterapia — diz Zuardi.
Nesta sexta-feira, o município chileno La Florida anunciou que fará a primeira colheita de maconha medicinal legal, num projeto-piloto para aliviar sintomas de pacientes com câncer, medida que já é aplicada em países que liberam o uso da erva para fins medicinais.
No Brasil, o dronabinol pode ser importado com receita especial, embora não seja uma prática difundida. Este não é o caso do THC, que continua na lista de substâncias proibidas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Ano passado, a agência liberou a importação do CBD, após uma longa batalha de famílias de pacientes de epilepsia refratária.
Na esteira da discussão, o Conselho Federal de Medicina (CFM) autorizou médicos a prescrever a substância, mas apenas para os pacientes com epilepsia, o que impede uso no caso da quimioterapia.
O conselho alega que não há pesquisas suficientes comprovando a segurança no tratamento de câncer e lembra que a norma poderá ser revista em dois anos. As limitações da resolução, no entanto, são alvo de críticas de especialistas, como o psiquiatra e professor da Unicamp, Luís Fernando Tófoli:
— O CFM estabeleceu uma resolução draconianamente restritiva quanto à prescrição de maconha medicinal.
A relação entre câncer e maconha não para por aí. Há pesquisas ainda revelando que o uso da planta, em geral quando fumada, aumenta o risco de o indivíduo desenvolver um tumor maligno. O NCI cita 13 referências sobre o tema, mas afirma que os “estudos produziram evidências conflitantes” sobre esse risco. E os três pesquisadores concordam que faltam bases científicas.
— Os estudos que fazem a correlação indicam, em sua maioria, que o risco parece ser menor que o de uso de cigarro — afirma Tófoli, destacando que eles não chegaram a investigar a maconha de padrão medicinal nem de vaporizadores, que aparentemente têm, segundo ele, potencial para reduzir ou até anular o risco de câncer.
O Globo
Nenhum comentário:
Postar um comentário