Rio de Janeiro - O Brasil deveria ter, no mínimo, seis bancos de pele
distribuídos em todo o seu território, “mas o adequado mesmo seriam dez”. A
opinião é do médico Marcelo Borges, responsável técnico pelo banco de pele do
Recife (PE). Em entrevista à Agência Brasil ele disse que
atualmente, existem três unidades no país: no Recife, em São Paulo e em Porto
Alegre.
Para Borges, a cidade do Rio de Janeiro deveria fazer parte desse processo de
expansão, já que a população da região justifica a criação de um banco de pele.
“Vejo com muito bons olhos toda e qualquer iniciativa que faça com que a cidade
passe a ter também um banco de pele”.
Marcelo Borges comentou a dificuldade que existe no país para a captação de
pele depois do óbito do doador. “É uma questão cultural”, indicou. Segundo ele,
a sociedade ainda interpreta a retirada de pele como uma mutilação do doador e
isso não é verdade.
Para a retirada da pele é usado um equipamento cirúrgico especial, de forma
que ela se apresenta em longas lâminas muito finas, com espessura de cerca de 1
milímetro. Essas lâminas são retiradas de áreas estrategicamente selecionadas,
como a região das costas, coxas anteriores e posteriores e pernas posteriores.
“De tal forma que, retirando-se nessas condições e nessas localidades, não há
nenhum constrangimento, porque essas áreas não serão visíveis nos doadores”.
A melhor idade para a captação de pele em crianças é acima dos 10 anos e nos
adultos até os 60 anos. Acima dessa faixa etária, a pele não tem a elasticidade
necessária, disse à Agência Brasil a chefe do Centro de
Tratamento de Queimados (CTQ) do Hospital Municipal Souza Aguiar, Maria Cristina
Serra.
Para que possa haver a captação, é preciso que o doador não tenha doenças
contagiosas como aids e hepatite. A morte por qualquer infecção anula a
possibilidade de doação de órgãos, inclusive de pele, que é o maior órgão do
corpo. “Tem que seguir um protocolo de banco de sangue, que é regido por lei
federal”.
Em geral, o doador de pele é uma pessoa que teve um trauma, ou seja, uma
morte por acidente de carro, por exemplo. “É o mesmo doador que vai doar
coração, rim”, observou Maria Cristina. Marcelo Borges acrescentou que o modelo
usado no Brasil para definir o momento da retirada de órgãos é o diagnóstico de
morte encefálica (morte cerebral).
Os chamados órgãos quentes, como coração, rins e fígado, têm prioridade na
captação. A pele é retirada no momento imediatamente posterior à captação da
córnea e anterior à captação de ossos. A médica destacou que é preciso organizar
primeiro a captação de pele no Rio e isso pode ser feito nas grandes emergências
dos hospitais públicos da cidade. A pele captada necessita de espaço apropriado
para ser estocada, com equipamentos específicos, comuns nos bancos de pele.
Por ocasião do incêndio na Boate Kiss no município de Santa Maria (RS), que
completou um mês, o banco do Recife doou 2.500 centímetros quadrados de pele.
Essa quantidade de material foi suficiente para tratar dois pacientes queimados
na tragédia. A dificuldade na captação impediu que a doação fosse maior. “Nós
zeramos o nosso estoque naquele momento”, revelou Marcelo Borges. Agora, o banco
tem 2 mil centímetros quadrados de pele como reserva técnica.
O estoque mínimo do banco de pele de Recife deveria ser 3 mil centímetros
quadrados por mês. “Significaria em média duas doações/mês. Estamos ainda com
50% dessa cota”. Hoje, o banco de Pernambuco trabalha com uma doação mensal. o
que é considerado muito pouco pelos especialistas.
O banco de São Paulo está trabalhando com uma média de quatro doações por
mês. Borges deixou claro que tanto São Paulo como Recife e Porto Alegre ainda
têm um número bem abaixo das demandas mínimas em termos de doação. “Isso é um
processo de modificação de conceito na sociedade brasileira como um todo”.
Borges revelou que a Europa é bem abastecida pelo Banco de Pele
Internacional, sediado na Holanda. O mesmo acontece nos Estados Unidos, que
contam com uma rede de dez bancos de pele. Para ele, o Brasil ainda tem um longo
caminho a percorrer nessa área.
Segundo Borges, caso a criação do banco de pele do Rio de Janeiro venha a se
tornar realidade, a unidade deveria começar com pelo menos duas doações por mês.
“Porque a população do Rio de Janeiro é três a quatro vezes maior que a do
Recife e região metropolitana”.
Fonte Agência Brasil
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