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sexta-feira, 11 de outubro de 2013

Área da saúde busca competitividade com gestão profissional

O superintendente corporativo do Albert Einstein, Henrique de Sousa Neves, já trabalhou na Shell e na Brasil Telecom 
 
Simplesmente trocar os jalecos brancos por ternos bem alinhados não tem sido mais a estratégia usual das instituições de saúde para compor seu quadro de administrativo. Em um cenário de competitividade empresarial, essas organizações perceberam que precisam profissionalizar a administração e já buscam talentos em outros setores de negócio. "Não é mais possível fazer a gestão de forma amadora. As instituições se tornaram maiores e mais complexas", afirma Haino Burmester, professor da FGV-Eaesp (Escola de Administração de Empresas de São Paulo da Fundação Getulio Vargas).

Pelo viés de mercado, em que recursos são disputados e o paciente é renomeado como usuário, a saúde do negócio passa a ser estratégica no planejamento de quem atua segmento. Nesse contexto, diz Burmester, temas como liderança, resultados, gestão de informação e de pessoas ganham destaque no dia a dia de hospitais e laboratórios.
 
Mas, segundo o professor, nesses locais, existem grandes particularidades no gerenciamento dos processos e das atividades realizadas. No que tange aos recursos humanos, é preciso lidar com uma quantidade significativa e variada de especialistas como médicos, enfermeiros, fisioterapeutas, psicólogos e nutricionistas, além de suas subespecialidades - cada grupo em defesa de seus interesses em ambientes de pesada carga emocional. Intensiva também é a tecnologia, sofisticada no conjunto de equipamentos usados nas operações.
 
Especificamente na linha do tempo da evolução dos hospitais de ponta brasileiros, conforme traça George Schahin, diretor-presidente do Hospital Santa Paula, à excelência do corpo clínico exigida nos anos 1980 e ao foco no aparelhamento tecnológico da década de 1990 somou-se, nos anos 2000, a necessidade de ser um bom prestador de serviços de hotelaria.
 
As múltiplas estruturações satisfazem não só às demandas de pacientes e seus acompanhantes, mas também dos próprios médicos, que são os que encaminham um bom número desses pacientes e requerem um contingencial humano de alta qualidade em áreas de apoio, além de "uma acreditação nacional e internacional" da instituição. Tudo isso sem esquecer das operadoras de saúde, importantes fontes pagadoras que pressionam para que os atendimentos sejam realizados a custos menores. "Gerir tudo isso não é uma equação fácil", diz Schahin.
 
Resolvê-la passa, em primeiro lugar, pela capacidade de equilibrar o assistencial e o gerencial, afirma Libânia Alvarenga Paes, coordenadora do CEAHS (Curso de Administração Hospitalar e Sistemas de Saúde) da FGV-Eaesp. Isso significa detectar problemas e prover soluções "sempre lembrando do cobertor curto: se enxugo um processo, posso prejudicar o paciente", diz. "O gestor tem de saber, por exemplo, contratar um consultor de TI e se o resultado que ele trouxe é bom. É preciso desenvolver uma visão mais estratégica em relação ao negócio, conciliando uma assistência segundo princípios éticos com a preocupação de que o hospital precisa sobreviver economicamente".
 
Na procura por esse administrador híbrido, surgem duas possibilidades. Uma é capacitar o profissional da saúde em técnicas de gerenciamento, e esse ainda é o caminho predominante, diz Libânia. A outra é importar gestores "puros" de outros ramos de negócio. No caso da primeira opção, as próprias instituições têm se preocupado em fomentar a qualificação de seus administradores, seja promovendo cursos internos, seja mandando-os para escolas específicas de formação e eventualmente ajudando a custear os estudos.
 
"Ainda tendemos a privilegiar alguém bom tecnicamente em saúde em relação a quem possui mais arrojo gerencial", diz Patrus, do Sírio Libanês.
 
No Hospital Sírio-Libanês, todos os 180 líderes, desde supervisores até superintendentes corporativos, passam por programas de especialização, informa Fábio Patrus, superintendente de gestão de pessoas e qualidade do hospital e coordenador do Grupo de Gestão de Pessoas da Anahp (Associação Nacional de Hospitais Privados).
 
O próprio Sírio desenvolveu, em parceria com a Fundação Dom Cabral, um MBA lato sensu para a formação de gestores em saúde com duração de dois anos, e que está em seu quinto ano, e um mestrado profissional em tecnologias e gestão de saúde, em sua segunda edição. Patrus destaca que dá prioridade ao recrutamento interno no momento de eleger seus gestores - entre 60% e 70%, são oriundos dos quadros da instituição.
 
Quando há busca no mercado, ela se concentra em profissionais que atuam ou atuaram na área da saúde. No caso daqueles que chegam de outros setores, é preciso que sejam assessorados para um rápido aprendizado das particularidades da administração hospitalar. "Ainda tendemos a privilegiar alguém que seja muito bom tecnicamente em saúde em relação a quem possui mais o arrojo gerencial", diz Patrus.
 
No Hospital Israelita Albert Einstein, 77% das posições de liderança foram preenchidas internamente em 2012 - um salto em relação a 2011, ano em que 29% dessas vagas foram ocupadas por pratas da casa, e 2010, quando a porcentagem foi de 11%, contabiliza Miriam Branco, diretora de recursos humanos.
 
Ela explica que, para conseguir os maiores índices de aproveitamento dos funcionários do próprio hospital em cargos de gestão, existe um PDO - Plano de Desenvolvimento da Organização - que mapeia futuros líderes e prepara essas pessoas para funções gerenciais em um MBA em parceria com o Insper. Com duração de um ano e meio, o programas está em sua oitava turma. Anualmente o Einstein banca 12 bolsistas que seleciona em seu quadro.
 
Executivos provenientes de outros negócios, contudo, também ganham espaço entre os postos de comando da organização, especialmente em diretorias como as de TI e financeira. Para atraí-los, é preciso oferecer remunerações compatíveis com as do mercado empresarial e desafios de carreira que podem ser até maiores que os de outras searas.
 
O superintendente corporativo Henrique Sutton de Sousa Neves é um dos que chegaram, há seis anos, para consolidar a profissionalização da gestão do Einstein, iniciada em 2002. O executivo já havia construído uma carreira em companhias de diversos setores da economia como a Shell, onde ficou por 22 anos e chegou a vice-presidente de varejo, e a Brasil Telecom.
 
Formado em direito e com uma especialização em gestão em Harvard no currículo, seu primeiro contato com os meandros da área da saúde foi como consultor do próprio Einstein, entre 2004 e 2005. "O mundo da medicina é muito complexo. Raramente é um mesmo profissional que entenderá todos os aspectos do assunto tratado", enfatiza.
 
Segundo ele, o papel do gestor não é ter um conhecimento técnico e científico na área, mas saber como o processo de gestão deve agir sobre esse conhecimento. Desse modo, Neves afirma que sua experiência em grandes organizações atende a determinadas necessidades do Einstein. "A diferença é que, como somos uma instituição sem fins lucrativos, o resultado financeiro não é a nossa missão, mas um meio para realizá-la. Cerca de 60% da minha avaliação de desempenho se referem a resultados qualitativos", afirma.
 
Nos cursos de especialização em gestão hospitalar em geral, a maioria dos matriculados já possui familiaridade com esse segmento. "Eles mesmos percebem a necessidade de fazer o curso, ou os próprios chefes recomendaram", afirma Cristina de Araújo Lasevicius, coordenadora do curso de graduação em tecnologia em gestão hospitalar do Senac (Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial).
 
O programa do Senac dura três anos e inclui disciplinas relativas a políticas de saúde, gestão de finanças, operação de cadeia de suprimentos, gestão da tecnologia de informação em saúde, ética, marketing, hotelaria, arquitetura hospitalar entre outras.
 
A predominância entre os estudantes da pós em administração hospitalar do Centro Universitário São Camilo também é de "profissionais que atuam no setor da saúde e que tiveram um crescimento de função", informa Claudio Colucci, coordenador geral da pós-graduação lato sensu. O São Camilo oferece também um curso de graduação em administração voltado para a atuação em hospitais, de quatro anos, e busca credenciamento para ministrar, a partir do ano que vem, um programa a distância de tecnólogo em gestão hospitalar, com duração de três anos.
 
Se cresce a tendência de os médicos se especializarem em práticas de gestão, tornam-se mais raros os que conseguem conciliar funções clínicas e administrativas. "Os que fazem carreira de gestor começam a abandonar suas carreiras médicas", considera Enrico de Vetori, sócio da área de life science e healthcare da consultoria Deloitte. "Não dá mais para administrar em tempo parcial, a jornada tem de ser exclusiva", corrobora Burmester.
 
Valor Online

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