Toby Melville / REUTERS - Uma mulher fuma na Trafalgar Square, em Londres: projeto de lei quer banir o cigarro dos espaços públicos da cidade: ações restritivas ganham novo ímpeto |
Rio - O cerco ao fumo ganha novo fôlego, já que novas e mais rígidas diretrizes foram aprovadas durante a sexta reunião da Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco, da Organização Mundial de Saúde (OMS), da qual o Brasil e outros 178 países são signatários. As recomendações não têm peso de lei, mas servem de base para que as nações integrantes adotem medidas em suas esferas, o que tem funcionado como a principal ferramenta de redução do tabagismo nos últimos anos, sobretudo no Brasil. Desta vez, as decisões do encontro, realizado no fim de semana em Moscou, incluem, por exemplo, mais impostos sobre o cigarro e regulação de produtos como cigarros eletrônicos e narguilés.
Durante uma semana, representantes de nações, ONGs e OMS participaram de intensos debates para a conclusão do documento, que foi criado em 2003 e recebe adendos periodicamente à medida que as ações avançam. A indústria do tabaco não pode integrar a convenção, mas, segundo participantes, ela pressiona para que as recomendações sejam menos restritivas. No discurso de abertura, a diretora-geral da OMS, Margaret Chan, transpareceu que este embate não tem sido fácil nos últimos anos.
— A implementação da Convenção-Quadro atinge um novo patamar, a indústria do tabaco revida, com mais força e por todos os canais possíveis, não importando o quão desonesto esses canais e práticas sejam — comentou Margaret, ressaltando que, apesar dos esforços da indústria, “importantes decisões foram aprovadas”.
Maior controle sobre pontos de venda
Em entrevista ao GLOBO, a chefe secretariada da convenção, a brasileira Vera Luiza da Costa e Silva, comentou sobre os que são considerados os principais avanços (e que ainda serão publicados na íntegra no site da OMS). Segundo Vera, haverá uma posição mais firme na responsabilização da indústria, no caso de litígios, sobre malefícios e mortes causados pelo cigarro. E também sobre as pressões comerciais e lobbies dos fabricantes. Espera-se ainda um maior controle sobre a propaganda nos pontos de venda, seguindo o exemplo da Austrália, onde os maços são neutros, sem o rótulo de cada marca. Produtos sem combustão ou nicotina, cujos exemplos são o narguilé, o tabaco mascado ou aspirado, cachimbos d’água e cigarros eletrônicos, deverão ser regulamentados.
— Entendemos que eles são porta de entrada para o cigarro — explicou Vera. — No Brasil, a venda de cigarros eletrônicos está proibida, e isso é muito bom, pois no país a prevalência do consumo de tabaco já é baixa, o que não justificaria a entrada de novos produtos no mercado.
No país, o tabagismo vem caindo progressivamente, por conta, inclusive, da adoção de recomendações da Convenção-Quadro. Segundo o Instituto Nacional de Câncer (Inca), entre 1989 e 2010 houve queda de quase 50% na prevalência de fumantes. Ano passado, dados da pesquisa Vigitel também revelaram uma prevalência de 11,3% da população fumante, contra 15,7% em 2006. Um fumante inveterado fuma, geralmente, mais de 20 cigarros por dia, e a média do brasileiro é de 17.
A expectativa da OMS, de acordo a chefe secretariada da convenção, é que em 2025 a prevalência de fumo não ultrapasse os 5% em Nova Zelândia, Irlanda, Finlândia e Singapura — e, em 2030, em outras nações. No Reino Unido, medidas como a restrição de compra por aqueles que nasceram a partir do ano 2000 estão em discussão. Lá também se estuda a restrição ao fumo em parques e espaços públicos.
O documento recomenda ainda o aumento de impostos sobre o cigarro, e a OMS sugere uma taxa de 70% sobre o preço do maço. Até 2015, espera-se que o maço tenha alta de 55% no Brasil. Depois disso, a nova previsão de impostos ainda não foi apresentada pelo governo federal.
Apoio do governo aos plantadores de tabaco
Apesar de todas as medidas, o tabagismo ainda causa em torno de 200 mil mortes por ano no país, de acordo com o Ministério da Saúde. E não são apenas os fumantes os afetados. Na outra ponta, os agricultores de tabaco sofrem com intoxicação por nicotina pelo manuseio da folha verde do tabaco durante a colheita. Um fumante tem níveis de nicotina no sangue acima de 50 ng/ml. Testes de urina realizados pela Secretaria de Vigilância em Saúde do Ministério da Saúde mostraram que agricultores não fumantes com sintomas da doença tinham níveis entre 68 e 380 ng/ml. O Brasil hoje é o maior exportador e o segundo maior produtor de tabaco do mundo, mas as restrições internacionais contra o fumo vêm se refletindo, também, no enfraquecimento do setor. Portanto, um dos temas centrais da convenção é estabelecer alternativas aos agricultores.
— O Brasil teve um papel importante nesse tema nas discussões porque o governo federal tem apoiado a diversificação da produção do tabaco, investindo em políticas públicas para que os agricultores deixem de plantar tabaco e comecem a produzir alimentos — afirmou Vera Luiza da Costa e Silva.
Membros da convenção estão também preocupados com o comércio ilícito de produtos de tabaco e cobram de países como o Brasil a assinatura do protocolo internacional de combate à prática, que já define regras claras no controle da cadeia de oferta e na cooperação internacional.
O Globo
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