“Eu estava acordada, mas paralisada”, conta Carol Weihrer, sobre uma cirurgia de olho que realizou em 1998"
“Eu podia ouvir o cirurgião dizendo para ‘cortar mais fundo no olho’. Eu estava gritando, mas ninguém podia me ouvir. Eu não sentia nenhuma dor, apenas uma sensação de puxão. Tentei mover meus dedos dos pés ou até mesmo empurrar-me para fora da mesa de cirurgia, mas não podia me mover. Eu pensei que estava morrendo”.
Carol acordou sem querer durante uma cirurgia, um fenômeno raro chamado de “consciência acidental durante a anestesia geral”. Ela está lutando para curar seu transtorno de estresse pós-traumático desde então.
“Tive que dormir em uma cama reclinável durante os últimos 16 anos”, diz Weihrer. “Se eu ficar na posição horizontal, tenho flashbacks de mesa de operação e começo a me debater violentamente”.
O fenômeno em números
Uma nova pesquisa – a maior já feita sobre o assunto – está lançando luz sobre os fatores de risco e os efeitos psicológicos devastadores desse evento tão pouco conhecido.
Publicada na revista Anaesthesia, a pesquisa entrevistou mais de 3 milhões de pacientes que receberam anestesia geral no Reino Unido e na Irlanda e descobriu que cerca de um em 19.600 pacientes “acidentalmente” acordam durante a cirurgia.
Os pesquisadores também notaram que certas cirurgias que exigem anestesia mais “leve”, como cesarianas de emergência (por causa do perigo ao bebê), carregam um risco mais elevado do fenômeno – uma taxa de um em 670 pacientes.
A maioria dos casos de consciência ocorreu entre pacientes que receberam paralíticos como parte de seu coquetel anestésico, uma vez que não podiam mover-se para alertar os médicos do fato de que estavam recuperando a consciência.
Pacientes descreveram uma gama de sensações, incluindo asfixia, paralisia, dor, alucinações e experiências de quase-morte. A maioria dos episódios foram de curta duração, com 75% deles tendo menos de cinco minutos.
Apesar disso, quase a metade de todos os pacientes que ficaram conscientes durante a cirurgia teve consequências psicológicas a longo prazo, tais como transtorno pós-traumático e depressão.
“Entre os sintomas apresentados durante o evento, a paralisia foi o mais angustiante para os pacientes – mais do que a dor”, explica o professor de Jaideep Pandit, anestesista da Universidade Oxford e principal autor do estudo.
O problema da paralisia
A anestesia geral envolve uma mistura de drogas para tornar as pessoas inconscientes, tirar a sua dor e induzir a amnésia. Um paralítico é frequentemente adicionado a esse coquetel para facilitar a inserção de um tubo de respiração, impedir que os pacientes se movam e permitir que os cirurgiões operem em áreas que são inacessíveis quando os músculos estão tensos.
Mas a consciência anestésica realmente se torna um problema quando os paralíticos são usados, uma vez que os pacientes não podem mover-se para deixar os médicos saberem que estão recuperando a consciência. Os médicos devem recorrer a métodos sutis, muitas vezes pouco confiáveis, para monitorar a consciência das pessoas.
Por exemplo, aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial pode sinalizar aos médicos que um paciente está estressado e possivelmente acordado. Mas as drogas administradas antes ou durante a operação podem bloquear a resposta do corpo ao estresse. Além disso, embora os médicos meçam continuamente o nível de gás anestésico nos pulmões do paciente para assegurar uma dosagem apropriada, o gás pode afetar cada pessoa de maneira diferente.
Monitores de cérebro, que controlam a atividade elétrica no cérebro, foram apontados como uma possível solução para o problema. Os médicos podem usar os monitores para manter a atividade cerebral abaixo de um determinado limiar durante a cirurgia. No entanto, enquanto alguns estudos têm demonstrado um benefício, outros não mostraram nenhuma redução na taxa de consciência anestésica quando os monitores do cérebro são usados.
Sem métodos infalíveis de avaliação de consciência em pacientes paralisados, é inevitável que alguns casos de consciência anestésica sejam reconhecidos somente após a cirurgia, quando o paciente pode comunicar o que aconteceu.
Ainda assim, muito mais pode ser feito para evitar a consciência anestésica, diz Pandit.
Estimuladores de nervos, que medem o grau de paralisia, devem ser usados durante toda a cirurgia para garantir que os médicos só usem a quantidade mínima de paralítico necessário. Isso daria pacientes a capacidade de mover-se se começassem a acordar.
Além disso, educar os pacientes sobre a consciência anestésica antes da cirurgia é crucial. “Os pacientes que foram informados sobre a possível consciência antes da cirurgia estavam preparados e não ficaram angustiados quando a experimentaram”, argumenta.
Por fim, quando a consciência anestésica ocorrer, os médicos precisam ser mais proativos no apoio a pacientes. “Não podemos ignorar as preocupações desses pacientes. Precisamos oferecer tratamento imediato para evitar danos psicológicos a longo prazo”, conclui Pandit.
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