Foto: Bruno Carachesti Mesmo com alto índice de contaminação no Estado, em muitos casos o diagnóstico é tardio |
Uma amostra desse trabalho rendeu ao pesquisador o prêmio Jovem Cientista, pela melhor apresentação oral durante o 18º Congresso Internacional de Hanseníase realizado em Bruxelas com o tema "Hidden Challenges" (Desafios Ocultos).
Segundo Josafá, há atualmente, em solo paraense, pelo menos 80 mil pessoas doentes, grande parte sem diagnóstico. Cerca de 6% da população de 7,3 milhões de habitantes, embora a Organização Mundial da Saúde considere aceitável menos de 1% para cada grupo de 10 mil pessoas.
O público-alvo da pesquisa do professor são pessoas atendidas pelo SUS entre 6 e 20 anos. A equipe de cientistas visita escolas e postos de saúde de todas as regiões do Pará com o intuito de mensurar a quantidade de pessoas infectadas e ajudar no tratamento da doença na fase inicial ou de encubação, quando o tratamento é mais simples e barato e o risco de contágio e/ou de sequelas posteriores é quase nulo. "Encontramos um índice muito alto de estudantes infectados. Isso se dá porque temos um grande problema na atenção básica de saúde", explicou o professor Josafá.
Um dos atendidos pelo trabalho do cientista foi o estudante M.C, de 15 anos, em Castanhal, no nordeste paraense. Dona N.C., de 35 anos, o levava a postos de saúde para descobrir o que seriam as manchas surgidas nos pés dele desde 2006. Várias doenças foram erroneamente diagnosticadas e muitos remédios caseiros recomendados por parentes foram usados. Até que uma servidora do último posto procurado pela família recomendou à família procurar a equipe de pesquisa no primeiro semestre de 2011, ou seja, cinco anos depois.
Além de confirmar a hanseníase no garoto, uma visita à residência do adolescente rendeu a descoberta da doença em M.R, a irmã um ano mais velha. O preconceito ainda presente em relação a essa patologia faz com que a família evite comentar o assunto publicamente. Mesmo depois de curados, os irmãos têm dificuldade de falar nos assunto sem desviar o olhar ou baixar a cabeça. Na escola ou na esquina da rua, nenhum colega ou amigo deles desconfia do tratamento pelo qual passaram.
Falta de informação é o maior problema
Falta de informação é o maior problema
"Nós recebemos aqui um paciente que tinha 12 anos e já estava com vários dedos atrofiados porque a hanseníase ataca o sistema nervoso da pessoa. Ele entrou aqui no consultório com as duas mãos enfiadas no bolso, e mesmo para mim que estou acostumada a ver pessoas assim diariamente ele teve receio de mostrar, imagina esse garoto na escola", lamentou a enfermeira Márcia Leão, que atende na Unidade de Referência Estadual em Dermatologia (URE), localizada na avenida João Paulo II, em Marituba, onde são atendidos centenas de hansenianos todos os meses.
A medicina e os tratamentos quimioterápicos avançaram de tal maneira no século passado que hoje a doença deveria ser tratada nas unidades básicas de saúde. Mesmo pacientes diagnosticados na URE são reencaminhados às Unidades Básicas de Saúde (UBS), onde o tratamento deve ser feito.
Porém, o trabalho preventivo em pessoas que possuem contato com possíveis comunicantes (pessoas transmissoras da doença) ainda é muito ineficiente. "Há muitas pessoas pobres no Pará, que convivem em casebres onde moram até dez pessoas. Isso potencializa a transmissão", explica o professor Josafá, cujo trabalho é realizado em parceria com a unidade.
"O diagnóstico é essencialmente clínico, ou seja, não são necessários exames ambulatoriais para confirmar a doença na maior parte dos casos. Todas as UBS devem ter equipamentos e pessoas treinadas para lidar com essa situação. O problema é que, quando os pacientes chegam aqui, já é num estágio avançado da doença", lamentou a enfermeira Patrícia Ribeiro.
O grande problema, segundo ela, é que pacientes mais graves costumam ficar com sequelas muitas vezes irreversíveis. "E depois de um ano muitos voltam porque começam a ter reações com dores maiores do que quando tinham hanseníase", pontuou.
A hanseníase é diagnosticada em até quatro níveis. Do mais simples ao mais grave são I, T, D e V. Até a última terça-feira pela manhã, 287 novos pacientes foram atendidos na URE. Destes, 63,7% deram entrada com nível D, que é quando já há deformações, o tratamento é longo e dolorido. "Muitas dessas pessoas, quando encerram o tratamento, acabam se aposentando por invalidez. Ou seja, protelar o atendimento onera mais o Estado com medicamentos, cuidados com mais profissionais e ainda gera despesas previdenciárias para um problema tão simples de resolver, bastando atender bem lá na base", refletiu Márcia.
A cada ano, 3 mil novas ocorrências
A cada ano, 3 mil novas ocorrências
Para descobrir todos os casos existentes, o Estado diz que trabalha em parceria com os municípios, visto que é na atenção básica que se busca a detecção e cura, conforme preconiza o Ministério da Saúde. Sendo assim, a Sespa informa que tem investindo na capacitação de profissionais de saúde, em especial da Atenção Básica, para realizar precocemente o diagnóstico e tratamento. Atualmente todos os municípios paraenses devem desenvolver ações de prevenção da hanseníase, cujo tratamento é gratuito e tem duração de seis a doze meses.
Segundo dados oficiais da Coordenação Estadual do Programa de Controle da Hanseníase, no Pará foram registrados 3.862 casos novos de hanseníase em 2012, o equivalente ao coeficiente de detecção de 49,37 para cada 100 mil habitantes. Já no ano de 2011, foram notificados 3.876 casos, incluindo 412 pessoas com menos de 15 anos de idade. Em 2008, o Pará chegou a registrar 4.669 pessoas que descobriram ter o bacilo da doença.
Nos próximos dias, a Sespa informará o resultado final das campanhas de combate à hanseníase realizadas a partir de março deste ano em escolas públicas dos 61 municípios que receberam incentivo financeiro do Ministério da Saúde para o controle da hanseníase, geohelmintíases e tracoma.
Diário do Pará
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