por Saúde Business Web
19/04/2011
Expert fala sobre a dificuldade do profissional na hora em que o paciente se recusa algum tipo de procedimento por razões religiosas
Na mitologia grega, Dâmocles ao sentar no trono e perceber uma espada suspensa voltada diretamente para sua cabeça, presa somente por um fio de rabo de cavalo, declinou do reinado de um dia que lhe havia sido oferecido pelo Rei Dionísio de Siracusa.
Não são raras as vezes em que a pergunta que intitula este artigo é feita aos médicos quando há prescrição de transfusão sanguínea e o paciente ou o responsável a recusa, sob o pretexto de que o tratamento vai de encontro à sua religiosidade e nesta hora, inevitavelmente, a espada em questão suspende-se sobre a cabeça do médico.
Se é certo que o paciente tem o direito de ser informado e consentir com o tratamento, também é certo que o tratamento indicado tem por fundamento a confiança do médico na melhor terapêutica disponível para o diagnóstico que se apresenta.
Este profissional de saúde, ao escolher a transfusão, o fez com a certeza de oferecer o tratamento mais adequado e possível para o paciente junto à instituição de saúde que o recebe, ou seja, se o médico optou pela transfusão sanguínea, o fez por acreditar ser aquela a melhor solução, ou mesmo, a única disponível naquela unidade hospitalar.
Assim é que, mesmo sendo correto dizer que a opção do paciente deve ser respeitada, a recusa se transforma em verdadeiro constrangimento para o médico. "E agora, o que é que eu faço?", alguns certamente pensam.
Fala-se muito que ao paciente deve ser dado o direito de escolha, dando-se como exemplo a pessoa que opta pela operação espiritual à intervenção cirúrgica.
Ocorre que é justamente este tipo de escolha que cabe ao paciente. A escolha do tratamento, de acordo com a convicção de quem o executa!
Não se pode compreender, entretanto, que se busque certo tipo de procedimento onde o mesmo não é feito. Buscar um hospital em que os médicos e o próprio hospital utilizam a transfusão sanguínea como meio de cura e querer outro tipo de tratamento é o mesmo que se optar pela intervenção espiritual e esperar uma intervenção convencional.
Buscar o médico e impedi-lo de exercer o seu ofício é mais constrangedor do que receber o tratamento que é prescrito e não é aceito pelo paciente.
O médico não foi em busca do paciente para lhe prestar seus serviços, pelo contrário, o paciente foi quem procurou a instituição de saúde, ou, na pior das hipóteses, para lá foi levado em situação de urgência ou emergência.
Tal recusa se dá mais normalmente pelos seguidores da fé cristã denominados Testemunhas de Jeová.
Tem-se conhecimento que referidas pessoas costumam até fornecer, quando de suas internações junto às instituições de saúde, declaração isentando tanto a instituição, quanto o médico por quaisquer resultados advindos de tratamentos alternativos, tendo em vista que se recusam a receber a transfusão sanguínea.
Não se olvida que atualmente há diversas técnicas alternativas à transfusão, como hemodiluição ou a recuperação sanguínea intra-operatória.
Ocorre que referidas técnicas não são universais, pelo que, não são encontradas em todas as unidades de saúde, além do fato de não poderem ser administradas para todos os pacientes, considerando-se, ainda, os riscos inerentes a qualquer tipo de transfusão, seja a convencional ou as autólogas. Assim, a prescrição deve ser criteriosa com um balanço de seus reais benefícios.
O Conselho Federal de Medicina já se posicionou no sentido de que havendo recusa na permissão, o médico deverá respeitar a vontade do paciente ou responsável somente nos casos em que não haja iminente perigo de vida, pois, nestes casos, o médico deverá praticar a transfusão de sangue independentemente do consentimento do paciente (Resolução CFM nº 1021/80).
No mesmo diapasão, o posicionamento do fórum: "Transfusão de Sangue: os Conflitos entre a Ciência e a Religião" organizado pelo Comitê de Bioética do HCor, Cremesp, OAB de São Paulo e a Associação Brasileira de Hematologia e Hemoterapia (ABHH) que definiu o seguinte entendimento: "ao médico é vedada a não realização do procedimento de Transfusão de Sangue em pacientes que se negam a receber sangue por motivos religiosos, em situações de urgência e emergência, que representem perigo iminente de morte ao paciente, em conformidade com os dispositivos legais supracitados, ressalvando-se apenas os casos em que se apresente ordem judicial expressa e específica, em favor do paciente, impeditiva da realização do procedimento de transfusão de sangue".
Como exemplo das consequências da omissão, quando existente o risco de morte, cita-se o recurso nº 993.99.085354-0, do TJSP, cuja decisão foi a seguinte: "Homicídio. Sentença de pronúncia. Pais que, segundo consta, impedem ou retardam transfusão de sangue na filha, por motivos religiosos, provocando-lhe a morte. Médico da mesma religião que, também segundo consta, os incentiva a tanto e ameaça de processo os médicos que assistiam a paciente, caso realizem a intervenção sem o consentimento dos pais. Ciência da inevitável consequência do não tratamento. Circunstâncias, que, em tese, caracterizam o dolo eventual, e não podem deixar de ser levadas
à apreciação do júri. Recursos não providos".
Por fim, pensando no conflito entre os direitos constitucionais fundamentais da inviolabilidade do direito à vida e à liberdade de consciência e crença, nossa opinião é de que deve prevalecer o primeiro por melhor se adequar ao princípio da dignidade do homem, como valor que informa todo o ordenamento jurídico.
Gabriel Mesquita Rodrigues Filho, advogado com 15 anos de experiência em diversos segmentos do Direito. Sócio-fundador da Mesquita & Dornelas Advogados voltada para o direito sanitário. Já dirigiu o departamento jurídico de uma tradicional operadora de planos de saúde em São Paulo e participou do Fórum Permanente do Judiciário para a Saúde promovido pelo Conselho Nacional de Justiça.
Expert talks about the difficulty of the professional at the time the patient refuses any kind of procedure on religious grounds
In Greek mythology, Damocles to sit on the throne and realize a sword, aiming squarely at his head, secured only by a hair in pigtails, she declined the reign of a day that had been offered by King Dionysius of Syracuse.
There are few times that the question that heads this article is made to physicians when prescribing blood transfusion and the patient or the person's refusal, on the pretext that the treatment goes against their religion and this time, inevitably, the sword in question is suspended over the head of the physician.
If it is certain that the patient has the right to be informed and consent to treatment, it is certain that the recommended treatment is based on the physician's trust in the best therapy available for the diagnosis as presented.
This health professional to choose the transfusion, it did so with the assurance of providing the best treatment possible for the patient and with the health care institution that receives, or if the doctor opted for a blood transfusion, did so because they believe be that the best solution, or even the only one available at that hospital.
So it is that even if correct to say that the choice of the patient must be respected, denial becomes real embarrassment for the doctor. "And now what do I do?", Certainly some think.
There is much talk that the patient should be given the right to choose, giving as example the person who takes a spiritual surgery to surgery.
It happens that it is precisely this kind of choice that fits the patient. The choice of treatment, according to the conviction of the person who performs!
One can not understand, however, that seeks some sort of procedure where it is not done. Search a hospital where the doctors and the hospital using blood transfusion as a means of healing and want another type of treatment is the same as opting for spiritual intervention and wait a conventional intervention.
Search doctor and prevent him from exercising his office is more embarrassing than getting treatment that is prescribed and is not accepted by the patient.
The doctor was not in search of the patient to give you their services, however, the patient who sought health care institution, or, at worst, there was taken in a situation of urgency or emergency.
Such a refusal is given more often by followers of Christian faith called Jehovah's Witnesses.
It has been known that such persons tend to provide on their admissions among health institutions, declaration exempting both the institution as the doctor for any results coming from alternative treatments, in order that they refuse to receive blood transfusion.
Do not forget that currently there are several technical alternatives to transfusion, such as haemodilution or intraoperative blood recovery.
It happens that these techniques are not universal, therefore, are not found in all health facilities, besides the fact they can not be administered to all patients, considering also the risks inherent in any transfusion, either conventional or autologous. Thus the prescription should be careful with a swing of its real benefits.
The Federal Council of Medicine has positioned itself in the sense that there is a refusal to permit the physician should respect the will of the patient or responsible only in cases where there is imminent danger to life, because in these cases, the doctor must perform a transfusion blood regardless of the patient's consent (CFM Resolution No. 1021/80).
In the same vein, the positioning of the forum: "Blood Transfusion: The Conflict between Science and Religion" organized by the Bioethics Committee of HCor, Cremesp, OAB Sao Paulo and the Brazilian Association of Hematology (ABHH) that defined the following understanding, "the doctor is not forbidden to perform the procedure of Blood Transfusion in patients who refuse to receive blood for religious reasons, in emergencies and emergency posing an imminent danger of death to the patient, in accordance with legal provisions above, excepting only those cases where it proves court order expressly and specifically in favor of the patient, hindering the completion of the procedure of blood transfusion. "
As an example of the consequences of failure, when the risk of death exists, cite the resource paragraph 993.99.085354-0 of TJSP, whose decision was: "Homicide. Sentence pronunciation. Parents who reportedly prevent or slow transfusion of blood in her daughter for religious reasons, causing him to death. Doctor of the same religion who also reportedly encourages both the process and the threat of the doctors who attended the patient, should perform the intervention without the consent of parents. Science inevitable consequence of not treating. Circumstances which, in theory, to characterize the eventual intention, and can only be taken
considered the jury. Features not provided. "
Finally, thinking about the conflict between the fundamental constitutional rights of the inviolable right to life and liberty of conscience and belief, our view is that should prevail in the first best suit the principle of human dignity as a value that tells all the legal system.
Gabriel Rodrigues Mesquita Filho, a lawyer with 15 years of experience in various segments of the law. Founding partner of the Mesquita & Lawyers Dornelas facing health law. Has directed the legal department of a traditional health plan operator in St. Paul and attended the Permanent Forum of the Judiciary for Health sponsored by the National Council of Justice.
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