Fascículo da Lanced Oncology traz um olhar específico sobre a oncologia latino-americana
Um olhar específico sobre a oncologia na América Latina acaba de ser lançado pela publicação inglesa The Lancet Oncology, uma das revistas científicas mais reconhecidas quando o assunto é câncer. Apresentada ontem em evento na capital paulista, uma edição especial da publicação, voltada exclusivamente para o continente traz, um panorama da doença, evidenciando que a América Latina pode ser "esmagada" por epidemia de câncer e está atrasada em relação ao restante do mundo.
O trabalho desenvolvido nos últimos meses conta com artigos de 60 renomados oncologistas de diferentes países, entre eles, gaúchos como Stephen Stefani, Carlos Barrios e Marcio Debiasi, poderá nortear o trabalho de gestores públicos nas estratégias de prevenção e tratamentos oncológicos.
Divididos em grupos, os profissionais escreveram, com base em seus conhecimentos, pesquisas e experiências, artigos que abordassem questões ligadas ao câncer. Os doze temas escolhidos (veja o quadro abaixo) não focam apenas a doença em si, mas seus efeitos e desafios na sociedade sul-americana.
Oncologista do Hospital Mãe de Deus, Stephan Stefani avalia como preocupante o cenário latino-americano, considerando os investimentos feitos. Segundo ele, enquanto na Inglaterra o custo médio por ano com pacientes de câncer é U$ 183, US$ 244 no Japão e US$ 460 nos Estados Unidos, na América Latina se investe apenas US$ 7,92 em um paciente com a doença.
Stefani define como alarmante a situação do Rio Grande do Sul em relação à América Latina.
Enquanto no continente latino-americano possui 163 novos casos por ano a cada 100 mil habitantes, no Estado são mais de 400 novos casos por ano. O especialista atribui esse cenário a problemas graves na infraestrutura, falta de medicamentos e baixa qualificação dos profissionais que trabalham na área.
O encarte especial da revista surge como alternativa de estudo para a redução desse horizonte negativo na saúde da sociedade, promovendo intercâmbio entre importantes oncologistas do continente. Segundo a Organização Mundial da Saúde, até 2030, a doença poderá alcançar a liderança entre as principias causas de morte do planeta, ultrapassando as cardiopatias. Até lá, o índice de mortalidade por este mal poderá aumentar em cerca de 75%, fazendo com que cerca de 1% do PIB mundial seja gasto em tratamentos oncológicos.
Entrevista
"Falta investimentos em prevenção e tratamento"
A revista The Lancet Oncology, de Londres, tem uma extensa rede de contatos e colaboradores na área do câncer. Para a edição especial, foram escolhidos médicos envolvidos na linha de frente do tratamento oncológico na América Latina. Coordenador da publicação, o pesquisador e professor de Medicina da Universidade Harvard, Paul Goss conversou por e-mail com o caderno Vida.
Vida — A situação de saúde nos países da América Latina é, em geral, semelhante, ou algum país está mais avançado?
Paul Goss — Há uma situação constante entre os países. As taxas de mortalidade são maiores em torno de 60% em todos os países da América Latina em comparação com os EUA, principalmente porque o diagnóstico é realizado mais tardiamente e o tratamento é efetuado quando a doença está em estágio mais avançado.
Vida — Há muita disparidade entre os tratamentos do câncer na América Latina com relação à Europa e América do Norte?
Goss — Sim. Pelo fato da Europa e América do Norte investirem substancialmente mais na prevenção e tratamento do câncer, as populações, de um modo geral, têm acesso a tecnologias mais avançadas. Na América Latina, as populações com maior poder econômico, urbana e com alto nível educacional têm maior acesso a essas tecnologias, e cerca de 54% dos pacientes têm pouco ou nenhum acesso. Por exemplo, os Estados Unidos gastam oito vezes a mais do PIB e 17 vezes a mais em valor absoluto em dólar no tratamento do câncer do que qualquer país da América Latina.
Vida — Quais os principais entraves para a evolução dos tratamentos do câncer em países como o Brasil?
Goss — Há falta de investimentos em prevenção e tratamento de uma forma mais equitativa entre as populações. Existe também a necessidade de melhorar a educação dos profissionais de saúde. Há carência de pesquisas, local e regional, e o estabelecimento de um registro nacional de câncer para se conhecer a dimensão do problema. Mais programas de prevenção (como o controle do tabaco, a imunização de causas infecciosas de câncer, por exemplo) são prioritários, pois os custos com esses programas são menores do que os necessários para o tratamento.
Temas abordados na publicação:
— Sistemas atuais de saúde na América Central e do Sul
— Medicina urbanizada: o acesso e as desigualdades
— Medicina remota e povos indígenas
— Custo do tratamento do câncer na América Central e do Sul e os desafios do futuro
— Educação médica nacional e internacional: o papel do setor acadêmico e comercial
— A prevenção do câncer primário e secundário e triagem
— Testes centralizados de laboratório, controle de qualidade, teste molecular e medicina personalizada
— Perspectiva clínica de prestação de cuidados de câncer eficaz e acessível na América Central e do Sul: a voz do médico oncologista, radioterapeuta, oncologista cirúrgico, radiologista, pediatra oncologista e enfermeira
— Desafios e oportunidades na interface assistência oncológica / paliativos
— Participação, conduta e responsabilidade corporativa em estudos clínicos
— Defesa do paciente e do papel de grupos de pacientes em prestação de cuidados de câncer
Fonte Zero Hora
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