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segunda-feira, 26 de agosto de 2013

Medicina alternativa é tratada como 'intocável', diz pediatra em novo livro

O pediatra Paul Offit, autor de "Do You Believe in Magic"
Ryan Collerd/"The New York Times"
O pediatra Paul Offit, autor de "Do You Believe in Magic"
Um dos criadores de uma vacina contra rotavírus (causador de diarreia e mortes em crianças pequenas), o pediatra americano Paul Offit vem reunindo inimigos ao longo de sua vida profissional, em especial entre seguidores do movimento antivacinação nos EUA.
 
Conhecidos por culparem as imunizações por transtornos como o autismo, eles já foram alvo de dois livros anteriores de Offit, que agora volta seu foco aos praticantes da medicina alternativa e à indústria por trás dela.
 
Em "Do You Believe in Magic", lançado recentemente nos EUA, Offit dispara contra o mercado das vitaminas vendidas em altas doses, dos suplementos alimentares que prometem ações semelhantes à de remédios e dos profissionais que oferecem "curas" com preço alto mas sem base nenhuma em pesquisas para doentes terminais.

O problema, diz ele, é o sistema de saúde atual, que faz os médicos darem pouca atenção aos pacientes. "A medicina moderna é fria, distante. A medicina alternativa não é nada disso." Ele falou com a Folha por telefone.
 
Folha - Você critica a medicina alternativa pela falta de testes clínicos que atestem sua eficácia, mas sabemos eles também têm suas falhas. Ainda assim os alternativos precisam seguir as regras da medicina convencional?
 
Paul Offit - Sim. Outro dia entrei numa loja de produtos naturais e perguntei ao balconista se havia algo para baixar colesterol. Ele me deu um extrato de alho concentrado.
 
Uma pessoa com colesterol alto e histórico de doença cardíaca vai se beneficiar de uma estatina [droga para baixar colesterol]. Só que ela pode entrar nessa loja e receber um mau conselho.
 
As pessoas que vendem esses produtos ganham dinheiro e podem bancar um teste clínico. Estudos já mostraram que você não tem mais chance de baixar o colesterol com o extrato de alho do que com o placebo. O consumidor merece testes. E extrato concentrado de alho pode causar efeitos colaterais.
 
É desconcertante que as pessoas tenham a ideia de que algo é seguro e funciona quando pode não funcionar e não ser seguro. Essa indústria é colocada como intocável. Nos EUA, a indústria de megavitaminas e suplementos movimentou US$ 34 bilhões em 2012. O que surpreende é que as pessoas acham que essas fabricantes são empresas familiares, que os produtos são feitos por elfos em montanhas.
 
Gostaria que tivéssemos o mesmo ceticismo com a medicina alternativa que temos com a medicina moderna. Se acupuntura é bom, vamos descobrir como! Apontar para as estrelas não dá.
 
Boa parte do seu livro é dedicada às vitaminas e a como se vendem tratamentos com altas doses delas. Não devemos tomar vitamina nenhuma a não ser em caso de deficiência ou o problema mesmo é o consumo em doses altas?
A maioria das pessoas consome vitamina suficiente e algumas acham que, por comerem mal, precisam de um multivitamínico com as doses diárias recomendadas. Não faz mal, mas a maioria não precisa. Mas as megadoses podem causar mal.
 
Comprei um vidro de vitamina E "natural" cujo rótulo dizia que o comprimido continha 3.333% da dose diária recomendada, o equivalente a comer 1.650 amêndoas. Isso não é natural. Sabemos que excesso de vitamina E aumenta o risco de câncer de próstata. Em lugar nenhum no rótulo está escrito que, se você tomar isso todo dia por meses, você aumenta seu risco de câncer.
 
Você destaca o caso de Steve Jobs (1955-2011), criador da Apple, que adiou a cirurgia para remover um câncer e partiu para tratamentos alternativos. Você acha que, como ele, muita gente tem essa vontade de tomar a dianteira do tratamento e por isso abandona a medicina convencional?
Sim, a medicina moderna é fria, distante, sem espiritualidade. A medicina alternativa não é nada disso. Ela é praticada por pessoas que parecem mais sensíveis, que passam mais tempo com o paciente, que trazem espiritualidade ao tratamento.
 
Quando eu era pequeno, meu pediatra ia em casa. Isso fazia dele um médico melhor para mim, mas isso não existe mais, nem pagando médico particular.
 
Ter uma doença terminal é um dos grandes motivos para procurar médicos alternativos. Por que os médicos tradicionais têm dificuldade em lidar com a morte?
Nosso negócio é preservar a vida e não sabemos o que fazer quando a pessoa tem uma doença terminal. Por um lado, falsas esperanças não são uma coisa ruim, sabemos que a nossa atitude frente à doença pode ajudar. O charlatanismo entra quando se cobra muito dinheiro por falsas esperanças.
 
Queremos acreditar em algo mágico. Em "Jornada nas Estrelas", o médico tinha aquele aparelho ["tricoder"] e sabia o que a pessoa tinha. Mas só sabemos uma fração do que precisamos para curar os pacientes, o que é assustador. Se você tem uma doença grave, quer crer que a medicina já sabe o que fazer, quando na verdade não sabemos.
 
Muito do sucesso das terapias alternativas é atribuído ao efeito placebo. Qual é o mal de usar o placebo, se funciona?
Usamos isso tempo todo. Damos remédios aos pacientes e dizemos que vão funcionar. Isso os influencia. Temos jalecos brancos, máquinas que fazem barulhos interessantes, isso é placebo. Se as pessoas querem prescrever pílulas de açúcar, tudo bem.
 
Até defendo a homeopatia no fim do livro, em certas circunstâncias. Se você trata seus filhos com homeopatia, ao menos eles não estão tomando remédios contra tosse e resfriado, com ingredientes como pseudoefedrina, que podem causar mal a crianças, como alucinações e até mortes. O problema é quando você usa placebo em vez de um remédio que funcionaria.
 
DO YOU BELIEVE IN MAGIC
AUTOR Paul Offit
EDITORA Harper
PREÇO US$ 12,74 (R$ 30) em e-book na Amazon
 
Folhaonline

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