Valor gasto anualmente com compra de remédios seria suficiente para construir um hospital por mês
O secretário de Estado da Saúde, Giovanni Guido Cerri, diz que a judicialização da saúde é uma distorção do conceito da universalidade. Diz ainda que, com o valor gasto anualmente com a compra de medicamentos, seria possível construir um hospital por mês. Leia abaixo a entrevista concedida ao Estado por e-mail.
1 - A que o senhor atribui essa demanda tão grande de ações judiciais na área de saúde? Só no ano passado foram 25 mil ações.
A judicialização da saúde é um fenômeno que, infelizmente, vem atingindo em todo o país os gestores federal, estaduais e municipais. É uma distorção do conceito da universalidade da saúde. Em nenhum país do mundo onde a saúde é universal há distribuição da totalidade de medicamentos existentes no mercado. No Brasil ainda precisamos avançar muito neste entendimento de que não é possível para o Estado entregar todos os tipos de medicamentos a todos.
2 - Mas por que a judicialização ocorre?
O Ministério da Saúde trabalha com protocolos definidos com base em evidências científicas sobre a eficácia dos medicamentos para incluir os produtos na lista do SUS. Ocorre que a lógica da indústria farmacêutica nem sempre segue a lógica da saúde pública. Um medicamento novo não é necessariamente melhor do que outro similar, já existente. Mas as estratégias de marketing são executadas para convencer de que o novo produto é muito mais eficaz. Aí entra o interesse econômico. O Poder Judiciário, muitas vezes, é induzido por argumentos apelativos. Tanto que o próprio Conselho Nacional de Justiça publicou recomendações sobre a judicialização, com orientações sobre a conduta para os julgamentos, o que inclui ouvir previamente os gestores de saúde.
3 - As insulinas não padronizadas no SUS são o medicamento mais pedido. Não seria o caso de o Estado pensar em oferecê-las gratuitamente para facilitar uma negociação de valores?
A insulina padronizada pelo Ministério da Saúde é a NPH, distribuída em unidades básicas de saúde municipais. A secretaria atende a 2,5 mil pedidos para distribuir insulina glargina. Mas é importante esclarecer que não há, até o presente momento, comprovação científica de que o tratamento com insulina glargina, em substituição à insulina NPH, seja capaz de reduzir a morbimortalidade dos pacientes diabéticos tipo 2. Para comprar os itens por ação judicial, a Secretaria busca sempre fazer pregão para ata de registro de preços, visando comprar os produtos com o desconto de 25% previsto na legislação. No caso dos medicamentos oncológicos, a secretaria padronizou alguns itens fora da lista do SUS.
4 - Em levantamento recente da secretaria, vemos um número imenso de ações pedindo fubá, xampus, pilhas, escovas de dente infantil, óleo de soja. Por que isso acontece? E há alguma forma de evitar essa demanda?
A secretaria vem desenvolvendo um trabalho contínuo no sentido de propiciar aos magistrados as informações técnicas necessárias para o julgamento de questões de saúde, o mais rápido possível, inclusive no caso de tutelas de urgência.
5 - Outro problema da judicialização são as drogas para câncer e doenças raras que, em geral, não são comercializadas no Brasil. Pacientes reclamam da demora na entrega desses remédios e também se queixam que, em alguns casos, o Estado oferece versão similar em vez da de marca.
Há casos que merecem ser analisados à parte. Se a decisão especifica uma marca de produto, a secretaria precisa comprar o remédio de marca, estando sujeita, inclusive, à disponibilidade do fornecedor em entregar o produto. Quando não há esta especificação, compramos o medicamento similar. Nos casos de medicamentos importados, ficamos sujeitos aos prazos de autorização de importação da Anvisa e desembaraço na alfândega. A secretaria oficia os juízes para dar ciência sobre o processo de importação. Há casos em que o despacho judicial chega incompleto, sem, por exemplo, a receita anexada ao processo, o impede legalmente a secretaria de iniciar o processo de compra.
6 - Pacientes também reclamam que é difícil conseguir a medicação por via administrativa. Quais os principais motivos da negativa da entrega?
Os pedidos administrativos, referentes aos medicamentos não padronizados pela lista do SUS, são analisados por técnicos com base em evidências científicas. O prazo para análise dos pedidos é de, em média, 30 dias. As negativas ocorrem quando há remédio disponível na rede ou quando não há qualquer evidência sobre a eficácia da droga para tratar a doença em questão.
7 - Qual é o orçamento anual da secretaria? O que seria possível fazer com esses R$ 700 milhões gastos no ano passado com ações judiciais?
O orçamento é de R$ 14 bilhões. Com o valor gasto em ações judiciais poderíamos construir um hospital por mês.
8 - Qual a solução que a secretaria enxerga para o problema? Existe alguma maneira de reduzir essas ações?
Propomos ampliar o debate em torno desta questão, envolvendo os três níveis de gestão do SUS, os magistrados, OAB, Defensoria Pública, Ministério Público, ONGs, entidades representativas dos laboratórios e da sociedade civil. Acreditamos ser possível chegar a um consenso para que a assistência farmacêutica do SUS seja aprimorada, para o bem dos pacientes, sem que tenha de invariavelmente passar pelos tribunais.
1 - A que o senhor atribui essa demanda tão grande de ações judiciais na área de saúde? Só no ano passado foram 25 mil ações.
A judicialização da saúde é um fenômeno que, infelizmente, vem atingindo em todo o país os gestores federal, estaduais e municipais. É uma distorção do conceito da universalidade da saúde. Em nenhum país do mundo onde a saúde é universal há distribuição da totalidade de medicamentos existentes no mercado. No Brasil ainda precisamos avançar muito neste entendimento de que não é possível para o Estado entregar todos os tipos de medicamentos a todos.
2 - Mas por que a judicialização ocorre?
O Ministério da Saúde trabalha com protocolos definidos com base em evidências científicas sobre a eficácia dos medicamentos para incluir os produtos na lista do SUS. Ocorre que a lógica da indústria farmacêutica nem sempre segue a lógica da saúde pública. Um medicamento novo não é necessariamente melhor do que outro similar, já existente. Mas as estratégias de marketing são executadas para convencer de que o novo produto é muito mais eficaz. Aí entra o interesse econômico. O Poder Judiciário, muitas vezes, é induzido por argumentos apelativos. Tanto que o próprio Conselho Nacional de Justiça publicou recomendações sobre a judicialização, com orientações sobre a conduta para os julgamentos, o que inclui ouvir previamente os gestores de saúde.
3 - As insulinas não padronizadas no SUS são o medicamento mais pedido. Não seria o caso de o Estado pensar em oferecê-las gratuitamente para facilitar uma negociação de valores?
A insulina padronizada pelo Ministério da Saúde é a NPH, distribuída em unidades básicas de saúde municipais. A secretaria atende a 2,5 mil pedidos para distribuir insulina glargina. Mas é importante esclarecer que não há, até o presente momento, comprovação científica de que o tratamento com insulina glargina, em substituição à insulina NPH, seja capaz de reduzir a morbimortalidade dos pacientes diabéticos tipo 2. Para comprar os itens por ação judicial, a Secretaria busca sempre fazer pregão para ata de registro de preços, visando comprar os produtos com o desconto de 25% previsto na legislação. No caso dos medicamentos oncológicos, a secretaria padronizou alguns itens fora da lista do SUS.
4 - Em levantamento recente da secretaria, vemos um número imenso de ações pedindo fubá, xampus, pilhas, escovas de dente infantil, óleo de soja. Por que isso acontece? E há alguma forma de evitar essa demanda?
A secretaria vem desenvolvendo um trabalho contínuo no sentido de propiciar aos magistrados as informações técnicas necessárias para o julgamento de questões de saúde, o mais rápido possível, inclusive no caso de tutelas de urgência.
5 - Outro problema da judicialização são as drogas para câncer e doenças raras que, em geral, não são comercializadas no Brasil. Pacientes reclamam da demora na entrega desses remédios e também se queixam que, em alguns casos, o Estado oferece versão similar em vez da de marca.
Há casos que merecem ser analisados à parte. Se a decisão especifica uma marca de produto, a secretaria precisa comprar o remédio de marca, estando sujeita, inclusive, à disponibilidade do fornecedor em entregar o produto. Quando não há esta especificação, compramos o medicamento similar. Nos casos de medicamentos importados, ficamos sujeitos aos prazos de autorização de importação da Anvisa e desembaraço na alfândega. A secretaria oficia os juízes para dar ciência sobre o processo de importação. Há casos em que o despacho judicial chega incompleto, sem, por exemplo, a receita anexada ao processo, o impede legalmente a secretaria de iniciar o processo de compra.
6 - Pacientes também reclamam que é difícil conseguir a medicação por via administrativa. Quais os principais motivos da negativa da entrega?
Os pedidos administrativos, referentes aos medicamentos não padronizados pela lista do SUS, são analisados por técnicos com base em evidências científicas. O prazo para análise dos pedidos é de, em média, 30 dias. As negativas ocorrem quando há remédio disponível na rede ou quando não há qualquer evidência sobre a eficácia da droga para tratar a doença em questão.
7 - Qual é o orçamento anual da secretaria? O que seria possível fazer com esses R$ 700 milhões gastos no ano passado com ações judiciais?
O orçamento é de R$ 14 bilhões. Com o valor gasto em ações judiciais poderíamos construir um hospital por mês.
8 - Qual a solução que a secretaria enxerga para o problema? Existe alguma maneira de reduzir essas ações?
Propomos ampliar o debate em torno desta questão, envolvendo os três níveis de gestão do SUS, os magistrados, OAB, Defensoria Pública, Ministério Público, ONGs, entidades representativas dos laboratórios e da sociedade civil. Acreditamos ser possível chegar a um consenso para que a assistência farmacêutica do SUS seja aprimorada, para o bem dos pacientes, sem que tenha de invariavelmente passar pelos tribunais.
Fonte Estadão
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