Como possibilitar que os usuários da saúde privada tenham atendimento de qualidade sem aumentar os custos? Os executivos do setor têm os seus palpites
O atual momento já mostra os primeiros indícios e o futuro virá para comprovar que, nos próximos anos, os termos que precisarão ser complementares à saúde suplementar são: flexibilidade, diálogo e negociação. Isso porque fatores como o envelhecimento populacional, descoberta de novas tecnologias e a busca por mais qualidade assistencial tendem a fazer com que os custos relacionados a este segmento aumentem. E quem não se adequar as essas demandas hoje pode enfrentar dificuldades no futuro.
Para estimar as projeções dos próximos anos, é preciso olhar para o passado e relembrar as mudanças demográficas pelas quais o País transcorreu nas últimas décadas. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que, nos anos 70, a população brasileira era de 90 milhões de habitantes. Em 34 anos, esse número praticamente dobrou e, somente entre 2000 e 2004, 10 milhões de pessoas a mais entraram no censo. O instituto estima que, em 2050, serão 259,8 milhões de brasileiros e a expectativa de vida ao nascer será de 81,3 anos.
De acordo com o superintendente executivo do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), Luiz Augusto Ferreira Carneiro, o maior problema é que ninguém mensurou o impacto econômico do envelhecimento na saúde pública e suplementar. “As estatísticas mostram que estamos vivendo um bônus demográfico, mas depois nos depararemos com o ônus e não sabemos como vamos lidar com isso porque nem conhecemos qual é o impacto que essa realidade irá causar”.
Carneiro analisa que, se em 2010, a proporção de idosos entre 60 e 64 anos era equivalente a 32% da população de terceira idade no Brasil, em 2050 essa estatística vai cair para 24%. Na outra ponta, que corresponde ao público de 80 anos ou mais, há dois anos, esse número representava 14% da população idosa. Em 2050, essa faixa vai alcançar os 21% do grupo senil brasileiro.
“Esses números mostram que de 2010 a 2050, haverá uma diminuição dos jovens idosos e um peso maior das pessoas com mais de 80 anos. Da mesma forma que os idosos de 75 a 79 anos, que representavam 12% da população em 2010, vão chegar a 14% em 2050”, avalia.
Os números são muitos e a questão que deve ser resolvida pelas operadoras de planos de saúde é a mesma. Diante deste cenário, a maior dúvida é se a sociedade e as empresas que atuam na saúde suplementar vão conseguir custear os serviços médicos.
O diretor presidente da Unimed BH, Helton Freitas, acredita que o cenário futuro pede uma nova forma de prestar assistência médica. E lembra que atualmente o modelo assistencial é baseado na doença e não na saúde, principalmente o modelo de pagamento. “Temos que pensar em uma nova forma de realizar o atendimento ao paciente para que ele seja mais bem cuidado com um custo mais efetivo, pois essa conta é a sociedade quem paga”.
O vice-presidente da SulAmérica Saúde, Gabriel Portella, vê a situação de forma mais otimista. “Temos fatores que contribuem para que o mutualismo, baseado na solidariedade entre os participantes, ou seja, em que todos contribuem para o grupo – continue. No fundo, esse processo é de equilíbrio. Acredito que o País conta com um dos maiores índices de transformação demográfica do mundo, mas temos possibilidade de encontrar novas formas de financiamento e de equilibrar o mutualismo”.
Portella diz ainda que, em um processo de crescimento da população, tudo tende a aumentar. “Empresas pequenas se tornam médias. O que leva também à expansão das alternativas de contribuição entre empregador e empregado”.
Em complemento à ideia de Portella, o presidente do Grupo Bradesco Saúde, Márcio Coriolano, diz que essa situação não é novidade. Segundo ele, à medida em que ocorre a expansão demográfica, o encarecimento da saúde se torna mais presente. “O sistema de saúde já está se ajustando, todos esses impactos são acumulativos e as próximas gerações vão enfrentá-los de forma mais aguda”.
De acordo com Coriolano, a saúde como um todo está passando por transições. A primeira é a transição etária – combinação que prevaleceu nos países desenvolvidos e está chegando no Brasil. “Vamos passar por uma redução na taxa de natalidade e também nos índices de mortalidade.Teremos cada vez menos gente nova ingressando no sistema de beneficiários brasileiros”.
Além disso, o executivo chama atenção para a velocidade com que o Brasil se insere nas mudanças tecnológicas. “A medicina tem uma inovação muito veloz. Apesar do Brasil ser um país em desenvolvimento, temos uma medicina avançada, porém esses avanços fazem pressão sobre o sistema de saúde suplementar, pois encarecem os custos”.
Por último, ele elenca as mudanças epidemiológicas em que doenças consideradas mortais passarão a serem enfermidades crônicas, como AIDS, doenças cardiovasculares e, até mesmo, o câncer.
Na opinião do diretor da Amil, Paulo Marcos Senra Souza, os investimentos com a saúde tendem a aumentar em âmbito global, o que possibilitará que as pessoas envelheçam com mais qualidade de vida. “Uma questão importante para o futuro da saúde é o diagnóstico, que está cada vez mais preciso e precoce. Isso deriva dos investimentos. A verba que antes era destinada para a Nasa, por exemplo, está sendo aplicada na saúde”.
Souza acredita que com o Brasil enriquecendo e se colocando entre os principais PIB´s do mundo, o setor da saúde terá um futuro promissor. E diz que o importante é que as empresas de saúde suplementar garantam à saúde, pois o custo é a sociedade que vai decidir.
Tamanho da conta
Ainda que o Brasil esteja se desenvolvendo em termos econômicos, Carneiro do IESS, acredita que o mais preocupante na questão do envelhecimento é o tamanho da conta quando vier o ônus demográfico. “E se acontecer no Brasil o que está acontecendo na Argentina? Há 15 anos, o peso argentino, valia um dólar. De alguns anos para cá, vimos um aumento da pobreza muito grande”.
Carneiro alerta para o fato de que o País ainda não tem estimativas do impacto do envelhecimento da população na previdência e no sistema de saúde, o que pode trazer sérias consequências para a economia. “O valor per capita vai ser consequências da alteração da composição demográfica. Isso pode fazer com que os procedimentos aumentem mais que a inflação”.
Além disso, o superintendente executivo do IESS alerta para o fato de que a Lei do Idoso proíbe a discriminação dos consumidores com mais de 60 anos, em virtude da idade, por parte dos planos e seguros fazendo com que a última mudança etária seja feita aos 59 anos.
Souza, da Amil, explica que a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) não permitirá que as empresas de planos de saúde quebrem por falta de regulamentação. “Vale lembrar que apenas 20% da população brasileira possui acesso à saúde suplementar. E acredito que a agência reguladora fará leis mais justas para ambos os lados”.
Freitas, da Unimed BH, acha que a ANS tem capacidade moderadora no que diz respeito à formatação dos planos de saúde e tem função de pensar nisso mais que as operadoras. Para o presidente do Bradesco, o mercado de saúde suplementar já é regulado há 12 anos e a fase da regulação mais pesada já passou. “O mercado já se ajustou muito e pode ser considerável saudável”.
Planos empresariais
Outra dúvida que permeia o mercado da saúde suplementar é se no futuro compensará mais as companhias continuarem oferecendo o plano de saúde aos seus funcionários ou a sociedade optar por planos individuais. Para o vice-presidente da SulAmérica Saúde, Gabriel Portella, pesquisas indicam que quase 100% das empresas oferecem o benefício do plano de saúde aos colaboradores. “Eu não acredito que esse benefício será reduzido no futuro. Na verdade, esses recursos têm função estratégica, pois uma equipe saudável possibilita redução do absenteísmo e maior qualidade nas funções realizadas”.
Uma pesquisa realizada pelo IESS junto a pessoas que não têm planos de saúde concluiu que 90% dos entrevistados tinham como meta de consumo entrar para o grupo de beneficiários da saúde suplementar. “Essa pretensão ficou atrás apenas do sonho da casa própria. Essa discussão nos faz pensar se as mensalidades dos planos de saúde não deveriam ser mais baratas.”
Coriolano conta que cada vez mais pequenas e médias empresas oferecem o benefício aos seus funcionários. “A Bradesco Seguros possui planos para diferentes tipos de empresas. No último ano crescemos 35% com produtos dedicados a esse público”.
Freitas ressalta que questões como essa dizem respeito a toda a cadeia da saúde e não apenas a esfera suplementar. “Infelizmente não existe modelos ideais”.
Já Carneiro se arrista a falar sobre um modelo ideal onde o SUS (Sistema Único de Saúde) fosse bom e conseguisse dar conta de toda a demanda.
Promoção de saúde
Para os entrevistados, além de os planos de saúde empresarial possibilitarem que haja redução no absenteísmo e ofereçam oportunidades para que os funcionários tenham acesso a um tratamento no segmento suplementar, esse recurso também contribui para a disseminação do conhecimento de promoção e prevenção de saúde.
“É preciso educar a população como um todo, estimulando hábitos mais saudáveis. Esse trabalho pode ser feito dentro das empresas com ações que vão desde programas antitabagistas até acompanhamento das pessoas com doenças cardiovasculares”, explica Coriolano.
De acordo com o executivo, o Bradesco possui ações direcionadas a essa prática. “Nossa vocação é dar as empresas a possibilidade de, por meio de um sistema de informação, identificar quais são os grupos de risco”. E ressalta que é importante fazer um trabalho junto ao departamento de recursos humanos, pois é difícil ter adesão individual.
“É preciso que o segurado esteja mais consciente e tenha em mente que tudo o que ele fazem influencia no mutualismo”, diz Portella.
O executivo da Sul América conta que, entre os projetos que a companhia possui, o programa do emagrecimento saudável possui adesão de mais de 500 pessoas. Além disso, a seguradora possui mais de 22 mil pacientes identificados como crônicos.
No intuito de melhorar o relacionamento com os médicos e reduzir o índice de sinistralidade, a Unimed BH possui programas que visam a uma estrutura de mudança na forma de pagar os médicos. “Eu pago ao pediatra um valor a mais, se o cliente não utilizar o Pronto –Atendimento seis vezes em um ano. Também pagamos a mais, por exemplo, para o profissional que realizou um bom número de partos normais”.
Além dos esforços citados, Coriolano acredita que a questão da sustentabilidade consiste em compatibilizar os custos médicos, com o orçamento das famílias e empresas. “É preciso disciplinar a inovação tecnológica. Será que faz sentido autorizar todos os medicamentos que a indústria quer? Todo dispositivo médico deve ser avaliado levando-se em consideração custo – benefício, efetividade da inovação”.
Relacionamento com os colaboradores
Se de um lado é preciso ter flexibilidade para não onerar o setor devido às projeções futuras, do outro as operadoras vão precisar estreitar laços e ampliar o relacionamento com médicos, hospitais e indústria.
“Quando se fala para um setor com essa magnitude, o desafio é falar em longo prazo, mas o mais importante é fazer com que todos os atores se reconheçam como parte importante do sistema”, afirma Portella.
O presidente do Bradesco completa ao dizer que é preciso ultrapassar a barreira da confiança. E diz que tem visto uma ampliação no diálogo entre hospitais e operadoras que vai ganhar mais força no futuro. “Estamos avançando no ponto de vista de uma nova prática assistencial, introduzindo pacotes e substituindo remuneração por procedimentos. É preciso ter otimismo para se ter um bom relacionamento com os fornecedores, para o bem da saúde suplementar”.
Ainda que as opiniões, perfis dos beneficiários e forma de interação no mercado sejam distintas os executivos da saúde suplementar compartilham da mesma opinião em relação à meta principal do setor. “Nosso sonho é um futuro sem doenças”.
Fonte SaudeWeb
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