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quinta-feira, 17 de maio de 2012

Abismo entre a biodiversidade brasileira e medicamentos na prateleira

Especialista fala sobre a falta de inovação das farmacêuticas. "A indústria precisa entender a necessidade de aplicar em P&D, correr riscos, ter um pipeline forte e ativo no lugar cômodo de investir só no que já está pronto"
 
Luiz Francisco Pianowski*
 
Temos milhares de medicamentos de diversas marcas, diferentes sais, concentrações e apresentações. A pergunta é: Quantos são oriundos da nossa biodiversidade? Ora, se temos milhares de sais medicamentosos, e destes, em torno de 60% são de origem natural, moléculas naturais modificadas (semissintéticos) e compostos inspirados em moléculas naturais, chegaremos a uma conta fácil de fazer: Se temos esse número (60 %) e a nossa biodiversidade abrange 22% do total mundial, deveríamos ter 12% dos medicamentos mundiais com origem e (ou) inspirados em moléculas encontradas na nossa flora e fauna, além dos micro-organismos.

Encontramos alguns exemplos como a pilocarpina, extraída do jaborandi, usada mundialmente no tratamento do glaucoma e comercializada no mundo por décadas pela Merck alemã. Outro exemplo é o captopril; oriundo do veneno da jararaca que teve o início das pesquisas com o Dr. Mauricio Rocha e Silva, e, posteriormente, seu aluno Sérgio Ferreira descobriu a substância presente no veneno que deu origem ao medicamento; ativo esse que potencializava os efeitos da Bradicinina. Essa descoberta resultou num prêmio Nobel ao britânico Sir John Vane e um produto mundialmente comercializado pela Squibb. Hoje, os dois produtos (pilocarpina e captopril), com patentes vencidas, são vendidos também como genéricos.

O que vemos nesses dois exemplos? Primeiro: Que temos o que pesquisar, e muito ainda. Segundo: Precisamos deixar de aproveitar as migalhas que sobram dos pratos das multinacionais e produzirmos nossos próprios “pratos” para degustação e uso mundial. Devemos perceber que capacidade inovadora é o que não falta. Se buscarmos inovações nas pesquisas das nossas universidades, encontraremos muitas. Agora, estão prontas para o mercado? Não, mas é um começo que deve ser explorado pelas indústrias e apoiadas pelo governo.

Em minha opinião, diversos fatores contribuíram para esse abismo que temos entre a nossa biodiversidade e o medicamento na prateleira das drogarias mundiais. Uma delas, anterior à década de 50, é o descuido com o investimento na pesquisa nacional, tanto por parte das empresas como do governo. E depois dessa data, tivemos insegurança democrática aliada a desleixo da direita e medo da esquerda de perdermos nossas riquezas naturais para os “gringos” de um modo geral. Isso fez com que a academia se distanciasse da indústria e gerasse um grupo de “favoráveis” a patentes e outro “contra” patentes. Esse distanciamento da academia-indústria gerou uma “alergia” recíproca, impedindo o bom uso das ideias geradas nos bancos escolares.

Com o reconhecimento da lei de Patentes no Brasil em 1996, e a aprovação da Lei dos genéricos em 1999, a indústria nacional ficou sitiada. De um lado tinham de respeitar as patentes e do outro precisavam lidar com medicamentos genéricos que concorreriam com os de marcas que elas vendiam há anos. Nessa situação deveriam e tinham de investir em P&D. Saíram da confortável situação de copiadores para buscar alternativas na academia. E tivemos alguns avanços, alguns já estão no mercado e outros estão ainda por sair. Porém, essa situação, que parecia tirar a letargia das indústrias em P&D, gerou outra condição.

Houve uma mudança no cenário nacional sobre as posições de vendas e faturamentos das indústrias, colocando em primeiro lugar aquelas que produzem muitos genéricos. E isso, em minha opinião, levou as indústrias a um novo comodismo: “Para que arriscar se ganho com o genérico”. E, mais uma vez corremos o risco de gerar ideias aqui dentro, que ganham prêmios lá fora e fortalecem as multinacionais. A indústria, com raras exceções, precisa entender a necessidade de aplicar em P&D, correr riscos, ter um pipeline forte e ativo no lugar cômodo de investir só no que já está pronto.

* Luiz Francisco Pianowski é pesquisador, presidente do laboratório Kyolab e membro do Conselho Científico da Amazônia. Farmacêutico com Doutorado em Tecnologia Farmacêutica (Porto-Portugal), Pianowski é um dos profissionais diretamente envolvido nas pesquisas de fitomedicamentos que visam o combate a alguns tipos de câncer (AM10) e ao vírus do HIV (AM12).

Fonte SaudeWEb

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