Especialista acredita que pesquisa poderá levar a estratégias de prevenção e de
tratamento voltadas exclusivamente para determinada população
Variações genéticas raras encontradas em chineses não são as mesmas
identificadas em italianos ou porto-riquenhos, por exemplo. A conclusão de que
essas variantes tendem a estar restritas a determinadas regiões geográficas é de
um estudo que analisou o genoma de 1.092 pessoas, representantes de 14 grupos
populacionais vindos da Europa, África, Ásia e Américas.
Os resultados, que fazem parte da primeira fase do Projeto dos 1.000 Genomas, foram publicados nesta quinta-feira na revista Nature. Segundo os autores, enquanto a maioria dos polimorfismos de nucleotídeo único (quando a diferenciação ocorre em apenas um par de "letrinhas" do DNA) já foi identificada em estudos anteriores, aquelas que aparecem em menor frequência permanecem desconhecidas.
São justamente essas variantes genéticas raras — que atingem menos de 1% da população mundial — que têm maior potencial de estar relacionadas a doenças. Resultado de uma colaboração internacional de centenas de pesquisadores, o estudo permitiu identificar 98% dessas mutações raras. Agora, falta descobrir quais delas estão realmente associadas a problemas de saúde.
— Nossa pesquisa descobriu que cada pessoa aparentemente saudável carrega centenas de variantes genéticas raras que têm um impacto significante em como os genes funcionam e de duas a cinco alterações raras que comprovadamente contribuem com a ocorrência de doenças — diz o principal autor do estudo, o professor da Universidade de Oxford Gil McVean.
Para a geneticista Mayana Zatz, coordenadora do Centro de Estudos do Genoma Humano (CEGH) da Universidade de São Paulo (USP), a importância de saber que as especificidades genéticas variam geograficamente pode levar a estratégias de prevenção e de tratamento voltadas exclusivamente para determinada população.
Mayana dá um exemplo da utilização desse conhecimento: existe um gene relacionado ao transporte da molécula serotonina. Na população brasileira, grande parte desses genes tem alelo longo, o que determina uma rapidez maior no transporte da serotonina. Já no Japão, ocorre o contrário: a maioria da população tem alelo curto.
— Portanto, uma droga que atua no transporte de serotonina que for eficaz para brasileiros pode não ser tão boa para os japoneses — conclui a especialista.
O geneticista Décio Brunoni, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), observa que os resultados ainda não têm aplicação imediata. Ele lembra que, atualmente, a realização de testes genéticos só é indicada em casos clínicos específicos, em que a identificação de determinada mutação pode ajudar na indicação de uma conduta médica ou de uma estratégia de prevenção.
— Caso contrário, é um dilúvio de informações que vai levar o paciente a se preocupar mais do que deveria. Recrimino a realização aleatória desses exames.
Atualmente, o Brasil realiza uma pesquisa semelhante. O Projeto 80 Mais, do CEGH, está recrutando pessoas saudáveis com mais de 80 anos para colher amostras de DNA. O objetivo é chegar a mil idosos. Para se candidatar, é só enviar um email para 80mais@gmail.com.
Segundo Mayana, o projeto vai contribuir com a interpretação dessas mutações.
— Se identifico que a variante está presente em pessoas com mais de 80 anos saudáveis, posso saber que não está associada a doenças — conclui.
Fonte Zero Hora
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