Luciano Veronezi/Editoria de Arte/Folhapress |
Foi do gaúcho Adenauer Girardi Casali, 35, a ideia que levou a um novo método
para medir o nível de consciência de pessoas com dano cerebral grave, como
Bauby. Mediado só por aparelhos, ele independe de movimentos do paciente e de
sua interpretação pelo médico.
Em outras palavras, a invenção do grupo de Marcello Massimini na Universidade
de Milão, onde Casali fez doutorado, abre uma janela para espiar o cérebro preso
no escafandro, como Bauby descreveu a síndrome no livro "O Escafandro e a
Borboleta".
Não é trivial determinar se uma pessoa se encontra em estado vegetativo
permanente, se tem um nível mínimo de consciência ou se está consciente e só não
consegue responder. Nada menos que 68% dos que se mantêm no nível mínimo
recuperam a consciência em um ano.
Uma equipe da Universidade de Ontário Ocidental, no Canadá, afirma
"conversar" com pacientes usando ressonância magnética funcional, que registra
áreas em atividade no cérebro. Fazem perguntas, registram imagens da atividade
cerebral e comparam com as de pessoas normais.
O teste de Massimini e Casali dispensa essa interação. "É entusiasmante
trabalhar com coisas que podem ajudar pessoas assim", conta o brasileiro. Mas
ele ressalva que a inovação ainda precisa ser validada com mais pessoas.
Batizado de PCI (índice perturbacional de complexidade), o método pode ser
comparado com um radar.
Pulsos de ondas magnéticas são aplicados numa área de 10 cm² da cabeça --a
"perturbação". Um eletroencefalograma mapeia então o que acontece no córtex
cerebral.
O método matemático de Casali comprime os sinais dessa resposta cerebral e
extrai deles um valor da quantidade de informação envolvida (o PCI), que depende
do número, das áreas e da maneira como os neurônios "disparam". O PCI capta,
assim, a complexidade da conversa entre as regiões do cérebro.
Sinfonia Cerebral
O conceito-chave é o de complexidade. Ele parte da noção de que a consciência
se baseia em dois fatores: diferenciação (padrões variados de disparo) e
integração (duração e quantidade de comunicação entre as partes ativadas do
cérebro).
Pense numa sinfonia. O cérebro inconsciente seria como as passagens em que
poucos instrumentos tocam uma só melodia, simples. A consciência corresponderia
aos trechos em que toda a orquestra produz sequências diferentes de notas, porém
sob a batuta do regente.
Até aqui, havia meios experimentais de sondar o nível de consciência captando
uma coisa ou outra, não as duas simultaneamente.
Dos 52 participantes do estudo de Massimini e Casali, 32 eram pessoas
saudáveis. Seus PCIs foram medidos quando estavam acordadas, dormindo e
inconscientes após anestesia. Os outros 20 tinham dano cerebral e diferentes
níveis de consciência.
A comparação mostrou que o PCI discrimina os estados, do vegetativo profundo
à vigília, e torna possível dizer se o córtex mantém o grau de diferenciação e
integração necessários para que o cérebro volte a abrigar a consciência --e,
portanto, ajustar o tratamento em função do prognóstico.
Além da validação do método por mais equipes, será preciso acomodar os
aparelhos usados para gerar o PCI num console que caiba numa UTI. "Hoje é um
trambolhão", diz Casali. O grupo trabalha em protótipos com a empresa finlandesa
Nexstim.
Fonte Folhaonline
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