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A ideia, que tomou corpo na Europa e EUA, ganha força aqui. Na semana
passada, a primeira edição do "SlowKids", evento em prol da desaceleração da
rotina das crianças, levou 1.500 pessoas ao parque da Água Branca, em São Paulo.
Na programação, atividades nada tecnológicas: oficina de jardinagem,
brincadeiras antigas e piquenique. "As crianças precisam desligar os eletrônicos
e interagir mais com os pais", diz Tatiana Weberman, uma das criadoras do
projeto e diretora da agência Respire Cultura.
Segundo o jornalista britânico Carl Honoré, autor de "Sob Pressão" (Record,
368 págs., R$ 52), muitas crianças têm todos os momentos da vida agendados e
monitorados.
"Elas têm dificuldades de serem independentes, ficam sob estresse e são menos
criativas", disse Honoré à Folha.
Ele foi o primeiro a usar o termo "slow parenting". "Tudo começou quando a
professora do meu filho disse que ele 'era um jovem artista talentoso'. Na hora,
a visão de criar o novo Picasso passou pela minha cabeça", conta.
No mesmo dia, ele começou a procurar cursos de arte para o filho de sete
anos, até que o menino disse: "Pai, não quero ter um professor, só quero
desenhar. Por que os adultos querem sempre cuidar de tudo?".
O puxão de orelha fez com que ele voltasse atrás e começasse a pesquisar o
superagendamento da infância. Segundo ele, tudo começa com a boa intenção dos
pais. Mas a vontade de ser o pai perfeito transforma a educação em um jogo de
tudo ou nada.
Vida de executivo
Para a psicanalista Belinda Mandelbaum, professora do Instituto de Psicologia
da USP, a educação de resultados antecipa o ensino de ferramentas para competir
no mundo corporativo. "Vejo crianças aprendendo mandarim porque os pais acham
ser importante para o futuro."
Quando o empresário Marcelo Cesana, 38, diz não ter pressa de que o filho
Caio, 1, aprenda a falar, a ler e a escrever, questionam se ele não vai ter
dificuldade para trabalhar. "Me acham bicho do mato, mas não quero antecipar as
coisas", diz ele, que levou a família ao "SlowKids".
A gerente de supermercado Vanessa Sheila Dias, 36, também foi ao evento com a
filha Anne, 8. O domingo no parque faz parte da ideia de reservar um dia para
fazer nada. "A rotina da semana é maluca, passo a ansiedade para a Anne", diz
ela, que já se pegou pedindo que a filha comesse um lanche de fast food mais
rápido.
Anne não faz atividades extraescolares. Já os filhos da psicóloga Patrícia
Paione Grinfeld, 41, fazem natação, mas só aos sábados.
"Outros pais me perguntam: 'Eles não fazem nada durante a semana?' Como se
fosse algo errado!", conta Patrícia. "Quero que crianças venham brincar com meus
filhos, mas todas são ocupadas, tem que marcar antes."
As atividades extras não garantem que a criança vá aprender mais, diz
Mandelbaum. "Muitas vezes, elas só aprendem a se adaptar a esse ritmo louco."
O primeiro efeito da correria é a ansiedade, diz a neuropsicóloga Adriana
Fóz, coordenadora do projeto Cuca Legal, da Unifesp. "A criança fica frustrada
pelo excesso de atividades e pela falta [quando se acostuma à agenda cheia].
Fica entediada com mais facilidade."
Não que toda atividade extra deva ser evitada, mas é preciso respeitar o
tempo da criança. "Até os cinco anos os estímulos têm que ser mais naturais",
afirma Fóz.
De seis a 12 anos, é hora de aprender de forma mais sistematizada, diz ela.
Aí é preciso conciliar o que os pais consideram ser importante com o desejo e as
habilidades da criança, cuidando para que ela tenha tempo livre.
"O ócio estimula a criatividade e a curiosidade por temas e experiências
diversas", afirma a educadora e antropóloga Adriana Friedmann.
Folhaonline
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